Revolta de Tulante Mbuta no Congo Português

Por René Pelissier

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ÁREA DE S. SALVADOR

Certamente o chefe do posto civil de S. Salvador nunca supos que tão completamente se cumpriria ao profecia que encerrava na sua nota nº. 87 / 7 de 21 /11/1913, ao administrador de Maquela, pedindo rápidas e enérgicas providencias para castigar e reprimir a desobediência manifesta de Buta, soba do Lavo. Afim de evitar o alastramento a outros povos”, para o que julgava necessário se possível que tivesse então sido suficiente – um reforço para o posto Quimbubuge e outro de 20 praças para o de S. Salvador.

A extrema penúria militar, característica da província de Angola e ainda mais do distrito do Congo, agravada com desguarnecimento completo que ressoltou da infeliz ocupação do Pombo e Sosso, eram tais que ao administrador de Maquela, dando ao governo do distrito conhecimento dos factos anormais que se passavam em Quimbumbuge, comunicava que a guarnição d’este posto bem: como o de S. Salvador se achavam comandados por 2 cabos indígenas! E era tal a penúria que fora necessário lançar mão de um 2º. Sargento que estava em marcha para a metrópole, para ir com quatro praças tudo o que foi possível arranjar para reforçar o posto de Quimbumbuge. E o nosso espanto, para não dizermos a nossa indignação, sobe ao ponto ao verificar-se pelo relatório desse sargento, José Augusto Vergílio, que as praças a ele saíram de Maquela para S. Salvador desarmadas!!!

Só em S. Salvador este reforço para o posto de Quimbumbuge recebeu armamento e munições e estas mesmo quase insuficientes, como o diz no seu relatório, com a heroica simplicidade de um forte, o comandante de quatro praças que, através de uma região já sublevada, se propõe ir reforçar um posto ameaçado. É digno de leitura esse documento em que se vê que quando o reforço entrou no posto de Quimbumbuge o seu municiamento estava reduzido a… 23 cartuchos!

Partiu o sargento Virgílio de Maquela em 23 de novembro 1913 chegando a S. Salvador em 30, recebendo só ali armamento e munições; de S. Salvador partiu em I, perseguindo no dia 2, em que foi atacado, na passagem do povo Lavo, de Buta, onde teve de sustentar um combate de duas horas, das 8 ás 10, recomeçando o combate; mais longe, às 11,15, verificando então que só tinha 112 cartuchos para todas as 5 espingardas; só então pensou em evitar o combate, para o que saiu do caminho habitual, sendo n’essa ocasião morto o carregador e ferido elle próprio. Desde esse momento a força foi constantemente perseguida até a proximidade imediata do posto, onde entrou às 3 horas da tarde e pouco depois, às 4,15, era tacado pela gente de Buta.

Felizmente havia munições em quantidade razoável no Quimbumbuge, o que o sargento Virgílio permitiu sustentar-se até aos princípios de janeiro, quando, exausto de munições e de víveres e a conselho ou indicação do chefe dos posto civil de S. S. Salvador, abandonou o mesmo posto, retirando para S. Salvador…

Nota: Estes episódios são transcritos do acervo do Arquivo H. Militar – muito deles manuscritos, pelo que pedimos antecipadas desculpas por alguns erros de nomes e localidades neles descritos.

…” Em 5 de dezembro o chefe do posto civil de S. Salvador comunicava o ataque à força feito no dia 3 e a notícia de que Buta estava resolvido a atacar aquela povoação, pedindo que, com toda a urgência, lhe fosse enviada força.

Em 6 de dezembro comunicava o sargento Vergílio ter requisitado ao comando de Maquela 7 a 10.000 cartuchos, porque a região estava completamente sublevada; pedia um reforço de 12 praças para com elas “meter gentio na ordem”; acrescentava que se não fossem dadas as providências urgentes que pedia se veria forçado a abandonar o posto, o que só faria quando o seu municiamento estivesse reduzido a 600 cartuchos de que carecia para retirada.

Em 9 de dezembro, segundo comunica o 1º. Cabo europeu Joaquim Miguel, que tinha ido de Maquela para S. Salvador para assumir o comando do posto, Buta achava-se, conforme o informara o chefe do posto civil, na próxima povoação de Zamba, onde aquele chefe se dirigiu na manhã de 10 a fim de ir fundar, sendo forçado a regressar a S. Salvador, quando o chefe chegou à povoação, em frente da missão portuguesa teve que refugiar-se n’esta, por que o gentio lhe fazia fogo; o cabo Miguel, vendo o incendio e ouvindo as detonações, e verificando que o chefe não chegava mandou uma força de 4 praças, comandadas pelo 2º. Cabo indígena 66 em socorro do chefe, mas esta força foi violentamente atacada pelo gentio que invadira S. Salvador e, depois de o obrigar a retirar para o que fez algumas descargas, retirou sobre o posto que a esse tempo estava sendo tacado, do lado nascente, por cerca de 300 espingardas.

Foi depois de assim proceder que o gentio resolveu ir “fundar” no dia 11. Em 12 o administrador de Maquela comunicava que contava estar cercado o posto de Quimbumbuge; que o gentio reunido pretendia atacar S. Salvador; que em Maquela não havia forças; que mandara seguir 8 praças com 4.000 cartuchos para S. Salvador; finalmente que requisitara 20 praças ao comando da coluna Pombo-Sosso e que pedia procidências urgentes.

Este telegrama só foi conhecido em Cabinda no dia 26, facto que pode parecer estranho mas que não causa a mínima surpresa a quem conheça as condições de expedição de um telegrama de Maquela para Cabinda, abrigado à transmissão por mão de portador durante um mínimo de 6 dias de viagem, para ser transmitido telegraficamente de Noqui para Santo António e d’ahi, por meio de um barco que faz a travessia bissemanalmente, para Banana, d’onde é transportado por escoteiro para Cabinda.

Nesse mesmo dia telegrafava o administrador de Maquela que os escoteiros que conduziam a correspondência para S. Salvador tinham regressado, por terem sido atacados em Kukuge Lembelo (1) que roubara e inutilizara a correspondência; que a força de 8 praças a que se referira no seu telegrama anterior foram forçados a retirar para o evitar o seu massacre; não se conheciam pormenores e ignorava-se em Maquela o que sucedia em S. Salvador, esperando administrador que da Damba viessem 20 praças requisitadas para procurar comunicar com aquela povoação.

Em S. Salvador tinham-se dado entretanto os sucessos que atrás referimos; fora incendiada quase todo o bairro católico, produto de uma peregrina inépcia administrativa que consentira na sisão absoluta dos sectários das duas religiões, que ali contam quase igual número ervorosos adeptos e crentes; fora destruído o mercado publico, tinham sido saqueados os haveres dos habitantes católicos ou portugueses, pois que os protestantes se intitulavam ingleses e eram considerados como tais pelos indígenas, sendo o chefe do posto civil, absolutamente privado de forças pois que a guarnição de S. Salvador se reduzia a 7 praças indígenas, sob o comando de um cabo europeu, doente e inútil, obrigado, pelas circunstâncias, a consentir em uma “fundação”, a que o gentio comparecia armado, no dia imediato àquele em que atacara a povoação. Os atacantes eram de toda a região de S. Salvador e ainda de parte da DAMBA e do BEMBE. A “fundação”….

A Fundação

À “ FUNDAÇÃO” assistiram, em 11, 800 indígenas armados e, fora da povoação tinham ficado os rebeldes das regiões Canda e Manguve; os rebeldes, pela boca de Buta, tinham exposto as suas pretensões e exigiam que até ser dada resposta do governo não fossem soldados para S. Salvador, ameaçando de que, se tal acontecesse, atacariam de novo a povoação e tudo destruiriam; o chefe do posto civil, receoso de que poderia suceder, pedia que não fossem mandadas forças para S. Salvador e que mandassem retirar antes de ser dada resposta do governo às pretensões dos rebeldes.

Só no dia 15 de dezembro se conheceu em Cabinda o ataque feito contra a força do comando do sargento Virgílio e a ameaça do ataque a S. Salvador e, n’essa data, o governo do distrito ordenava à Damba e ao Bembe que para ali enviassem pelo caminho directo, respectivamente 20 e 15 praças e comunicava tudo telegraficamente ao Quartel-General, comunicando também, em harmonia com informações anteriores, que a causa aparente da revolta era o angariamento de serviçais para S. Tomé; n’esse mesmo dia confirmava o telegrama, melhor elucidando acerca de que ocorria, sem que todavia, ao que parece, desse ao assunto toda a importância que ele merecia. E que assim é, prova-o o facto de se depreender das ordens dadas que, e esse tempo, pensava o Ex Governador do distrito que o assunto se poderia resolver com 35 praças, que não poderiam estar em S. Salvador, reunidas, antes de um mês, aproximadamente, e que, conforme as instruções dadas, deveriam empregar n’esse serviço, isto é, estarem ausentes das estações de proveniência apenas cerca de seis semanas. É certo, todavia, que a essa data o governador do distrito ignorava ainda o ataque a S. Salvador. Do processo não consta documento algum do qual de deduza que tais factos mereceram qualquer importância ao quartel general, sendo certo, todavia, que muita que merecesse não poderia providenciar, pois que então considerava impossível dispor de um só homem, como vimos a tratar da revolta de Santo António.

Nesse mesmo dia 15 o comando militar de Maquela comunicava que, em vista da falta de resposta do comando militar da Damba à sua requisição de 20 praças, mandara seguir nesse dia uma força de 15 homens sob o comando de um 1º. Sargento, proceder a um reconhecimento para apreciar a atitude dos povos e, sendo possível, socorrer S. Salvador.

Em Maquela ficaram 14 praças, na maioria doentes. Esta força saiu de Maquela em 15 e ali regressou em 16, conforme o pedido do chefe do posto de S. Salvador, cuja nota, considerando perigosa a ida de forças para ali, fora recebida depois da partida da força.

Em 16, uma carta particular de Matadi comunicava ao secretário da circunscrição de Noqui, que em 14 já noite, chegara a Songololo, o rei do Congo, fugido, dizendo que Buta e Futichila cercavam S. Salvador com 4.000 indígenas armados, tendo já incendiado a povoação; a causa da revolta que era contra o rei e o chefe do posto, era o imposto de cubata e o fornecimento de serviçais para Cabinda e Landana; todos os povoados de Madimba estavam em armas. O secretário de Noqui recebendo esta carta em 18 comunicava-a telegráfica e imediatamente ao governador do distrito, sendo o telegrama recebido em Cabinda no dia 26, data em que o governador do distrito se encontrava em Quifuma, como vimos.

Em 23 o secretário de Noqui dirigia-se de novo telegraficamente ao Governo do distrito pedindo autorização para mandar ir a Noqui o rei do Congo para o ouvir o mais minuciosamente informar; o governo do distrito julgou bastante mais económico que aquele rei expusesse por escrito o que se passara e que lhe fosse remetido esse relato.

No dia 25 o Governo Geral telegrafava ao Governo do Distrito dizendo “ Correm aqui boatos alarmantes sobre S. Salvador. Peço informações” ao que o Governo do Distrito respondia ter mandado em 19 extenso telegrama ao quartel general e que depois dessa data nunca mais (ilegível) … Só depois de 24 é que o Ex Governador do Congo , então em Quifuma, receberia novas e alarmantes comunicações; de facto essas informações chegaram a Quifuma quando já ali se encontrava o Ex Governador Geral, de modo que em 31 de dezembro eram requisitados telegraficamente à administração do Ambrizete 200 carregadores para o serviço da coluna constituída por praças da 20ª companhia, que viera do sul no transporte Salvador Correia, como vimos, e para que S. Salvador deveria seguir comandada pelo tenente da Companhia Disciplinar António José Camacho e do corpo da policia de Loanda, António José Cesar Teixeira.

No dia imediato, 1 de janeiro de 1914, era nomeado chefe dos serviços administrativos da coluna de S. Salvador, o tenente da administração militar António da Costa Alves…

…” Em 6 de janeiro acusava o comandante da 2ª companhia indígena e comandante militar de Maquela, capitão médico José Pinto Meira, a recepção da nota do governo do distrito em que lhe era ordenado que fizesse recolher o destacamento da Damba e comunicava que em virtude de ser dissolvida a coluna do Pombo e Sosso, pedira ao capitão mór da Damba para a esse destacamento serem agregadas mais algumas praças de modo a perfazer o total de 30, e que, para o comando dessa força nomeasse o graduado que julgasse mais competente para desempenho da delicada missão que teria de executar. É que o chefe do posto civil de S. Salvador vendo os rebeldes mais sossegados por estarem à espera da resposta do governo às suas pretensões, pedira ao comando militar de Maquela, em 31 de dezembro de 1913, que lhe mandasse uma força de 30 praças, com a qual ele tencionava, em oportunidade que se apresentasse, prender o Buta e outros responsáveis pela revolta. N’esta mesma nota comunicava ter informado o comandante de Quimbumbuge de que não podia nem conviria reforçar aquele posto nem enviar-lhe as munições requisitadas e que lhe recomendara que só se visse sem recursos “ melhor seria regressar a S. Salvador”.

