Homenagem a Mulher Africana

Por Patrício Batsikama

 

 

 

 

 

A imagem da mulher contém um simbolismo controverso, pela dinâmica que conheceu nas diferentes sociedades. Interessante ainda é, por exemplo, a forma como é interpretada pela Igreja nos dias de hoje. Em Angola, por exemplo, a “Mensagem do Último Tempo” [conhecida como Os Branamistas] serve-se da carta de Paulo ao 1 Timóteo, 2: 9-15.

Passamos a citar apenas o versículo 12:

…“Não permito, porém, que a mulher ensine, nem use de autoridade sobre o marido, mas que esteja em silêncio.”. [versículo 12]…

Ao escrever ao Timóteo, Paulo liderava a Igreja de Efésio que, naquela altura passava por situações complicadas visto que surgiram mestres com doutrinas falsas que erroneamente interpretava as Escrituras. Como o próprio Paul o diz, estes últimos conseguiram enganar as mulheres [1 Timóteo, 5:15]. E, como o espírito das escritas indica, a atitude de Paulo é correctiva e não universaliza todas as mulheres ao serviço de Deus. E quem nos dá essa garantia é o próprio Paulo: (1) Priscila [Romanos, 16:3; Actos, 18:26]; (2) as anciãs de Creta [Tito, 2:3]; (3) haviam mulheres entre os hebreus [Hebreus, 5:12], etc.

Sustenta-se que a Mulher/Eva foi aquela sucumbiu ao pecado, e não Adão. A verdade é que nem o Homem, nem a mulher foi espiritualmente amaldiçoados. Espírito de Deus não poderia amaldiçoar Adão nem Eva porque ambos eram detentores do Espírito dele [Génesis, 1: 26-27]. Não faria sentido que, universalmente a mulher seja reduzida na forma como os Branamistas e outros interpretam 1 Timóteo, 2: 9-15. Independentemente da hierarquia eclesial na mão de homens [em termo de número] por serem Doutores das leis e por outras razões culturais, Paul ressalvou a importância da mulher nos serviços de Deus.
Em 1946 e 1956 realizaram-se dois eventos de grande importância histórica sobre a Igreja em Angola: (1) 1946: Conferência Missionária Protestante Internacional em Leopoldville, com as orações de três pastores angolanos: Jessé Chipenda, Gaspar de Almeida e o Profeta Simão Toko; (2) 1956: Publicação de Les Prêtres s’intérogent, onde três padres católicos perguntaram-se sobre a Igreja Africana.

A resposta foi com o Concílio de Vaticano II em 1962, com a única comunicação de um africano oriundo de Tanzania, o Cardeal Laurean Rugambwa. João Paul II iniciou uma revolução, pondo em prática as recomendações deste Concílio.

Hoje, qual seria o lugar da Mulher na Igreja Africana?

Se a religião é um sistema cultural [Geertz, 1978], é claro que as acepções bíblicas devem ser interpretadas à luz da essência cultural local [1 coríntios, 8; Romanos, 14;20] sem ofender o programa de Deus. Em relação a mulher, culturalmente ela é a responsável da educação nas sociedades angolanas. Ela educa a criança [paga propinas quando atrasa o salário do marido], ela intervém na preparação emocional do seu marido e garante o bem-estar do lar [núcleo da sociedade]. Temos o exemplo das zungueiras que são combatentes modernos do bem-estar da sociedade.

A pergunta agora é, com será possível interpretar 1 Timóteo, 2: 12?

Três pressupostos são necessários interpretar.

O primeiro: visto que Paul não universalizou a mulher, mas apenas falava da Mulher serva de Efésio consoante o seu perfil, é evidente que a mulher angolana recomendaria ensinar, como o fez as anciãs de Creta.

O segundo: para uma sociedade pós-guerra e as suas consequências, é muito provável que a violência domestica em Angola onde a mulher é a genericamente vítima não entusiasma que ela permaneça no silêncio. Ela precisa de aprender os seus direitos, integrar na adequação da harmonização do lar [direitos iguais] e contribuir no desenvolvimento social. Isso é possível, partindo da experiência da mulher angolana [Margarida PAREDES, 2015].

Terceiro: na Igreja a mulher virtuosa apresenta três possibilidades, nomeadamente: (1) a educação cristã é salvadora, e não uma opressão pela qual a mulher seria submissa. Tal ensinamento seria anticristão; (2) a feminidade proporciona valores ontológicos de preservar a espécie, cujo modelo optativo de cinco das noivas que aborda Cristo realça a educação da mulher deve ser prática, e não no silencio; (3) as primeiras evangelistas teriam sido as mulheres que anunciaram a ressurreição de Jesus Cristo que romperam a “cobardia” dos homens racionais.

Numa palavra, somos de opinião que o perfil da Mulher tratada em [1 Timóteo, 2: 9-15] não é universal. Qualquer pastor neófito sabe bem disso. O modelo da mulher angolana é Kimpa Vita, Ñjînga Mbandi… e os Bantu angolanos pertencem as famílias das suas mães [embora, nas Lunda haja sistema a dois lados] mostra-nos o lugar da mulher na sociedade. Cabe a Igreja Africana em geral e a Igreja angolana em particular estudar essa realidade sem esquecer-se do valor cultural da religião.




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