Governador José Carvalho da Rocha: “A província tem tudo para ser um dos principais celeiros do país”

O governador provincial do Uíge, José Carvalho da Rocha, foi nomeado para o cargo em Novembro de 2020, para substituir Luther Recova Joaquim, falecido em plenas funções. Na primeira entrevista ao jornal Nkanda disse ter encontrado a população do Uíge num momento difícil, em que ainda se chorava a morte do “jovem Luther”, que abalou a todos. Afirma que teve de dedicar-se, nos momentos iniciais, a reanimação da população e ajudála a reerguer-se e caminhar. Na entrevista, o governador faz uma avaliação da situação social e económica actual da província, que considera “precisar de cuidados”, e avança as ideias sobre o que pode fazer e corrigir ao longo do mandato.

Governador, que balanço faz do trabalho desde que assumiu a província?

Cheguei numa altura difícil para a população do Uíge que acabava de perder o Governador Luther. Os nossos primeiros dias foram dedicados a reanimar as pessoas, dialogar com os mais diferentes autores da província, galvanizar os homens, depois da situação trágica que se tinha abatido sobre a província e tocarmos em frente, porque a vida tinha de continuar. Tínhamos de pensar pela província e pelo país. Nestes primeiros meses do nosso trabalho, nos dedicamos a conhecer a província e os homens, através das visitas que fizemos a todos os municípios. Até ao momento, já visitámos em todos os 16 municípios da província, incluindo seis comunas. O conhecimento que obtivemos destas visitas, permitiramnos conceber programas que agora vão guiar o nosso trabalho. A nossa acção estará virada à satisfação do interesse do homem. Por isso, decidimos conversar, ouvindo as pessoas. Já auscultamos diferentes segmentos da sociedade uigense, como a juventude, os agricultores, os agentes dos transportes públicos e outros, que nos permitem ter muitas informações, a noção dos problemas e as potencialidades da província.

Com isso, que problemas identificou, neste período de estudo?

Preocupa-me mais os sectores da educação e saúde deveríamos potenciar com meios tecnológicos o sector da educação e da saúde para melhorarmos ainda mais os seus desempenhos, assim como o atendimento e actuação mais profissionalizados. A situação social e económica da província precisa de cuidados, pelos problemas e deficiências que apresentam. Ainda é possível revertemos essa situação. É necessário muito investimento e uma dedicação muito séria à agricultura. Por aquilo que vejo, o Uíge tem terras férteis, um clima extraordinário que permite o cultivo de todas as culturas. A província tem tudo para ser um dos principais celeiros do país. Se quisermos atingir tal propósito teremos de apostar no investimento técnico e tecnológico e nos homens. Teremos de adquirir inputs e em programas de formação dos agricultores. Os técnicos agrários devem ir mais ainda ao encontro dos pequenos e grandes agricultores, dos camponeses para fomentar novos conhecimentos e técnicas para uma produção saudável e em grande escala.

Há dias o Senhor falou de uma cooperação com as universidades para a área da produção agrícola. Pode esclarecer os meandros dos vossos propósitos?