Em S. Salvador havia n’essa data 9 martinis e 8 snyders, das quais uma em mau estado, mas não havia munições para as armas deste último modelo pelo que pedia para que lhe fossem enviadas juntamente com a força. Acrescentava ter recebido, por dois indígenas que tinham vindo de Maquela, duas snyders e 190 cartuchos.

Em 14 de janeiro partia, às 14 horas, a força de 30 praças enviadas pelo capitão comandante militar de Maquela, essa força foi comandada pelo alferes Joaquim Pedro Magalhães Gama, que, de regresso da coluna do Pombo e Sosso, se encontrava doente e em tratamento em Maquela; o mesmo sucedia com o sargento que d’essa força fazia parte. A chegada a S. Salvador teve lugar no dia 18 depois de três dias e meio de marcha forçada que é, não pela extensão mas pela rapidez, digna de figurar ao lado das mais celebradas marchas forçadas executadas em África.

Chegados a S. Salvador e conforme o solicitado pelo chefe do posto civil, procedeu o alferes Gama à apreensão de armamento e captura de indígenas suspeitos de entendimentos com Buta, e que, alem d’isso não tinham acatado o edital que mandava que fossem entregues n’aquele posto as armas que tivesse em seu poder. O alferes Gama já encontrou em S. Salvador o sargento Virgílio e as praças que tinham constituído a guarnição do posto de Quimbumbuge que aquele se vira forçado a abandonar por falta de víveres e munições.

Comunicava ainda o alferes Gama que parecia que a atitude do gentio se tornara mais agressiva o que era atribuído à chegada da força do seu comando e ao boato de que, em resposta às exigências feitas na “fundação” iria ali o Governador Geral, com forças, para punir os rebeldes e, em vista daquela atitude, tinha convidado o pessoal de ambas as missões a recolher à fortaleza. A força do seu comando não fora atacada no trajecto, porque, seguindo o conselho que lhe fora dado por D. Álvaro Tangue, fizera a marcha de Cuimba a S. Salvador em um dia, não dando assim tempo a que Buta fosse prevenido da sua aproximação e a ataca-lo.

Ao seu relatório juntava o alferes Gama uma relação do armamento e pólvora que apreendeu em S. Salvador, figurando nelle 1026 cartuchos e 87 latas de pólvora.

Conforme vimos na primeira parte d’este relatório o capitão Baptista Cardoso marchou com parte da 20ª companhia para Noqui a fim de se dirigir para S. Salvador; o novo governador interino do distrito marcharia com o resto da mesma companhia, logo que viesse de Cabinda, onde o tinham levado inadiáveis necessidades de serviço público.

Em 1 de fevereiro chegou a Noqui, a bordo do Salvador Correia, a 20ª companhia que em 3 partia para S. Salvador na força de 3 officiais, 5 sargentos e 102 cabos e soldados, sendo acompanhada por um comboio de carregadores fornecidos pela circunscrição do Ambrizete; comunicava o capitão Cardoso que não lhe fora possível obter carregadores em Santo António e que dera ordem para serem angariados 200 carregadores em Noqui, que deveriam constituir o comboio que marcharia com a coluna do governador do distrito, constituída pelo restante efectivo da 20ª companhia. Porém, logo no dia 4, isto é, dois dias depois daquele em que o capitão Cardoso telegrafara, o administrador da circunscrição do Ambrizete, comunicava pela mesma via que não era possível completar o número de carregadores pedido porque os POVOS do MUSSUCO se achavam sublevados, actuando já sob a influência de BUTA,
recusando-se ao pagamento de impostos e ao fornecimento de carregadores.

…” Partiu o capitão Cardoso no dia 3 de fevereiro de Noqui para S. Salvador, com o pessoal indicado, estabelecendo o serviço de segurança desde que atingiu, a cerca de uma légua de Noqui, o campo de segregação de Minguengue. Nada de anormal se deu na sua marcha até atingir a margem do rio M’pozo; aqui, e enquanto se procedia à reconstrução da ponte sobre o rio, cujo tabuleiro fora destruído, foi entabulada conversação, a distância, com alguns indígenas que supôs serem de Dinga (antigo povo do Congo Diantino) os quais diziam que era melhor não perseguir com soldados, porque naturalmente encontrariam guerra se perseguissem na marcha; quando o capitão Cardoso pretendia aproximar-se d’estes indígenas a fim de os deter para averiguações eles desapareceram. Reconstruida a ponte, perseguiu a marcha, atingindo a flecha às 11 horas a margem do rio Luso, onde foi recebida com uma descarga de que resoltou ficar ferido um soldado; já flecha, que era comandada pelo 2º sargento Oliveira, retirou sobre o corpo da guarda avançada e este, por seu turno recuou de alguns metros para ocupar uma posição mais dominante. O comandante ordenou então que as duas secções do pelotão da cauda se dispusessem em colchete defensivo, não sendo, todavia seu propósito manter-se na defensiva. O fogo durou até cerca das 14,30, sendo ferido mortalmente, durante ele, um soldado indígena que se encontrava entre o comandante do pelotão, tenente António José Camacho e o 1º sargento Rodrigues; este ferimento foi feito por bala de arma de calibre reduzido.

Os ataques

O gentio que atacava em grande força e número, empoleirando-se nas árvores, fazia grande gritaria, tocava cornetas e trazia na cabeça fitas brancas, então sinal de BUTA, que mais tarde foi substituída, sem que se saiba a razão d’isto por fitas vermelhas; a força do comando do Capitão Cardoso estava muito atormentada pela falta de água que não encontrava desde a passagem do rio M’Pozo e encontrava-se impossibilitado de ir buscá-la ao Luso. Nestas condições o capitão Cardoso resolveu interromper o combate e retirar para um montículo 300 metros à rectaguarda e d’ahi estudar o terreno procurando encontrar um ponto onde a passagem do rio não apresentassem as dificuldades que ali se lhe ofereciam; não conseguindo encontrar ponto algum n’essas condições resolveu reunir conselho de oficiais, que, unanimemente, considerando que não dispunha do mais insignificante meio para preparar
uma ponte ligeira nem de artilharia para bater a mata, que era pequena a reserva de munições e que não sabiam quais as dificuldades e resistência que haveria a vencer no resto do caminho de que apenas haviam percorrido a primeira metade, e, ainda, que tinham partido de Noqui com dez dias de viveres e que, caso chegassem a S. Salvador, como ali não havia munições em abundância, a acção da coluna seria inútil pois que não representando um aumento de força, representaria, não obstante, um mais largo consumo de viveres, constituindo, em tais condições, um factor negativo para a defesa daquela povoação, foram de parecer que a coluna deveria retirar sobre a fracção que, em harmonia com as instruções de S.Exª o Governador Geral, deveria seguir o mesmo trajeto, escoltando o Ex. Governador do distrito.

“Começou então a retirada….

…” Em colunas acompanhadas de comboios de carregadores a “mise en marche” é sempre extramente difícil; nos primeiros dias de marcha as dificuldades, se os casos a resolver, as complicações, são inúmeras; por isso, e porque toda a marcha daquele dia se efectuaria em território absolutamente sossegado, resolveu o Governador, que a partida do comboio, escoltado por uma secção, procedesse a da coluna propriamente dita, de forma que o pessoal desta pudesse impedir que à retaguarda ficasse qualquer carregador. O grosso da coluna pôs-se em marcha às 15,30 chegando a Kinga, povo onde deveria acampar, pelas 17 horas, pouco depois de ali chegar o comboio e a respectiva escolta, com a qual tinha marchado o Governador.

No dia imediato começou a marcha de guerra, sendo o dispositivo adaptado o que consta da ordem de marcha que constituio o documento nº (?). O Governador resolvera que o grande alto fosse dado no Lué, que a coluna ainda não atingira quando às 14,30 foi encontrada a força do comando do capitão Cardoso em M’ Bumi.

Ali teve, em vista d’isto, lugar a grande alto e, durante ele o capitão Cardoso pôs o Governador do distrito ao corrente da situação e das circunstâncias que o tinham levado e a mais oficiais sob suas ordens a romper o combate e ordenar a retirada. Como no trajecto feito n’esse dia o Governador tivesse notado que em Caso havia um local que reunia magnificas condições para um acampamento, para ali marchou a coluna, agora constituída por toda a 20ª companhia e sob o comando do capitão Cardoso, oficial mais graduado e antigo. Chegado ao acampamento de Caso, às 18 horas, reuniu imediatamente o conselho de oficiais sendo exposta a situação que se apresentava n’estes termos: O objectivo primário a realizar consistia em socorrer S. Salvador o mais rapidamente possível, dado que o sucedera com a força mandada pelo capitão Cardoso, e não dispondo de mais meios que esta, a marcha pelo M’pozo era muito aleatória.

O conselho de oficiais, por unanimidade assentou no seguinte parecer: Conseguir, o mais rapidamente possível, uma peça 7 BKM, reabastecer a coluna, obter autorização para efectuar marcha até Songololo, como caminho mais curto e rápido, pedir que imediatamente fosse declarada a suspensão de garantias; finalmente, que uma vez chegada a coluna a S. Salvador, o seu primeiro objectivo seria atacar e bater Quimbubuge e, em seguida bater o Luso.

O Governador concordou com o parecer do conselho de oficiais e imediatamente telegrafou para S. António para que d’ali lhe fosse enviada uma peça e o maior número de carregadores que fosse possível obter; o chefe de serviços administrativos seguiu prontamente para Noqui, a fim de tratar do reabastecimento da coluna, que permanecia acampada no Caso, ligada telegraficamente com Noqui. Ao Ex Governador Geral foi enviado um telegrama expondo a situação, comunicando o voto do conselho de oficiais e pedindo autorização para solicitar directamente ao Governo do Congo Belga a indispensável licença para atravessar aquele território, caso o mesmo Exº Governador Geral concordasse com a deliberação tomada.

Demorava-se a resposta do Governador Geral e por isso o Governador pediu novo telegrama em que comunicava que se até ao dia 14 não recebesse resposta se poria em marcha pelo caminho de M’Pozo-Luso, em 15; a despeito de tudo. Em 13 chegou a resposta em que era autorizada a marcha por Songololo e em que era julgado desnecessário o estado de sitio por se tratar de indígenas rebeldes e portanto fora da lei, não sendo, por outro lado, conveniente suspender as garantias em relação aos europeus.

Em 14 marchou a coluna para MInguengue…

…” Em 14 marchou a coluna para Minguengue e em 16 chegava ao Songololo; a coluna era comandada pelo capitão Cardoso e o Exº Governador acompanhava-a para tentar dar inteiro cumprimento às instruções se s. Exª o Governador-geral. Em 17 permaneceu ainda a coluna em Songololo por falta de carregadores para o oficial belga que comandava a escolta, em prejuízo do transporte de um número equivalente de cargas da coluna que tiveram que ficar em Songololo, começou a marcha para fronteira, indo a coluna acampar n’esse dia em território português, na margem esquerda do Luvo às 17,30 sendo aí prevenido o Exº Governador, pelo oficial belga comandante da escolta, do que, segundo tinham informado os sobas de alguns povos belgas atravessados pela coluna no seu trajecto, os rebeldes esperavam acoluna na mata que orla um pântano a pequena distância da margem do rio Luvo.

Em 19 partiu a coluna com destino a S. Salvador e uma hora depois encontrou à esquerda a mata a que referia a informação do pelotão da guarda avançada (tenente Ribeiro d’Almeida) desenvolveu e avançou para a mata executando duas descargas, que não foram correspondidas, e, em seguida internou-se na mata onde não encontrou vestígios de gentio; por sua vez a coluna avançou para a mata, perdeu-se dentro dela, conseguindo, algum tempo, concentrar-se em uma altura que domina a mata; continuando a marcha atravessou às 13 horas a mata o rio da Volunga e a povoação d’Este nome, que acabava de ser abandonada pelo gentio que ali deixara toda a criação e haveres, que foram respeitados. Depois de um pequeno alto a marcha continuou indo a coluna acampar: em pequena elevação de terreno, 400 metros a norte da mata do SOKO, às 16,30, sendo nesse dia suprimido o almoço.

No dia 20 a coluna pôs-se em marcha às 7 horas, atravessou a mata do SOKO e dois povos que ali existiam e que tinham sido abandonados n’esse momento, procurando baldamente que o gentio “ chegasse à fala” não conseguindo obter resposta aos convites que eram feitos para que se apresentasse, não restando, porém, a menor dúvida de que estava muito próximo e que ouvia quanto lhe era dito. Prosseguiu a marcha, sendo atravessada mais uma mata e às 10,10 a coluna chegava ao povo KIUNGA, que estava totalmente abandonado; às 13,15 recomeçou a marcha, sendo atravessada a mata de KIKINGA, muito densa e extensa e às 14,30, entrava na mata KINGA. Já dentro da mata se encontrava toda a guarda avançada, dois pelotões do grosso da coluna e a peça, quando a flecha, a cuja frente marchava o tenente Ribeiro d’Almeida, ao chegar junto do riacho de Kinga, foi alvejado por uma descarga, indo um dos projécteis arranhar a mão esquerda daquele oficial e um outro furou-lhe a pestana do dólmen, na altura do estâmago;

Dominada a perturbação que se manifestou entre as praças da extrema guarda avançada, começou-se a responder ao fogo inimigo que era especialmente sobre a direita da coluna; parecia que o fogo do inimigo fora dominado, quando, do mesmo lado, se fez ouvir uma grande algazarra que, começando na altura da testa da coluna se propagava rapidamente lado da cauda, sendo então a coluna atacada em toda a sua profundidade por um fogo, vivíssimo.

O 1º. Pelotão do grosso da coluna (tenente Camacho) e a 1ª secção do 2º portaram-se bem; mas a 2ª secção deste (tenente Teixeira) retirou precipitadamente sobre os carregadores onde levariam o pânico se não fosse prontamente contida pelo tenente de serviço de administração militar Costa Alves e capitão médico Sá, cuja enérgica intervenção conseguiu deter aquela secção. O gentio retirou, não tornando a ser pressentido.

A coluna perseguiu até ao alto que pelo Sul domina a mata da Kianga e aí, posta a peça em bateria foi feito um tiro de granada com balas sobre um provável ponto de passagem forçada do gentio, não são conhecidos os efeitos desse tiro…”

… “ O ataque foi repelido pelas faces atacadas, sendo digna de registo a forma por que o 1º pelotão avançou para o inimigo, de arma ao ombro, num gesto à Lassale; o inimigo pôs-se em fuga não tornando a fazer-se ouvir senão à distância de 1500 metros da face sul, sendo então feitos alguns tiros só por atiradores escolhidos e lançada para ali uma granada, o que fez terminar de todo o fogo do gentio.

No início do ataque, os carregadores que tinham ido ao rio refugiaram-se dentro do quadrado e comunicaram ter visto um cadáver flutuando na água.

Durante o ataque feito ao quadrado o gentio chegou a aproximar-se 80 metros das faces atacadas. O pelotão Ribeiro d’Almeida voltou ao seu bivaque como partira marchando em linha, de arama ao ombro.

No dia 24 a marcha foi iniciada às 6,30; a marcha fez-se debaixo de um sol ardentíssimo, a uma temperatura abrasadora; às 15 a coluna atingia o rio Pondadina, onde imediatamente se apresentou o soba D. Álvaro N´Jinge e, pouco depois, uma pequena força que viera de S. Salvador ao encontro da coluna. Depois de distribuída uma refeição fria, a coluna pôs-se de novo em marcha, entrando em S. Salvador às 17,30, sendo recebida pelas mais calorosas manifestações de entusiasmo e de alegria pela população católica refugiada na fortaleza. A essa hora, os que na metrópole são sistematicamente detratores dos trabalhos nas colónias, interrompiam por momentos os seu folgares para com maior ímpeto a ele voltarem terça feira de carnaval ……… (aspas do relator)

Antes de encerrar a narração da marcha para S. Salvador é necessário consignar um facto que deixou de sê-lo na altura adequada; é na marcha do dia 21 a guarda da retaguarda foi pertinazmente atacada e cumpriu com brilho, sob as ordens do tenente José Francisco Filipe o seu espinhoso papel.

“ No dia 23, pela 8,30, ouviram-se tiros na direcção do cemitério; o gentio avançava em força por esse lado, aproximando-se até junto da casa holandesa. Saiu ao encontro do gentio o pelotão do alferes Gama, partindo também, pelo caminho de Banza Puto, o pelotão do tenente Ribeiro d’Almeida que ia tentar cortar a retirada ao gentio. Pouco depois prenunciava-se um outro ataque do gentio pelo caminho de Cunga aproximando-se da estação postal e indo até junto d’umas palmeiras que ali se encontram; ao encontro deste ataque marchou o pelotão do tenente Teixeira. Algumas horas depois regressava o pelotão do alferes Gama que tinha repelido o inimigo na direcção do caminho de Quiálundu, indo uma secção d’este pelotão reforçar o do tenente Teixeira que continuava empenhado em fogo vivo contra o gentio, sem que o combate se decidisse Mal tinha acabado de partir esta secção manifestou- se outro ataque do gentio, pelo lado Sul da fortaleza, em um alto cultivado de mandioca a 300 metros de distância; as balas passavam bastante baixas, especialmente por sobre o baluarte S.O. Contra este ataque marchou o pelotão do tenente Camacho que repeliu o inimigo e o perseguiu até ao rio Luége, causando-lhe bastantes baixas o ataque durou atá às 16 horas.

Pouco depois avistava-se da fortaleza a 2000 metros de distância, na direcção de Banza Puto, um magote de gentio que retirava e que foi disperso com duas granadas.

No dia 26, às 8,30, o gentio atacou e queimou, à vista da fortaleza, o povo da Quincanda; para ali foi feito um tiro de granada com bala que atingiu o objectivo, como foi verificado no dia imediato pelos rastos de sangue que ali foram encontrados.

Na tarde d’este dia foi o Ex Governador do distrito informado de que os quarteis generais dos rebeldes, eram principalmente em BANZA PUTO e CUNGA. N’estas condição determinou o comandante da coluna que em cada um dos dois dias seguintes fizesse atacar aquelas povoações e assim, em 27, um destacamento composto dos pelotões Ribeiro d’Almeida, Teixeira e Gama, partiu às 3,30 para Banza Puto que pretendia surpreender; noite era bastante escura e, segundo declarou o tenente Teixeira, foi isso que deu causa a que o seu pelotão, que ia na cauda, perdesse o contacto com o que o precedia, na passagem do rio Luége. Tendo ainda notado a falta d’esse pelotão, procurou-se reunir a coluna, o que só foi conseguido ao alvorecer, fracassando assim a surpresa; chegou mesmo quase surpreendida uma sentinela que os rebeldes tinham a meia encosta do morro de Banza Puto.

A povoação foi tomada depois de curtíssima resistência, seguindo a coluna, de pois de a destruir, para o Norte, queimando seis povos um dos quais o mais importante era Kimpege. Feito isto, regressou á fortaleza pelo caminho da Quimuanda, entrando em S. S. Salvador às 18 horas. Em todos os pontos atacados a resistência foi mínima, retirando o gentio na direcção do Muingo e de Congo Diacati.

No dia 28, às 4, saiu de S. Salvador um destacamento constituído por os pelotões Camacho e Filipe e por uma secção do pelotão Gama, comandada pelo sargento Vergílio, força esta que foi atacada pelo gentio logo à passagem do rio Lungueje, onde se travou um combate, em que foi ferido em uma perna, que teve de ser-lhe amputada, o 2º. Cabo indígena Francisco Lopes, nº 66 da 2ª Companhia. Este cabo, que se portou admiravelmente em todas as sortidas que fez por ocasião dos primeiros ataques a S. Salvador, ora assumindo o comando de 4 praças indígenas, ora incorporado na força de diminuto efectivo com que o sargento Vergílio repeliu todos os ataques que o gentio fez, ficou inutilizado por uma armadilha colocada no meio do capim; no momento em que foi ferido marchava na frente da flecha. Repelido o gentio da margem do Luége….

… “ O destacamento contínuo a sua marcha para Cunga, que foi rapidamente destruída e d’essa importante povoação dirigiu-se para o Sul, queimando na sua marcha mais três povos, travessou o rio Cose (?), queimou o povo de Lombe e foi até Pembeje, um dos focos da revolta, e aí, depois de um curto combate com o inimigo tomou o povo, que destruiu, regressando à fortaleza às 18,30.

No dia 29 de fevereiro o comandante da coluna, capitão Cardoso, informou S. Exª Governador de que havia apenas 8 dias de víveres para toda a coluna e que era necessário remuniciar as forças. Foram dados três dias de descanso e organizou-se entretanto um comboio com 170 carregadores – todos os que havia – escoltados por 61 praças indígenas, 1 corneteiro, com dois sargentos, sob o comando dos tenentes Teixeira e Costa Alves, que partiu em 4, da tarde, indo acampar em Pendaina. Aos oficiais tinha sido recomendado que, encontrando-se o Ex Governador em negociações para apresentação dos rebeldes da Tunda e Lungueje, deveriam usar da máxima prudência durante a marcha.

No dia 5 o comboio recomeçou a sua marcha para a fronteira, seguindo o caminho habitual, atravessando todas as matas sem o mínimo incidente até Kienga, onde acampou. No trajecto, mesmo junto do caminho, foram vistas umas mulheres n’uma lavra e a estas foram comprados mantimentos para indígenas. Tudo parecia indicar que o gentio se dispunha a mudar de atitude. Grande foi, pois a surpresa de todos, quando, depois de algumas horas de marcha em 6, achando-se a força e o comboio quase completamente internado na mata, rompeu repentinamente o fogo por todos os lados. Este combate começou cerca das 12 e terminou às 14,30 tendo sido feridos muito gravemente o soldado nº 1 da 3ª companhia e um carregador zombo dos que tinham acompanhado, de Maquela para S. Salvador, a força do alferes Gama.

Repelido o inimigo continuou a marcha para o Luve, onde se acampou sem mais incidentes.

Por informações posteriormente colhidas veio a saber-se que os rebeldes tiveram cinco morto n’esse combate.

Foi muito grande a demora do comboio no acampamento do Luve, por causa da necessidade de transportar munições através do Congo Belga; a indispensável licença foi, como sempre, pronta e gentilmente concedida, mas, d’sta vez, houve uma certa demora na sua comunicação às autoridades locais. Daí ressoltou que o pessoal do comboio e a respectiva escolta se viram obrigados viver de víveres que deveriam conduzir a S. Salvador.

No acampamento do Luvo apresentaram-se o capitão Martinho José de Sousa Monteiro e os tenentes António de Almeida Borges e António de Matos, todos colocados na 20ª companhia, devendo ainda o 1º destes assumir o cargo de Capitão –mor, em substituição do capitão Alfredo Baptista Cardoso que, por ordem do Ministério das Colonias, deveria seguir imediatamente para a metrópole a fim de prestar provas para a promoção ao posto imediato.

Recebidas finalmente as munições o capitão Martinho Monteiro divide o efectivo presente em 4 grupos, dando a cada oficial o comando dum deles, e pôs-se em marcha para S. Salvador no dia 14 de Março, acampando nesse dia no SOKO, em 15 em KIENGA, em 16 no LOLO e chegando a S. Salvador em 17, transportando, quanto muito, 12 dias de viagem para toda a coluna. O inimigo só fora visto no dia 15, em que atacou a coluna, sendo repelido pelo tenente Matos, que, apoiado pela força do tenente Borges, marchou sobre o povo a que esse gentio pertencia e o destruiu.

Como fosse bastante difícil a passagem do rio e mata do LOLO, tinha para ali partido em 12 uma força de 60 praças, sob o comando do tenente Filipe, faim de garantir aquela passagem.

Esta força saiu de S. Salvador com 3 dias de víveres, que se esgotaram em 14, não obstante o que ali permaneceu até 17, data da chegada do comboio a Lelo….

…” O destacamento deu entrada em S. Salvador em 2 de abril; as tropas estavam bastante depauperadas por efeitos das fadigas sofridas e pela acção dos temporais quase quotidianos a que esteve absolutamente exposto sem dispor do mais insignificante abrigo. Não foi isto porém que deu lugar a uma interrupção nas operações activas; foi sim a falta de víveres e a necessidade de reabastecer e remuniciar, e, pior ainda a demora havida em tais operações.

Como a acima se disse, era intenção do Ex Governador que a coluna partisse de S. Salvador, logo que ali regressasse o destacamento a Quimbubuge; a presença do vice-cônsul inglês, Bell, e, também o inquérito a que procedia o capitão Cardoso aos actos do alferes Gama, como comandante militar de S.Salvador enquanto exercera aquele comando, demoraram a partida, que só teve lugar em 11 de Abril.

A composição da coluna era a seguinte: 4pelotõres de infantaria a 40 praças, respectivamente comandados pelos tenentes Filipe, Teixeira e Matos e alferes Gama. I peça de 7 sob o comando do tenente Ribeiro de Almeida, ficando em S. Salvador, gravemente doente o 1º sargento Isidoro, tendo essa guarnição um sargento e 1 cabo de infantaria e duas praças indígenas para serviço de ambulância e chefe dos serviços administrativos. A coluna era comandada pelo capitão Monteiro, acompanhavam-na o Ex Governador e o capitão Cardoso.