Temos estado a dialogar com as universidades, estabelecidas aqui no Uíge, sobretudo com as suas unidades orgânicas, temos em vista o estabelecimento de um protocolo, que permita a materialização do auxílio aos agricultores. A nossa ideia é trabalharmos para a melhoria da produção de uma série de culturas. Melhorarmos o cultivo da banana, da mandioca, dos citrinos e ver se introduzimos a cultura do cultivo de hortícolas. Estamos a avançar para atingirmos a fase da concretização do que estamos hoje a delinear. Faça-nos uma abordagem sobre o quadro actual das estradas terciárias e secundárias da província e a sua relação com o escoamento da produção e do desenvolvimento da população das aldeias. Temos duas situações distintas: – A primeira tem a ver com o facto de a província ter mais de 400 quilómetros de estrada asfaltada, o que nos satisfaz, por ligar 11 dos 16 municípios. A outra pretende-se com o estado degradado, de algumas vias de acesso, sem asfalto, aos municípios dos Buengas, Milunga e Bembe. Na verdade, é uma odisseia transitar nas vias de Milunga e dos Buengas. Por outro lado, os trabalhos de colocação de asfalto na antiga picada de acesso à sede municipal de Milunga estão muito avançados. Actualmente já só faltam perto de 20 quilómetros para terminar o trabalho. A nossa maior preocupação prende-se com as estradas de interligação entre as sedes municipais e comunais, assim como as zonas de produção, que ficam nas aldeias, em quase todas a província. Estamos a direccionar meios e atenção a essas rotas rodoviárias pela importância que representam para a estabilidade alimentar da população. A província apenas dispõe de um kit de meios de construção, que não é suficiente, atendendo a sua extensão territorial. Neste momento, estamos a juntar alguns meios que existem em alguns sectores com o propósito de formarmos um segundo kit, para a partir do mês de Junho começarmos a resolver o problema destas vias de acesso, principalmente as que se direccionam para as comunas e aldeia dos municípios do Bungo, Mukaba, Maquela do Zombo, Milunga, Buengas, Bembe e outras. Temos também como perspectiva reabilitar a via que interliga a vila de Kimbele, Sankandica e a fronteira com a RDC. Neste momento estamos a envidar esforços para a organização da logística que é necessária para o trabalho que se impõe.

Que avaliação faz do grau de implementação do Programa Integrado de Desenvolvimento local e de combate à pobreza?

Precisamos corrigir algumas coisas. Precisamos ser mais assertivos para podermos satisfazer os anseios do destinatário, que é o povo. Devemos introduzir novos modelos, novo pensamento para alcançarmos a satisfação da população que é a destinatária deste programa de combate à pobreza. Para tal, precisamos ser mais específicos, mais concretos, evitando-se a generalização das acções que não tocam ou correspondam aos anseios do povo nas comunidades e para obtermos os resultados a que se propõe o programa de combate à fome e à pobreza. Entretanto, alguns erros notáveis são próprios de quem está num processo de aprendizagem. Certamente lá chegaremos. Do vosso ponto de vista, o PIIM dá algum sinal de mitigação dos problemas nos municípios? Apesar de alguns constrangimentos, estamos a caminhar bem. Estamos no bom caminho. O PIIM já está a permitir a criação de empregos para os jovens. Temos 91 obras projectadas, sendo 60 em andamento, que permitiram a inauguração de uma escola, alguns sistemas de captação de água em várias comunidades. Já vai sendo visível o reflexo deste programa do Executivo para a vida das populações em muitas comunidades.

Do estudo que tem feito da situação geral da província o que mais preocupa o governador?

Preocupa-nos mais a Educação e Saúde. Na programação do PIIM, salta àvista a ausência de obras de recintos desportivos e centros de investigação ou bibliotecas, havendo mais escolas e centros médicos, os mesmos de sempre.

Que justificação pode o governador dar ao cidadão?

Bom, temos algumas quadras desportivas em algumas escolas, mas temos a consciência de que precisamos alargar as infra-estruturas para outros sectores. Sabemos que os recintos contemplados no PIIM ainda não são de dimensões desejadas, para responder à vossa pergunta. Ainda assim, estamos a avaliar outras infra-estruturas que possam servir a juventude e ao conhecimento. Estamos a falar da avaliação que estamos a fazer à situação da Casa da Juventude, cujas obras precisam de ser terminadas. Estamos também a trabalhar no sentido de aumentar a electrificação do bairro da Juventude. A Mediateca encontra-se inacabada. Consta nos nossos planos a sua conclusão para servir o saber e a diversão, principalmente dos jovens. Nos nossos primeiros meses vimos que muitos jovens se juntavam, e se juntam até agora, no jardim, defronte ao governo provincial, para disputarem o acesso à internet. Vimos que era importante aumentarmos os lugares onde as pessoas possam aceder à Internet sem andarem muito longe das suas casas. Agora, definimos 10 pontos de acesso a Internet na cidade do Uíge onde colocaremos pontos de Internet. Penso que servirá para estimular os jovens à pesquisa científica, à obtenção da informação e a outros conhecimentos. O

Uíge é uma província que sempre se destacou na música…

É verdade, temos muitos artistas. Tão logo cheguei, fiquei surpreendido com a quantidade e qualidade dos artistas que o Uíge dispõe. Nunca tinha imaginado a qualidade musical e artística desta região do país. Isso mobilizou-me a trabalharmos com o sector da Cultura, para darmos maior visibilidade aos muitos artistas que temos aqui. É preciso trabalhar para abrir oportunidades a estes talentos que disputam as oportunidades na arena musical nacional, quiçá internacional.