Segundo as comunicações recebidas em S. Salvador até ao da partida era o seguinte o estado da rebelião no distrito: a revolta de QUIFUMA e de QUELLO estavam no mesmo pé, sem gravidade imediata; na área da circunscrição de NOQUI havia absoluto sossego; durava ainda a rebelião na DAMBA e no BEMBE.

Em face desta situação o objectivo da coluna era: marchar sobre o rio Luso e destruir o povo do mesmo nome, para castigar a sua atitude anterior de desfazer a impressão da retirada a que a coluna do capitão Cardoso tinha sido obrigada; montar ali um posto que, ao tempo se suponha que completada com blackhaus sobre o rio Lunda, garantiria a comunicação Noqui – S. Salvador, guarnecendo desde logo esse posto um pelotão; prosseguir a marcha com os três pelotões restantes até ao rio M’Pozo, destacando ali um pelotão que escoltaria todos os carregadores disponíveis, que iriam a Noqui efectuar o reabastecimento de viveres e munições. Os dois pelotões que avançavam até o M’Pozo bateriam na direcção Sul. Toda a região entre o M’Pozo e Luso até às nascentes deste rio e regressariam ao acampamento do Luso, marchando para ao longo da margem esquerda. O pelotão que ia a Noqui, reforçado por 150 praças requisitadas a Loanda (18º Companhia) marcharia até ao Luso onde, reunidas todas as forças disponíveis se organizariam duas colunas ligeiras que marchariam para S. Salvador, seguindo uma delas o itinerário Vembo-Lungueje o outra por Kiende e Cunga.

Nada disto, porem, se pôde realizar, porque, quando a coluna chegava ao acampamento no rio Zoge, chegou um escoteiro vindo de S. Salvador com correspondência urgente e por ela se soube que a revolta alastrara em S. António, para onde tivera de ser enviada a 18ª companhia; que a região de Noqui se sublevara também e que o gentio dali, bem informado ao que se vê, tencionava ir atacar a força que sabia pequena, que escoltaria o comboio a Noqui.

Na fixação de objectivos da coluna à partida de S. Salvador, não quisera o Exº Governador ter em atenção a absoluta falta de víveres com a mesma coluna teria a lutar, especialmente os pelotões que tinham de aguardar o regresso do comboio; o pessoal todo estava já habituado à fome, para o pessoal indígena contava-se alimentá-lo com a mandioca das importantes lavras do Luso e o europeu teria de recorrer à mesma alimentação, porque acima de tudo era necessário proceder com rapidez. Não contara porem com uma tal modificação na situação nem aqueles que se encontravam em S. António e Noqui a tinham previsto apesar de estarem em bem melhores condições para a estudarem; esta mudança radical da fase dos acontecimentos não podia deixar de actuar no procedimento a adoptar.

…” Na marcha a coluna de S. Salvador para Noqui, pois que em face da nova situação o Exº Governador resolveu que toda a coluna marchasse até este último ponto, foram atacados e destruídos os povos de Solo e Quimuana em 12 de abril, depois de parlamentar algum tempo, no fim do qual o gentio declarou que não se apresentava; travou-se combate na margem do rio Lunda, quando se tentava reconstruir a antiga ponte pênsil, cujo tabuleiro o inimigo destruíra, em 13 e ainda no dia imediato a fim de atravessar um rio em um ponto diverso, 880 metros a montante daquele em que se fazia uma demonstração, no dia 14; a marcha do dia 15 fez-se sem incidentes, tendo contornado a mata de Cuimba, atravessado o rio Lujamba (?) e a mata de Diadia, acampando no morro de Quiando; em 16 travou-se um combate no Luso e efectuou-se passagem deste rio, indo a coluna acampar junto do antigo povo do Congo Diantino, no alto deste nome; no dia 17 a coluna atingiu o rio M’Pozo, assaltou o povo de Dinga que reduziu a cinzas depois de um combate em que o gentio opôs grande resistência, atravessou aquele rio e foi acampar na margem do rio Lufunde; no dia 18 deu-se o combate da mata da Lembe, em que o gentio perfeitamente ocultado, esperou que toda a coluna se tivesse internado na mata, para atacar simultaneamente em toda a sua extensão, mas mais especialmente sobre o trem de comboio que marchava em seguida à guarda avançada, com a peça, na testa do grosso da coluna e ainda na resta do pelotão que constituía a guarda da retaguarda ; na marcha de 19 foram notados bastantes vestígios de passagem do gentio em direcção às matas mais embrenhadas e às passagens mais difíceis do caminho habitual, tendo-se evitado o combate em atis condições de inferioridade em razão da falta de munições e da necessidade de não demorar a marcha, por absoluta carência de víveres, o que não impediu todavia que se desse combate no rio Quincuno, (?), depois de que a marcha continuou, indo a coluna acampar na margem esquerda de Quenguele; no dia 20, transposta a mata de Caso, recebeu o Exº Governador a informação de que o gentio de Vequi (?) queria apresentar-se, razão pela qual a coluna fez alto; dando-se a apresentado três sobas com os seus séquitos, recomeçando a marcha às 13,30, chegando ao campo de segregação de Minguengue às 18,30.

Em todas as acções travadas nesta difícil marcha, salienta o comandante da coluna a intrepidez do sargento Virgílio e o magnifico serviço do tenente António de Matos que comandou a guarda avançada em toda a marcha desde S. Salvadora Noqui.

Nesta série de combates tivemos as seguintes baixas por ferimentos:

20ª Companhia, soldado 177, Manuel Landa, e 2ª Comp. Soldado 72/728 N´dala, em 13 de abril, na passagem da Lunda, 2ª Comp. 1º Cabo 125/402,Pena, em 16 abril, no ataque ao povo do Luso; 1ª Comp., 2º sargento 23/466, Casimiro António Pais Dias, no dia 18, no combate da mata do Lembe. Além destes foram feridos dois auxiliares de S. Salvador, e algumas baixas houve de carregadores.

Foram consumidas 8 lanternetas, 8 granadas com balas.

Chegada a coluna a Noqui no dia 20, informado o Exº Governador do estado da rebelião na área de Noqui, partiu em 22, com uma força de 63 praças, sob o comando do tenente Ribeiro de Almeida, embarcando na canhoneira Save a fim de fazer várias “ poussés”, partindo dos portos do litoral do Zaire e mais rapidamente castigar os rebeldes. Assim em 22 foram queimados dois povos no interior de N’CHOBO e em 23 outros dois no interior da pedra de Feitiço, posto que o gentio atacara e destruíra, aproveitando-se da circunstância de estar desguarnecido, encontrando-se ali apenas um velho indígena, guarda da alfândega, que mal teve tempo de fugir; nesse dia 23 foi encontrado pela Save o palhabote em que a 18ª companhia andava de conserva…. No dia 25 a força do tenente Ribeiro de Almeida e o Exº Governador regressavam a Noqui e, pouco depois, chegava ali o Ex Encarregado do Governo Geral da Província. N’esse dia se apresentou em Noqui o chefe de estado maior das forças em operações, nomeado pelo Ministério das Colónias a requisição do Exº Governador Geral da Província….

…” Já foram expostas na primeira parte deste relatório as informações que sobre a situação eu podera obter em Portugal, antes da minha partida para a província. Essas informações eram concordes em que a revolta em S. Salvador já estaria subjugada quando eu na província eu desembarcasse; restar-me-ia apenas tratar da organização da coluna que deveria ir ocupar o POMBO e o SOSSO e para tratar dessa organização eu calculava poder contar com o tempo a decorrer entre o meu desembarque, em meado de abril, e o inicio das operações que poderia ser protelado até meado de junho, e que dava, deduzido tempo necessário para o trajecto, que eu tencionava fazer pela Lunda, cerca de um mês, que seria empregado em utilizar, digo ultimar, porque sabendo-se que a coluna do ano anterior, sofrera, senão um desastre pelo menos um fracasso, de supor era que alguma coisa estivesse feito já. Informações particulares diziam-me mesmo que encontraria em Luanda 500 praças armadas, equipadas e instruídas, destinadas aquelas ocupação.

Nada d’isto correspondia à verdade; a situação em S. Salvador apresentava um aspecto bastante grave e ainda não era fácil calcular em que época esse aspecto mudaria, a ponto de permitir que nos abalançasse a avançar para o POMBO, deixando toda a região de S. Salvador na rectaguarda, pois que, segundo as instruções que me deixara o Exº Governador-geral, a invasão do POMBO e SOSSO deveria ser feita partindo da DAMBA, e as forças a isso destinadas deveriam marchar para ali, pelo caminho NOQUI – S. SALVADOR – DAMBA; de resto, não havia notícias de S. Salvador que dessem uma ideia nítida da situação; a revolta de SANTO ANTÓNIO assumira um aspecto da maior gravidade, como nunca tivera anteriormente, a ponto de ter sido necessário mandar para ali a 18ª Companhia, com os seus 180 recrutas; em NOQUI rebentara a revolta com tal ímpeto que a população daquele antigo centro comercial se julgava em grave risco e expedia telegramas sobre telegramas pedindo que para ali fossem enviadas forças, que não podiam ser fornecidas porque não existiam; por sua vez, a população de S. António, expedia em 22 de abril, ao Exº Encarregado do Governo-geral, um telegrama de tal forma alarmante, que aquele senhor resolveu ir ali imediatamente, devendo eu acompanhá-lo a fim de me inteirar da situação e entrar em exercício. No quartel-general nada se sabia da situação das forças então empenhadas em operações, e que era inteiramente natural quanto a S. Salvador que tinha comunicações cortadas, mas não tinha explicação quanto a S. António, ligado a Luanda por um linha telegráfica que funcionava perfeitamente, apesar de que nada se sabia a respeito da 18ª companhia que para ali partira em 2 d’esse mês.

Assim, o meu primeiro acto tinha sido, como é natural, procurar conhecer da situação pelo exame de todos os documentos com ela relacionados, existentes no quartel-general e na repartição do Gabinete, e, ao mesmo tempo, averiguar do paradeiro desconhecido das forças, para estudar a possibilidade da sua reunião, preparando assim a acção com o máximo dos recursos, e tentando, se possível fosse, liquidar a situação de S. Salvador, pelo menos, pois que era ali o centro da rebelião, para poder dar cumprimento às instruções recebidas, na parte respeitante à ocupação do Pombo e Sosso, para a qual, a esse tempo, começavam a organizar-se as 23 e 24 companhias. Ainda, quanto a Santo António, o quartel-general supunha que ali deviam estar 300 homens; contudo nada se sabia ao certo pois que o capitão, nem instado, comunicara a chegada da 18ª companhia.

Em resumo, a situação, pela absoluta carência de notícias, parecia ser a seguinte: A 20ª companhia engarrafada em S. Salvador, aflitiva a situação no Bembe, cercado, sem víveres nem munições; 300 homens em parte incerta na área da capitania de S. António do Zaire. A Solução que se apresentava era a seguinte: ….

…” Concentrar 100 homens em S. António para com eles marchar em socorro ao BEMBE, que marcharia por QUIFUMO-QUELLE e MOCULA, batendo, na sua passagem, sem que se detivessem mais do que o indispensável, estas regiões, força que seria reabastecida pelo porto de Mocula; empregar os restantes 100 homens em operações activas em S. António. A força com que marcharia para S. Salvador, uma vez ali chegada, reunir-se-ia a todas aquelas que se pudessem concentrar sem prejuízo da defesa de S. Salvador, marcharia para o Bembe, onde se reuniria com a força ida de S. António, e bateria os povos da Quivuenga, do sul para o norte, afim de evitar que se refugiassem na região dos Dembos e ali levassem a revolta. A marcha para o Bembe implicava o prévio ataque da região de Quimbubuge. Batida a Quivuenga, as forças idas de S. António regressariam ao litoral por Bessa Monteiro e Ambrizete, ondeaguardariam instruções; as de S. Salvador, depois de reforçados os postos do Bembe e da Quivuenga, bateriam a região até à Damba, que seria reabastecida por via Tumba-Maquela- Quibócolo, serviço este que ficaria a cargo da companhia aquartelada em Maquela (1).

A verdade, porém, é que em S. António nada existia que se parecesse com 300 homens, pois que a 18ª contava 180 soldados, a 19ª, em compensação, era uma companhia quase virtual; mas; ao chegar a S. António, nem a 18ª ali se encontrava porque embarcara no cutter em que o Exº Governador (…?) no dia 23 de abril e, segundo o emprego que lhe destinara o capitão-mor, seria dispersa na guarnição de um posto no Sumba, que ali era, de momento, inútil pois que a povoação já fora destruída, outro na Pedra do Feitiço, guardando o esqueleto de um pavilhão Tellet, também incendiado pelo gentio, inutilizando-se ali, em homenagem a preconceitos que não pareceram oportunos, mais outros em Quissanga, Congo Iala e Mussuco, guardando também as ruinas e cinzas de postos ou estabelecimentos destruídos.

A Salvador Correia, onde seguíamos, foi encontrar a cutter que transportava a 18ª companhia, fundeada junto da Pedra do Feitiço, procedendo aí ao desembarque. Conforme o parecer de S. Exª o Encarregado do Governo, essas tropas foram embarcadas no Salvador Correia e d’ali conduzidas a Noqui, onde desembarcámos horas depois de ali desembaraçar o Exº Governador do Distrito, como vimos.

B) Operações posteriores a 25 de abril

Reunidos em Noqui, a bordo do Salvador Correia, os Exº Encarregado do Governo-geral e Governador do Distrito e o chefe do estado-maior das forças em operações, o Exº Governador do Distrito expôs a situação tal como ela se deduz de que ficou dito e deu conhecimento da impossibilidade em que as forças se encontravam de marchar de pronto; e isto por duas razões fundamentais: não havia viveres porque o quartel-general, em harmonia com as instruções que haviam sido dadas pelo Exº Governador-geral, respondera à requisição feita telegraficamente nos fins do mês anterior, que os víveres deveriam ser adquiridos nos mercados do distrito, que, na hipótese, se reduziam ao mercado de Noqui que nada tinha; ainda mesmo que houvesse viveres a impossibilidade de marchar subsistia, porque de Luandanão tinham vindo os carregadores pela mesma época requisitados ao Governo-geral, e os que ali se encontravam em Noqui, nesse momento não queriam continuar ao serviço da coluna.

Imediatamente foi dada ordem para que a requisição fosse satisfeita em Luanda, e esta foi preparada por acordo entre o chefe dos serviços administrativos e o do estado-maior; a canhoeira Save aprontou para partir na madrugada de 26, conduzindo a requisição que desde logo deveria começar a ser satisfeita, tendo-se expressamente solicitado do Quartel- general da província que nomeasse um oficial idóneo para assistir à verificação da qualidade e quantidade de géneros, pois que os precedentes mostravam que todos os cuidados havidos até aí, se alguns houvera, tinham sido insuficientes; A Salvador Correia partiria na tarde de 26 e receberia em Luanda os carregadores de Pungo Andengo, que ali deveriam estar desde 25, e conduzi-los a Noqui…”

Noqui…” Ao mesmo tempo que ali chegariam os víveres requisitados… “ Dentro de oito ou dez dias a coluna estaria habilitada a partir; e bem necessário era que o fizesse, pois que as apresentações dos de sobas das proximidades de Noqui, especialmente as que ficavam nas imediações do caminho do que a coluna deveria seguir, se repetiam, n’uma manifestação clara de que receavam o castigo que assim pretendiam evitar; o facto de ter o destacamento que batera Quimbubuge, regressado a S. Salvador sem dar um tiro, porque o gentio não apareceu, e ainda atitude dos povos de Solo e Quimuana, tudo levava a crer que os rebeldes se tinham apercebido de que não poderiam lutar connosco e começavam a “beber água” para se apresentarem. Se a acção da força tivesse podido ser imediata, decerto a rebelião de S. Salvador e a de Noqui, e as restantes, pois que todas elas tinham “a cabeça” em S. Salvador, teria sido rapidamente sufocada. Mas a coluna, que conseguira, enfim, ter um efectivo de cerca de 300 homens, foi obrigada a uma formidável inação durante um longo mês; para sair desta inação, teve de fraccionar-se pois que d’esta forma nunca conseguiria sair do campo de Minguengue onde se estiolava por numerosos motivos.

Passara já o prazo máximo de dez dias dentro do qual a coluna deveria estar reabastecida e deveria dispor dos carregadores precisos para a marcha e nada tinha, a não ser alguns carregadores precisos para a marcha e nada tinha, a não ser alguns carregadores que tinham sido recrutados em Maquela. Foram 95 os carregadores que tinham sido recrutados em Maquela que em Minguengue se apresentaram no dia 2 de maio; em 16 obtiveram-se 103 de Ambrizete e era tudo; havia facilidade de recrutar carregadores em Maquela mas apenas para o trajecto entre aquela povoação e S. Salvador, mas não para o trajecto por Noqui. Debalde foram expostos ao quartel-general as circunstâncias dificílimas em que a coluna se encontrava; debalde se instalou pela remessa imediata dos carregadores, cuja demora prejudicava irremediavelmente a acção da coluna; debalde se fez sentir que a honra das nossas armas exigia que a coluna seguisse pelo mesmo trajecto em que tinha seguido na sua marcha de S. Salvador para Noqui e que fazendo-se, como faria, se arriscava, por falta de carregadores, a ser aniquilada por inanição. Não houve forma de conseguir que viessem do Pungo Andongo, ou de qualquer outra das circunscrições do distrito de Luanda, os 150 carregadores que tinham sido requisitados com tanta antecedência que em 17 de abril me tinha sido comunicado pelo Exmº encarregado do Governo-geral que pelo administrador do Pungo Andongo fora informado de já estarem reunidos 100 carregadores dos pedidos, esperando que dentro de dois ou três dias estaria completo o numero de 150; a verdade é que o administrador do Pungo Andongo só pôde angariar 36 carregadores, velhos e esqueléticos, que em 27 de maio, de MAIO, note-se, vieram para o Congo onde deram trabalho que o seu serviço não valia.

Entretanto, em S. Salvador, a situação agrava-se de dia para dia com a fome crescente, a mandioca só por si, ou com pouco mais, não é, decididamente, alimento que sustente um indígena e muito menos um europeu, e mesmo essa mandioca era necessário ir busca-la às lavras dos rebeldes e para isso era preciso ir uma força que o efectivo em S. Salvador não podia dispensar com muita frequência. Tornava-se, pois, indispensável acudir quanto antes a S. Salvador e com esse fim se organizou um comboio que por via Songololo para ali saiu de Minguengue em 13 de maio seguindo para Matadi em 14, chegando a S. Salvador em (data não legível).

Em 28 de abril, pelos sobas fiéis das proximidades do Noqui foi o Exº Governador informado de que o gentio rebelde que já anteriormente atacara o posto do Mussuco e o incendiara, se estava reunindo nas proximidades do caminho de Mussuco-Congo, perto do povo de Lamba; com o fim de atacar novamente aquele posto que então se achava guarnecido por uma força da 20ª companhia, sob o comando do 2º sargento Virgílio. O ataque e esses rebeldes seria feito por um destacamento de dois pelotões (Teixeira e Lamellas), sob o comando do 1º e a este destacamento juntar-se-ia o que constituía a guarnição do posto que seria abandonado; com estas forças reunidas, o tenente Teixeira deveria abater o gentio concentrado, partindo do Mussuco, onde se dirigiria pela via fluvial, seguindo depois para Lamba, rio Mussabo, Quilango, Quimpangala, Quinsuca,etc, a Conge e Goma (1), que eram os dois principais centros da revolta na área de Noqui. Para ali se dirigiu o destacamento na tarde de 29 de abril, pernoitando no posto do Mussuco.”…

…” Informações recebidas na tarde de 29, pelos sobas de Muir e de Uéne, davam como certo que o gentio surpreendera as nossas intenções, em parte, isto é, prevendo um ataque a Conge, e contra esse ataque se prevenira, concentrando-se em dois grupos, em Lamba, povo no caminho Mussuco-Conge e outro em Lombe, no caminho Minguengue-Conge; estas informações foram imediatamente transmitidas ao tenente comandante do destacamento, que pouco antes embarcara para Mussuco e foi-lhe comunicado que um outro destacamento marcharia sobre os rebeldes concentrados em Lombe; aos dois destacamentos foram dadas instruções que, se tivessem sido cumpridas pelo tenente Teixeira, como foram pelo tenente António de Matos teria teriam tido como resultado entalar os rebeldes entre duas forças e entre dois fogos.

A marcha do destacamento Teixeira foi extremamente morosa e além disso o itinerário não foi cumprido, depois de um pequeno combate em Lamba em que o gentio foi prontamente repelido, como aliás parece não restar dúvida de que entrava nos seus projectos, o gentio marchou para o sul, em direcção a Conge, vindo ao seu encontro os rebeldes que tinham estado concentrados em Lombe, no caminho Minguengue-Conge. O destacamento do tenente Matos, que às 6 horas de 30 partiu do acampamento marchou rapidamente sobre Lombe, onde não encontrou o gentio, e, em harmonia com as instruções recebidas prosseguiu na sua marcha até Conge, onde se lhe deveria reunir o destacamento Teixeira, para dali seguirem sobre GOMA, onde se encontrava, ao que diziam as informações, o mais importantecentro revoltoso de toda a área de Noqui; o tenente Matos atingiu Conge que encontrou abandonado, em 1 de maio e enquanto esperava que se lhe reunisse o tenente Teixeira fez incendiar todas as povoações que se encontravam em um raio de 5 quilómetros. Como não houvesse indícios da aproximação do destacamento Teixeira e o destacamento apenas tivesse levado 3 dias de víveres, que eram suficientes para o desempenho da missão que lhe fora atribuída, retirou o tenente António de Matos para o acampamento, pernoitando em 1 de maio no Brandão e chegando a Minguengue às 11 horas do dia 2.

Pelas 18,30 entrava no acampamento de Minguengue o destacamento do tenente Teixeira, informando que tivera um combate com o gentio em QUIMPANGALA, onde tinha sido morto o 1º. Cabo europeu nº.50/513 da 18ª. compª Indígena, Manuel Simões, por tiro de arma fina, o alferes Lamelas fora ferido na articulação do ombro esquerdo, tinham também sido feridos nesse combate 3 soldados da 20ª. Companhia e 1 da 18ª., bem como um cipaio que servia de guia, além de 2 carregadores. O ferimento do cipaio fora também produzido por arma fina cujo projétil lhe atravessou completamente a cara um pouco abaixo das maçãs do rosto. O alferes Lamelas, ferido com certa gravidade manteve o mais absoluto sangue-frio e foi ele quem restabeleceu a calma onde se manifestara um pequeno pânico por efeito simultaneamente das baixas acima referidas. O gentio estava emboscado em uma densa mata, cheia de grandes pedras, que o tenente Teixeira procurou tornear junto da orla. De Quimpangala o tenente Teixeira retirou diretamente sobre o acampamento de Minguengue.

Ao capitão-mor de Santo António tinham sido deixadas naquelas povoações instruções precisas para a defesa, no caso absolutamente improvável de ser atacada pelo gentio, como o comércio daquela localidade receava, como o expusera ao Exº. Encarregado do Governo e a mim em 24 de abril, na sede da capitania. Em 26 foram dadas ao mesmo capitão-mor (instruções) mandando retirar as 10 praças que colocara em Quissaga e no posto de Sumba, constituindo com este efectivo uma coluna volante, cuja primeira missão consistia em reabastecer o posto de Quelle que lutava com falta de víveres e, seguidamente, castigar os rebeldes do Quifuma, Quinzau e d’ali para o sul, até Mocula; feito isto regressaria a Santo António e ali aguardaria as instruções que resultariam de um relatório a apresentar, devendo manter a força em constante movimento para não dar tréguas aos rebeldes enquanto estes não se submetessem, não executando, porém, movimentos de que resultasse a impossibilidade de se apresentar na sede da capitania dentro dum prazo de 4 dias…”

…” Como relatório de execução d’estas instruções só recebi em 27 de maio, estando então bivacado em Sande, um telegrama datado de 23 onde era comunicado o reabastecimento do posto de Quelle e o pedido de subalternos para serviço na capitania. Depois d’esta data deixei de ter comunicações com o litoral, isolados como estivemos em S. Salvador até que se pôde garantir a comunicação por Songololo.

Em 3 de maio dirigi ao quartel-general da província uma nova requisição de géneros que se destinavam à DAMBA, onde, conforme o projecto que então pretendia executar, a coluna deveria ser reabastecida e depois marchar por S. Salvador, Quimbubuge, Bembe, Quivuenga, n’esta conformidade foi ordenado ao comando militar da DAMBA que angariasse 350 carregadores que deveriam efectuar os transportes entre Tumba e DAMBA, e que tentasse com as forças que pudesse dispor, e no limite d’elas, actuar na direcção do Bembe. Sendo este o projecto a executar e tendo o Exº. Governador informado de que ao Ambrizete chegara um oficial com destino ao Bembe, foi dada ordem para que o mesmo oficial seguisse para Noqui, d’onde partiria com a coluna para o seu destino.

Em 4 de maio remuniciou-se a coluna à custa de munições que existiam da administração da circunscrição civil de Noqui, preparando-se assim que chegassem os víveres pedidos a Luanda que deveriam estar a chegar momento; previa-se então que a coluna partiria em 7, mas a canhoeira em Noqui no dia 6, o que por si só forçaria adiar a partida, mas, além carregadores, de forma que a impossibilidade de marchar subsistia ainda.