Quanto aos pontos turísticos da província, alguma atenção também foi dirigida neste tempo que avalia a província?

Pude constatar a existência de inúmeros pontos turísticos na província. Há um caminho longo para se dar vida a estes pontos, que podem atrair ainda mais turistas a visitarem a província. Entre muito, temos o Zenzo que é um ponto turístico com visibilidade internacional. Neste momento, tal como muitos outros, este ponto turístico está inacessível, por causa da via que se encontra em mau estado. Não pode continuar a estar como está. Nos trabalhos preparatórios de reabilitação das vias terciárias que estamos a fazer, consta também a reabertura da via do Nzenzo, cujo estado degradado impede o acesso.

Este Jornal sabe que agora a província deixou de ter museu…

O museu do Congo está actualmente encerrado. Estive lá, nos primeiros dias de trabalho. Não tinha condições para continuar a abrir as portas sem um trabalho profundo para a sua restauração. Tinha muitos problemas ligados à sua estrutura física. É preciso a mobilização de novos serviços. O seu acervo está protegido. É caso para dizer que é necessário um trabalho profundo para a sua restauração. Estamos a avaliar a situação real do museu e os recursos a serem aplicados para termos um museu restaurado, que possa dignificar o acervo histórico, cultural e outro desta região, que anteriormente integrava o antigo reino do Congo.

Certamente teve alguma informação sobre o estado da produção do café. Pode dizer-nos o que pensa sobre este sector?

Desloquei-me pessoalmente à estação do INCA onde pude verificar que precisa de um estímulo para poder desempenhar bem o seu papel que é o de acompanhar e orientar os produtores do café. Conversei longamente com o seu responsável que me detalhou o estado nada bom da produção do café aqui no Uíge, assim como das suas infra – estruturas de apoio. Teremos de criar condições para relançar a estação do Instituto Nacional do Café, para se sentir capaz na sua missão de melhorar e incentivar a produção do café, nesta região, através da mobilização e remobilização dos produtores, muitos deles ainda jovens, para o cultivo deste produto. Queremos que o café volte a ser a nossa bandeira. Temos muita gente com conhecimento do café. Então é preciso que estes, que agora se encontram em idades avançadas, sejam estimulados para repassarem as suas histórias às novas gerações. O nosso propósito é voltarmos a alcançar os níveis de outrora que colocaram o Uíge na posição líder da produção do café em Angola.

Há cada vez mais reclamações da deterioração da produção agrícola. A que se deve isso? Que soluções para inverter o quadro?

Em cada época de colheita os produtos queixam-se da deterioração da produção por falta de meios de escoamento, das vias, que ainda não estão boas, ou ainda por falta de compradores. Em nossa opinião é preciso termos uma indústria que possa se interessar pela transformação desta produção. É necessário um aturado trabalho para a atracção dos grandes e pequenos investidores do café e de outras culturas. É preciso que a produção agrícola que é feita aqui seja também transformada aqui. É preciso a intervenção da indústria transformadora que se estabeleça aqui, através dos grandes e pequenos investidores. Os investidores que optarem em montar fábricas transformadoras aqui no Uíge terão muito a ganhar pelo facto da província sempre dispor de frutas ou outros produtos para transformar em todo o ano. Não terão os habituais problemas de procurarem pelos produtos ou de custear a transladação dos produtos para serem transformados em Luanda ou noutros lugares. Terão poucos custos, mas ganhos fabulosos.

Fonte : Nkanda

 

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