Em vista d’isto foi resolvido pelo Exº. Governador que a coluna, dada a impossibilidade de obter, para a marcha Noqui-S. Salvador, o número de carregadores precisos para o efectivo total, se fraccionaria em três partes, das quais uma, com 60 praças indígenas e graduados europeus, sob o comando do capitão Martinho Monteiro, escoltando um comboio com 60 carregadores, se dirigiria imediatamente sobre S. Salvador, cuja situação sob este ponto de vista era desesperada, outra sob o comando do signatário, com 129 praças indígenas, graduados europeus e oficiais, marcharia de Noqui para S. salvador, depois de bater as regiões do Quincanda e Goma, que constituíam os principais centros da revolta da área de Noqui, finalmente a 3ª., sobe o comando directo do Exº. Governador marcharia por Maquela sobe S. Salvador. Reunidas em S. Salvador as três frações em que o efectivo disponível era obrigado a dividir-se para poder viver, executar-se-ia, a partir d’ali, o projecto a que acima se faz referência. Esta ultima parte, teve, ainda, de ser modificada pela falta de víveres e pela necessidade de garantir as comunicações de S. Salvador com o litoral começando-se por manter a comunicação com Songololo, com a linha natural que é do abastecimento de S. Salvador, mais curta e rápida e ainda menos difícil de assegurar que a de Noqui.

Em 9 de maio era este o plano comunicado ao quartel-general em nota confidencial nº 10 em que dava conhecimento exacto das dificuldades e da delicadeza da situação e se mostrava quanto a demora da coluna em Minguengue agravava a situação do Bembe, que, no dizer do respectivo capitão-mor corria o risco de cair em poder do inimigo de um para outro dia. A demora dos carregadores comprometia irremediavelmente a acção da coluna e mais uma vez se insistia baldadamente pela sua remessa imediata. Demais, o posto de Quelle continuava e na arrecadação para partir logo de um para outo Save só fundeou d’isso, não trazia ainda à espera de ser reabastecido porque o capitão-mor do Zaire não conseguia ali levantar carregadores.

Em 11 de maio, porém, o chefe do Ambrizete comunicava telegraficamente ter prontos 100 carregadores, conforme lhe fora solicitado e logo foram adotadas as providências para que esses carregadores fossem imediatamente embarcados, devendo ficar 40 em santo António a fim de serem empregues no reabastecimentos imediato do Quelle, ao mesmo tempo foram fornecidos 15 soldados, sob o comando de um cabo europeu ao Ambrizete, afim de escoltarem um comboio de víveres e munições para socorrer o Bembe, devendo esse comboio ser comandado pelo tenente José Maria Fernandes, o oficial que se encontrava no Ambrizete com destino ao Bembe e que ainda não tinha podido seguir para Noqui por falta de transporte, procedendo-se assim porque tinham sido recebidas notícias que davam como suficiente uma escolta daquele efectivo para garantir o percurso do comboio…

…”N’esse mesmo dia era comunicado ao quartel-general que, não obstante se irem receber brevemente 60 carregadores do Ambrizete subsistia a necessidade dos carregadores pedidos a Luanda; em qualquer hipótese, porém, a fracção a que competia marchar por Noqui – M’Pozo- S. salvador, marcharia, embora soubesse que sem aqueles carregadores o seu comboio teria de ser tão reduzido que o mais pequeno obstáculo na marcha a colocaria em condições muito perigosas. Demais S. salvador só seria reabastecido quando ali chegasse a coluna do comando directo do Exº Governador e, enquanto se esperasse que esta ali chegasse quase ao mesmo tempo que a que seguia directamente de Noqui, qualquer embaraço que se desse agravaria a miséria em S. salvador pois que os seus recursos, reduzidíssimos, teriam que ser partilhados com o efectivo que, sob o meu comando, ali chegaria.

Durante o período em que a coluna permaneceu em Noqui e especialmente depois da acção do destacamento que sob o comando do tenente António Matos tinha destruído todos ou quase todos os povos da região do Congo, apresentaram-se muitos sobas da área da circunscrição do Noqui. Em 19 de Maio estavam apresentados os sobas dos seguintes povos: /:TOMBE, LENGUE, LUANDA PEQUENO, TOMBO, LONDO, VONDO, QUINGA, QUENDO, QUILEMBO, TAMBO, TAMBOCO, QUITIDE, FUACHI, QUINCAMA, QUISSEGUELE, TALA QUINZO, QUIOA, TENGA, SANDO, GINADE, QUIZAMBE, COMBO GRANDE, COOMBO PEQUENO, HITACULO, QUIMBUMBE.

Em 20 de Maio; partiu para Maquela do Zombo o tenente Agostinho Coelho da Costa, incumbido de ali angariar carregadores para a coluna que por Maquela seguiria para S. salvador e de recrutar auxiliares que deveriam colaborar com a mesma coluna. É que era de prever que a resistência a vencer fosse demasiada para o efectivo que por ali marcharia, calculado em 120 praças que, a sua maioria pouca ou nenhuma confiança poderia inspirar. D’essa missão se desempenhou cabalmente, como sempre, o tenente Peixoto da Costa, levantando mais carregadores pois que muitos deles fugiram, com se vê no relatório da marcha Maquela S. salvador. Os carregadores deveriam ser empregados a partir do momento em que fossem angariados no transporte dos géneros que eram dirigidos á estação do Tumba, e deveria estar concluído em 8 de Julho, para que a coluna dali pudesse partir em 10 do mesmo mês. Parte dos géneros que iam para a estação de Tumba destinavam-se a constituir um depósito na Damba, onde a coluna se reabasteceria no seu regresso da Quivoenga, mas os transportes entre Tumba e damba deveriam ser efetuados por carregadores angariados na Damba pelo respectivo comando militar para o que lhe foram dadas as necessárias instruções. O mesmo comando militar deveria, a partir de 10 de Julho, executar movimentos ofensivos na direcção do Bembe a fim de facilitar a cação da coluna que para ali marcharia, obrigando o inimigo a dividir-se, o que facilitaria a passagem do rio Lukunga em cujas margens a coluna deveria encontrar-se n’essa data, sendo provável que chegasse à Damba em 15 de Julho.

Tendo chegado a 19 de Maio, data que o Ex,º Governador partiu para o litoral para tratar da preparação da coluna de Maquela e de assuntos da administração do distrito, um cipaio conduzindo correspondência de S. Salvador, ordenei ao mesmo cipaio que coma máxima rapidez ali regressasse conduzindo uma nota confidencial destinada ao capitão-mor de S. Salvador, informando-o da data em que a coluna do meu comando estaria na margem do Lunda e determinando-lhe que n’essa data ali encontrasse uma força de 60 praças que garantiria a passagem do mesmo rio. Esta nota só e 1 de Julho chegou a S. salvador porque o cipaio que a conduzia se deixou ficar em Matadi não mais voltando a território português; certo é, contudo, que os rebeldes foram informados da data da minha chegada ao Lunda, pois que em S. Salvado, antes do dia 26, em que eu deveria chegar aquele rio, correu o boato de que os rebeldes da região tinham partido ao encontro da coluna que vinha de Noqui e não menos certo é que os encontrei, senão no Lunda, a meia hora de distância dali, de tal forma estabelecidos que tive de recusar o combate nas condições em que se apresentava….”  

” Saiu a coluna do meu comando do campo de Minguengue às 8,30 do dia 20 de Maio, levando além do médico e do tenente adjunto José Bettencourt da Camara, o tenente Manuel Moreira Flores (que com cabo de infantaria e duas praças indígenas constituía a guarnição da peça) 3 oficiais comandantes de pelotão (tenente Matos, Teixeira e Almeida); 120 praças indígenas e 6 graduados europeus, além de 95 carregadores que transportavam bagagens, artilharia, munições d’esta e a reserva de munições de infantaria e um dia de víveres. A primeira parte da missão da coluna era ir bater Quicanda e Goma, regressando ao caminho Noqui-S. Salvador na altura do rio Lué, onde em 22 acamparia o chefe dos serviços administrativos com o comboio que deveria assegurar a alimentação e o remuniciamento da coluna até a sua chegada a S. Salvador. Todas as informações cuidadosamente recolhidas e confrontadas, estabeleciam a certeza de que o percurso Quincanda – Goma-Lué, se faria sem fadigas de maior em três dias, contando já com a resistência que o adversário oporia, de forma que a coluna chegaria ao Lué na tarde de 22 e ali se reuniria ao comboio, ficando apta a prosseguir a marcha no dia 23; todas essas informações estabeleciam sem sombra de dúvida que de Quicanda a Goma mediava uma hora de marcha quando é certo que a coluna, marchando bem, gastou todo um dia para ir da quitanda de Quincanda (onde neste momento deve estar montado um posto) acampar à vista de Goma, tendo ainda duas horas de marcha no dia imediato para chegar àquele povo. Não foi, pois, em consequência dos combates de Quicanda e Goma, respectivamente em 21 e 23 de Maio que a coluna só chegou ao acampamento de Lué pelas 11 do dia 25; foi, sim, por causa das distâncias a percorrer, muito superiores às previstas.

Chegado àquele acampamento, onde o comboio me esperava desde 22 fui forçado a interromper a marcha para proceder ao reabastecimento, sem o qual, a dar-se, como previa e como sucedeu, qualquer embaraço à marcha da coluna esta encontraria na impossibilidade de marchar por falta de víveres.

No acampamento do Lué, efeito talvez do combate de Goma, apresentou-se o soba de Tomboco, importante sobado que ficava um pouco para o norte do mesmo acampamento, sendo-lhe logo requisitado carregadores para o transporte de um soldado doente para Noqui. Recebi aviso de que o soba de caia queria apresentar-se e ali iria, não comparecendo, porém, até a manhã de 28, em que ali parti. Ao acampamento foram muitos indígenas especialmente mulheres vender mantimentos às praças. Ali tive conhecimento de ter sido reabastecido o posto do Quello.

A marcha foi recomeçada em 28, e depois de um combate no Luso encontro no N’Kungo, chegamos a S. salvador em 5 de Junho, tendo verificado na véspera; à passagem do Sengue, que ali chegara no dia 27, permanecera acampado em 28 e retirara em 29, uma força que, sob o comando do tenente António José Camacho, saíra de S. Salvador, desde 20 de Maio até 5 de Junho a coluna que comandei teve as seguintes baixas: Soldado Ind. N.º 220/684 da 2.ª comp.ª Catito, ferido no combate do Goma, em 23 de Maio I auxiliar de S. Salvador morto e outro ferido no N’Kungo, em 2 de Junho; 2 carregadores mortos e 3 extraviados. (para mais pormenores V. os relatórios especiais de 20 de Maio e 5 de Junho).

Tinham corrido em S. Salvador boatos aterradores acerca da coluna que comandei: segundo uns a coluna teria sido impotente para vencer a resistência que lhe teria sido oposta nas margens do Luso; segundo outros, a coluna, atacada no Lunda pelo gentio que de S. Salvador e Madimba ali a tinha ido esperar, teria sofrido grossas perdas e teria sido forçada a retirar para Noqui.

No acampamento do Luso tinha sido encontrada uma carta que tudo levava a crer que tivesse sido escrita por um rebelde que a esse tempo deveria encontrar-se em Luanda; por minha nota confidencial n.º51 pedi ao quartel-general a captura do signatário d’essa carta, dando as indicações que da mesma constavam e que, se não eram em excesso, deveria bastar, contudo, para a polícia pudesse efectuar aquela diligência. Tudo parecia revelar que o signatário da carta em questão e seu patrão trabalhavam activamente na revolta da Canda, como já tinam trabalhado no Pombo, e que, no regresso de Luanda, iriam combater…”

…” No dai 7 de Junho, por portadores de correspondência da missão da B.M.S. da Mabaia para S. Salvador, apreendida por contravenção da legislação postal, fui informado de que tinha chegado ao Bembe o comboio que para ali tinha sido enviado do Ambrizete, conduzindo víveres e munições, juntamente com o reforço de 15 praças que constituíra a escolta do mesmo comboio e, bem assim, que as hostilidades tinham terminado ou, pelo menos, estavam interrompidas.

Tendo já reconhecido a esse tempo que o reabastecimento do Bembe pela coluna era imprescindível pela falta de carregadores em número suficiente e tendo ali mudado a situação, o que me era confirmado dias depois, assentei em uma modificação que as circunstâncias impunham e de que dei conhecimento ao Exº. Governador e ao quartel-general, juntamente com o relatório das operações efectuadas entre Lué e S. Salvador. Esta modificação ainda se tornou mais necessária em virtude do grande número de carregadores que havia a irradiar do serviço da coluna, por para ela não servirem, e pela fuga de um considerável número dos que a Songololo mandei, constituindo um comboio de reabastecimento. Por todas estas razões telegrafei, ou melhor, redigi um telegrama que deveria ser transportado até Songololo pelo comboio que ali ia ser enviado, daí transportado para Noqui, donde seria expedido por via Banana e cabo para Luanda; segundo este telegrama o Ambrizete continuaria a abastecer o Bembe até ordem em contrário; ao quartel-general pedia para enviar, com destino ao Bembe, 30 cunhetes com 600 cartuchos 11 mm H. e 30 tiros de peça para o posto da Quivuenga.

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Na ocasião da minha chegada a S. Salvado fui informado de que os rebeldes se encontravam em grande número reunidos nos povos do Vembo e Lunguego, tendo sido repelido o assalto que um destacamento, do comando do tenente Camacho, dera ao Vembo, dias antes da minha chegada a S. Salvador, assalto que ficara morto e em poder dos rebeldes um soldado com o seu armamento e munições. Assim, determinei que uma força de dois pelotões e uma secção (tenentes Borges e Matos e o 1.º sargento Rodrigues) com uma peça de 7c (1.º sargento Isidoro), se dirigissem a Lunguego donde deveria seguir para o Vembo, castigando ambos estes povos; e, para impedir que os do Vembo fossem reforçar os do Lunguego, a escolta do comboio que ao mesmo tempo partira para Sangalolo, iria acampar ostensivamente em Pondaina, de forma a prender a situação dos rebeldes do Nembo e a poder, em caso de necessidade, obstar à sua reunião por um simples movimento de avanço. Ambas as forças partiram de S. Salvador às 10 horas do dia 8 de Junho; o destacamento do comando do tenente Matos tomaria primeiramente o caminho de Maquela, que abandonaria a pequena distância de S. Salvador, procurando aproximar-se do Lungueje sem ser visto.

Em 13 de Junho regressou a S. Salvador o destacamento que tinha sido incumbido de bater o Lunguego e o Vembo, tendo destruído depois de viva resistência aqueles povos. O ataque do 1.º realizou-se no dia 10 de Junho sendo reduzido a cinzas a Banza do príncipe Garcia Nosso, o soba maior da região de Lunguege, incendiando-se 39 das suas habitações, conservando-se uma onde estava arrecadado bastantes cargas de isoladores de porcelana para a linha telegráfica de Noqui a Maquela e S. Salvador, que mais tarde foram removidos para o posto de Quissangue, com 18 habitações; no dia 12 foi atacado o povo do Vembo, sendo queimadas as suas 55 cubatas. Este destacamento teve um soldado ferido, o n.º 113/113 da 2º.ª comp.ª, José Fabião.

O comboio que se dirigia a Songololo foi atacado em quase todo o seu percurso, até mesmo junto da fronteira, especialmente na mata do Lolo, onde contrariamente às minhas instruções, que lhe mandei que a contornasse, se internou o tenente Camacho. Do acampamento na fronteira fugiram 44 carregadores e desertaram 3 soldados da 20.ª comp.ª e 1 d 18.ª…

…” O tenente Camacho chegado a Songolo retirou para Luanda por motivo de doença e porque lhe constava que no correio que eu receberia pelo mesmo comboio vinha ordem para que ele regressasse a Luanda.

Felizmente, apresentou-se no bivaque do Luvo o tenente Luís Rodrigues de Lemos, que tinha sido colocado no Congo, como muitos, mas que realmente veio para o Congo, o que a poucos sucedeu; só assim o comboio pôde trazer dois oficiais no regresso a S. Salvador, como levara ma marcha para a fronteira.

     Em resultado do ataque ao comboio no Lolo, tivemos um soldado morto, o nº 106/106 da 20.ª companhia, Manuel Quimbundo e um gravemente ferido que retirou para Noqui; também tivemos um carregador morto, além de dois que morreram por doença.

     Tendo recebido por intermédio de um cipaio indígena, que sozinho atravessou todo o território rebelde entre a fronteira de S. Salvador e que mais tarde veio a morrer por efeito de um ferimento recebido no combate do SOKO, uma comunicação do Exº Governador em que me informava de que a marcha da coluna do seu comando directo teve que ser retardada, pelo que só em 23 deveria encontrar-se em Cuimba, onde esperava encontrar grande resistência, mandei ali ao seu encontro, uma companhia e três pelotões, sob o comando do capitão Martinho Monteiro, força que saiu de S. Salvador em 21 de Junho e ali chegou em 24, felizmente a tempo de prestar à coluna do Exº Governador o serviço que dele se pretendia que era garantir, pela sua presença na margem ocidental do rio, a passagem da coluna, sem combate, Esta força era constituída pelos pelotões Borges, Lemos e 1.º sargento Rodrigues, no efectivo total de 5 sargentos, 5 cabos europeus e 121 praças indígenas.

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Este destacamento foi atacado em todo o trajecto a partir de Tanda até a Cuimba, consumindo 8000 cartuchos, mas não tendo nenhuma baixa a registar. O encontro com a coluna do Governador só veio a dar-se no dia 26 de Junho.

De facto, a coluna partira de Tumba em 13 de Junho chegando a Maquela em 19; os dias 20 e 21 foram empregados em repousar as tropas e organizar a coluna; em 14 a coluna bivacou em Quimuanandinga, desertando 11 soldados e fugido 114 carregadores, cujas cargas, no peso provável de 3500 quilos de géneros, tiveram que ser entregues ao soba fiel daquele povo para que ele os mandasse para Maquela, dado a impossibilidade de as transportar então para S. Salvador, no dia 23 o bivaque foi estabelecido na margem ocidental do rio Luango; em 24 foi destruído o povo do Kumba, tacado e incendiado e o povo de Malau; em 25 foi atacado Zinga, sem um tiro de infantaria, excepção feita dos dados por alguns auxiliares zombos, atravessada seguidamente a densa mata do Caio, dentro da qual o se encontrou riacho de leito profundamente encaixado, que o inimigo fortificara cuidadosamente de modo que a bater a coluna de frente e flancos, mas que não ousou guarnecer, depois de ainda foram incendiados dois povos dentro da mata, indo a coluna bivacar a 6 quilómetros do Cuimba; em 26 atravessaram-se duas matas, foi avistado o destacamento de S. Salvador, e atacado e destruído Banza Cuimba donde o gentio fizera uns tiros, sendo depois batidas todas as matas próximas, mais tarde, uma outra mais a Sul, donde, na noite anterior tinham sido feitos tiros sobre a força do capitão Monteiro, destruindo-se ainda mais 4 povos dentro da mesma mata; em 27 a coluna acampou em Lombélua; em 28 de foram destruídas todos os povos da regiões Gombe Iongo, Vivi, Macóto e Pango sendo apreendidas muita criação e gado miúdo e danificadas, quanto possível, as lavras, em 29, na passagem do Luve, foi encontrada uma luneta muito bem traçada e construída mas que os rebeldes não resolveram a guarnecer em defender, atacando-se em seguida Banza Tanda, sendo por sua vez atacada a coluna na mata do Muingo, incidindo o ataque especialmente sobre artilharia que, marchando então a redado as peças carregadas com lanterneta, se encontrou em condições de se defender por si própria, no dia 30 a marcha fez-se sem incidente algum, e, finalmente, em 1 de Julho a coluna de Maquela entrou em S. salvador às 14,30….”

…” A coluna do comandante do Governador tinha seguinte composição: / 8 oficiais, 11 graduados europeus, 184 cabos e soldados, 5 corneteiros, 649 auxiliares e 526 carregadores. Na sua marcha de maquela até S. Salvador, teve apenas uma baixa e essa causada por desastre; foi vitima o soldado n.º 249 da 18.ª Comp., Alberto, do destacamento do capitão Monteiro foi ferido o soldado 127 /127 Gonsa Fragoso.

Era indispensável dar aos povos rebeldes um castigo severíssimo que fizesse de exemplo e perdurasse na tradição. Por isso foi resolvido aniquilar completamente quantas lavras se pudessem destruir a fim de render pela fome o gentio que, por outra forma, pode impunemente conservar-se arredado da acção da autoridade. Além desta havia uma outra razão: era preciso proporcionar alimentação aos carregadores e auxiliares que, a serem alimentados pelos poucos recursos dos serviços de subsistência, os consumiriam em muito pouco dias. Para este fim, em 5 de Julho às 9 horas, partiu de S. Salvador uma força de dois pelotões (Almeida e Magalhães) acompanhados por todos os auxiliares e carregadores disponíveis, no efectivo total de 1300 homens, com destino às lavras do Vembo que deveriam desaparecer completamente; durante cinco dias foi arrancada e destruída, metodicamente, toda a mandioca que não era possível transportar para S. Salvador e calculei, na ocasião do regresso, em 10 de Julho, que a mandioca trazida para S. Salvador pesasse de 25 a 30 toneladas, no mínimo; quanto à que foi destruída calculei-a em 800 toneladas, por mais elevado que tal número pareça, sendo minha convicção de que este número muito inferior ao verdadeiro.

No dia 18 de Julho pôs-se a coluna em marcha, para o Luvo. O seu objectivo era: castigar os povos rebeldes do Lunguego, Soko, Volunga e Zulumengo; montar postos de LOLO e LUVO para garantir as comunicações de S. Salvador; reabastecer a coluna por forma a habilitá-la a prosseguir as operações para o lado de Madimba. Donde se seguiria através da Canda e se montariam os postos da Canda, Cuimba e Tanda, assegurando a ocupação da Canda, importantíssimo núcleo da revolta que dispõe de grande quantidade de armamento e, garantindo as comunicações Maquela-S. Salvador. Mais tarde viriam de Luanda as 23.ª e 24.ª Companhias e com elas se procederia à ocupação da circunscrição civil de Noqui e ao estabelecimento da comunicação da Mainda, pela acção a exercer pelo posto do Luso nessa direcção.

Partiu a coluna no dia 12, às 14 horas, alcançando o povo da Pondaina, o único fiel, às 15,50 e bivacando às 17,50; em 13 às 8,50 era a coluna atacada na mata de Culo, combate que durou até às 9,50 e no qual tivemos cinco auxiliares feridos; a coluna dirigiu-se seguidamente para o morro no qual se daria um grande alto curativo de feridos, sendo nesta ocasião morto por um tiro, dado do capim, á distância máxima de dez metros, um carregador. Do morro onde acampou foi avistado um povo, o do Conde Mianfingui, entre duas matas e para ali foram feitos três tiros de granada com balas, depois do que os pelotões Oliveira e lamelas para ali avançaram com um grupo de auxiliares, incendiando o povo, sem terem encontrado resistência. Mais tarde soubesse que o soba, que estava em cima duma palmeira observando as manobras da coluna, foi morto por um estilhaço de granada. Recomeçou a marcha às 12,45, marcha extremamente penosa porque o gentio, a 200 ou 300 metros na frente dos elementos mais avançados da coluna e sempre perfeitamente ocultado, ia largando fogo ao capim, fogo que ainda por um momento causou um certo pânico entre os carregadores que conduziam as munições que acompanhavam a peça e; pouco depois, cortava a cauda do comboio; para fugir ao fogo, abrigou-se a coluna em uma lavra, a 1.ª de Lunguege e ali esperaram que o fogo passasse para sotavento do caminho a seguir. Enquanto a coluna se encontrava refugiada na lavra começou a correr entre auxiliares a notícia de que o gentio nos esperava na quitanda, retirando o inimigo aos primeiros tiros para um povo próximo, o povo do Coxe; a coluna dirigiu-se então para esse povo, donde o gentio retirou, após alguma resistência, para uma ravina profundamente encaixada e densamente arborizada, no fundo do qual corre o rio Lunguege; ali foi perseguido peal guarda avançada e, tendo sido reconhecida a importância desta para desalojar o inimigo, foi mandada retirar para se poder utilizar o fogo de artilharia, depois do que a avançaram para o rio dois pelotões (Rosa e Oliveira) , que ainda foram reforçado pelo pelotão lamelas: O inimigo achava-se muito bem abrigado pelos espessos troncos de mufaneiras em que praticara entalhes que lhe serviam de cavaletes, de forma que o tiro era de extrema eficácia…”

…” Depois do ataque extremamente enérgico e em que se salientou o tenente Rosas, o gentio abandonou a defesa da passagem do rio, pretendendo ainda sustentar-se junto do povo do Lumuéno, mas sendo prontamente forçado a retirar dali, sendo então o povo assaltado e incendiado. Neste combate tivemos um morto e cinco feridos, entre os quais o 2.º Sargento Luís Quintino Magro que dirigia os auxiliares e que foi ferido simultaneamente na coxa direita e na face esquerda. Neste combate foram consumidos 7596 cartuchos, 8 granadas com balas, uma lanterneta e duas granadas ordinárias.

Já de noite o gentio dentro da mata começou a injuriar o governo, pelo que, tendo sido estabelecida conversações para se fixar a direcção em que ele se encontrava, foi feito um tiro de granada com balas à distância de 600 metros, que era aquela em que tinha sido calculada, de dia, a distância do povo do Paza, em que pareciam estar reunidos neste momento; constou mais tarde que este tiro atingira o seu objectivo e que é certo é que não mais falaram nessa noite. Como medida de precaução ficou durante a noite um terço do efectivo em armas.

No dia 14, depois de completado o municiamento das praças saíram alguns pelotões para razias e para queimar mais alguns povos existentes então dentro da mata de Lunguege, sendo queimados cinco.

Em 15 a coluna recomeçou a sua marcha, atravessou o rio Lunguege chegou ao povo de Muinge que foi destruído sem resistência, depois de que danificou quanto possível uma enorme lavra de mandioca, espantosamente desenvolvida, e foi atravessar o Lunguege pela 2.ª vez, pelas 16,55 travessia que durou até às 18,30) acampando seguidamente, próximo desse rio e do Lolo de que é afluente. Em 16 a coluna atingiu o morro do Lolo às 8,35, sendo feito o reconhecimento para a instalação daquele posto e adoptadas todas as medidas e dadas as instruções necessárias para esse fim, recomeçando a marcha às 13 e passando-se o rio Lolo e a mata do mesmo nome, sendo encontradas nesta última quatro trincheiras, das quais uma tinha um perfil idêntico ao regulamentar japonês, substituídos os degraus de talude por pequenas escavações suficientes para ali apoiar um pé, para sair facilmente da trincheira; as restantes tinham massa cobridora com bermas bastante largas, a profundidade de 1,5 e escavações em ambos os taludes, estando portanto admiravelmente concebidas para o fogo de arma de auto carga; em 17 toda a marcha foi feita a corta mato, a meia encosta de um terreno com grandes inclinações e extramente escorregadios e que deu lugar a uma imensa fadiga. Em 18, logo à saída do acampamento, foi a guarda avançada atacada pelo gentio do Soko, região que íamos atravessando, travando-se um combate que durou até às 12,30, em terreno bastante movimentado e cheio de matas densas. Foi digna de nota o fogo executado pelos auxiliares que foram intercalados com os carregadores, expediente a que foi preciso recorrer para proteger carregadores. Tendo saído da região do Soko terminou o combate, pelo que a coluna fez alto para tomar a refeição fria, depois da qual foi atacado, pelos pelotões Rosa e Borges, o povo de Volunga.

Tinham-se consumido já 2538 cartuchos 11 mm, 15 granadas com balas, 2 ordinárias e 2 lanternetas e por isso, tendo em atenção a escassez de munições, foi resolvido tornear-se a mata Valunga, o que se fez passando ao sul dela, indo a coluna acampar às 18,10 já próximo da extensa planície que orla a margem do Luvo. No dia 19 a coluna atingiu, no fim de 1,20 de marcha a fronteira e ali acampou muito próximo do pequeno morro onde foi estabelecido o posto do Luvo.

Palas 15 horas desse dia marchou para Sangalolo o chefe dos serviços administrativos da coluna a fim de proceder ao imediato reabastecimento da coluna e de telefonar para Matadi a fim de obter carruagens para transporte de doentes e feridos com gravidade, que no dia 21 deviam ser evacuados para o litoral, infelizmente o número de doentes a evacuar reduziu-se a dois pela morte dos restantes no acampamento do Luvo, na noite de 20/21.

Em 20 parti para Songololo, percorrendo, com outros oficiais que me acompanharam os vinte e três quilómetros que separam a fronteira daquela estação de caminho-de-ferro em 3,40. Ali providenciei quanto ao reabastecimento da coluna pelo que os géneros em depósito em Sangalolo, tinham, por efeito desencontro de correspondência e porventura de algum mal-entendido, sido transportadas para Tumba com destino à Damba…”

…”Em 21 parti para Matadi, onde embarquei imediatamente na canhoeira Save que ao anoitecer fundeava em Noqui, sabendo nesta localidade que ali deveria chegar no dia seguinte a Salvador Correia conduzindo a 23.ª Companhia, que, de facto encontrei em 22 no rio Zaire, tendo como missão principal naquele momento, fornecer uma escolta ao delegado do Ex.º Ministro das Colónias que seguia para S. Salvador, onde aliás não chegaria com tal escolta, tanto mais que ia municiada apenas com 100 cartuchos.

Em Noqui tinha deixado instruções para a acção da 23.ª Comp.ª enquanto durasse a minha ausência em Luanda, onde ia tratar da organização da coluna, a constituir com as 23.ª e 24.ª companhias, que deveria proceder à ocupação da região de Noqui e estabelecimento da comunicação Noqui—S. Salvador, e, bem assim, dirigir umas operações a efectuar na área da capitania do Zaire. Estas últimas operações não poderam ser executadas por falta de fornecimento do indispensável transporte fluvial; de forma por que foram executadas as instruções que deixei ao comandante da extinta 23.ª já informei em relatório especial que deu lugar a procedimento disciplinar.

Em Luanda fui informado pelo Encarregado do Governo-geral da próxima chegada à província de três companhias de Moçambique e da possível de ser uma delas empregada em operações no Congo; pouco depois, porém, estalava a guerra na Europa e surgia a necessidade e conservar no litoral as companhias que viriam de Moçambique, finalmente, a circunstância de os fornecedores de géneros alimentícios não poderem ou não querem satisfazer por completo as requisições necessárias à subsistência das forças em operações, levavam a encerrar as operações activas no Congo e a procurar alimentá-las quanto possível à custa do território o que é manifestamente impossível em deslocações de grande envergadura. A falta de recursos era tão grande que tendo requisitado cerca de 30 toneladas de géneros para enviar para as forças em operações pelo vapor Vilhena que de Luanda partiria em 7 de Agosto, só poderam ser realmente remetidas cerca de 8 toneladas.

Para as operações de Noqui o abastecimento de postos careceria ainda de cerca de 43 toneladas de víveres que não cheguei a requisitar por saber que não eram fornecidas.

Entretanto acoluna, sob o comando do Governador, depois de ter atacado e destruído o Uéne, cujo soba pretendeu apresentar-se não o fazendo por ser ameaçado por dois catequistas da missão B. M. S. o que me consta de auto declarações que foi oportunamente levantado, de que o seu povo seria atacado e destruído pelos rebeldes se tal fizesse, a coluna, repito, pôs-se em marcha em 31 de Julho, pelas 9 horas e dirigiu-se a S. Salvador pelo caminho de Zulumenge que era preciso castigar pois que fazendo causa comum com os rebeldes ainda nada havia sofrido. Em 1 a coluna penetrava na mata junto da orla oeste da mata, depois de ter destruído os cinco povos que ali existiam, o inimigo, com quem os pelotões Rosas e Lemos tiveram um pequeno combate, de que resultaram três baixas por ferimentos, dos quais um com gravidade. O inimigo fugiu sabendo-se mais tarde que tivera cinco mortos, dos quais o soba.

A coluna acampou nesse dia à vista do posto do LOLO onde chegou no dia imediato às 9,35 depois de 50 minutos de marcha e dali partiu reforçada com parte da guarnição do Lolo, sob o comando do tenente Magalhães, comandante daquele posto, para se dirigir ao Lukela onde tudo levava a crer que o inimigo se encontraria e seria aniquilado pelas disposições que o Governado ordenara para lhe cortar a retirada em absoluto, infelizmente, os rebeldes que tinham pensado dar combate ali, como se prova pelas obras de fortificação que foram encontradas, dispostas, como por forma a bater a coluna de frente e flanco, resolvera desistir do combate não sendo encontrados vestígios alguns da sua presença nos últimos dias. Em vista disto, a coluna continuou a sua marcha para S. salvador e o pelotão Magalhães regressou ao posto do Lolo. Pelo Ex.º Governador foi notada a forma inteligente e brilhante como o tenente Magalhães executou as instruções que lhe foram dadas, não só em relação à construção do posto que foi encontrar quase concluído e em condições que são para admirar dada a falta de recursos, como na parte respeitante aos trabalhos exteriores a que o posto, no rasgamento de uma larga avenida através da mata do Lolo que perdeu inteiramente o seu valor para os ardis do gentio a construção da ponte sobre o rio, como ainda na sua acção para com o gentio que tinha atacado dentro do raio de acção, tendo-lhe destruído mais de 100 cubatas, dispersas em vários povos. É de notar que todo este trabalho tinha sido feito em 16 dias. Não houve mais incidentes na marcha para S. Salvador, onde a coluna chegou em 3 de Agosto, às 16 horas, tendo feito o percurso de 67 quilómetros, menos dois que na marcha para a fronteira…”   

…” Chegado a S. Salvador, com se fosse necessário acudir à alimentação dos auxiliares e carregadores, aproveitando a oportunidade de simultaneamente castigar os povos a sueste de banza Puto, determinou o Governador que no dia 7 de Agosto para ali marchasse um destacamento composto de dois pelotões de infantaria (Matos e Almeida) devendo destruir todas as lavras que fossem encontradas desde Banza Puto até Quindinga; este destacamento deveria recolher a S. Salvador em 10 de Agosto. Ao comandante da força foi recomendado pelos números 6 e 7 da ordem de serviço n.º 25, que não prejudicasse a marcha dos revoltosos que tinham sido convidados a apresentar-se, pelo edital do dia 5, ao Exº Chefe de gabinete de S. Ex.ª o ministro das Colónias e que fizesse apregoar o mesmo edital em todos os acampamentos. De prevenção ficavam 3 pelotões de infantaria e a secção de artilharia.

A força seguiu ao seu destino, sendo hostilizada no povo do Muinge pelo gentio rebelde, que foi repelido, não sem que o tenente Almeida tivesse ficado ligeiramente ferido na face, causando também quatro baixas por ferimento em soldados indígenas da 18ª Companhia. Tendo o Exº. Delegado de S. Exª o Ministro das Colonias ponderado que o serviço cometido àquele destacamento, poderia prejudicar o inquérito, mandou o Governador que uma secção sob o comando de um sargento fosse imediatamente a S. Salvador no dia 8 de Agosto, só então tendo o mesmo Snr. conhecimento do combate travado e dos seus resultados.

Como a atitude do gentio necessitasse de uma rápida repressão, determinou o Governador, de acordo com delegado do Ministro, que para ali marchassem de novo tropas, sendo desta vez o destacamento constituído por três pelotões de infantaria e a secção de artilharia, acompanhado por todos os auxiliares e carregadores, sob o comando do capitão Martinho Monteiro. Este destacamento para ali partiu às 4 horas da madrugada de 10 de Agosto, regressando a 12, depois de integralmente cumpridas as instruções que lhe haviam sido dadas, como pormenorizadamente se pode ver no relatório especial desta operação.

Em 18 foi publicada a ordem de serviço nº (?) com a constituição da coluna que deveria marchar sobre a Canda, acompanhada até o rio Luvo, no ponto em que este corta o caminho de Maquela, pelo 1º pelotão da 20.ª companhia indígena; as notícias recebidas de Madimba obrigaram o Governador a resolver que, primeiro que tudo, se iria ali montar um posto e bater, uma vez mais, a banza do chefe da rebelião. Para a guarnição deste posto foi designado um pelotão da 20.ª companhia e a peça d 8 c.

No dia 19 foi recebida a nota 83 GB do chefe de estado-maior das forças em operações; em face das instruções recebidas resolveu o Governador não efectuar na íntegra a marcha sobre a região Zombo, mas não desistiu de marchar sobre a Madimba, onde era necessária uma intervenção enérgica da força. Como para reabastecimento da coluna precisasse ter garantidas as comunicações com Maquela, região que pode abundantemente fornecer gado e géneros para indígenas, foi determinado que a força disponível, presente em S. Salvador para ali seguisse sob o comando do capitão Monteiro, devendo manter os postos de Tanda e Cuimba com guarnições suficientes para constituírem pequenas colunas moveis. Também a cargo da força do capitão Monteiro ficou o transporte para S. Salvador, dos géneros acumulados em Quibocolo, na previsão das operações na Canda.

Recebeu o Governador do distrito as minhas comunicações sobre a nova situação que se nos apresentava em face da guerra europeia que tão inoportunamente vinha exercer a sua acção nas operações do Congo. Era todavia indispensável voltar ao povo do Buta para mostrar a este e seus adeptos que o governo disponha de meios precisos para ir ataca-lo no seu baluarte. Por isso determinou o Governador para a marcha para ali em 22 de Agosto.

Realmente em 22 de Agosto, tendo partido com alguma antecedência os pelotões que haviam de constituir a guarda avançada  apenas para desembaraçar caminho o de uma avançadas inimigas que constava estarem em KIMALO, a cerca de 10 Kms, de forma a  não demorarem a marcha da coluna, partiu esta às 7,55 e, às 11,30 chegava à mata de Kimalo, onde a guarda avançada nenhuma resistência encontrara, seguindo dali para as margens do Coco que foi atravessado mesmo junto da sua confluência com o Ginga-Coco, às 12,55, dando-se então um grande alto até às 14,15. Recomeçada a marcha a coluna passou a mata de Kimpango às 15,50 e atingiu o caminho da Quindinga às 16,20, passando depois por quitanda Kengue onde foram surpreendidas umas sentinelas inimigas pelos auxiliares, fugindo aquelas pelos caminhos da quitanda para o oeste; a coluna acampou nas margens do COCO às 17 horas, encontrando-se o gentio na mata que orla um seu pequeno afluente, sendo ali feito dois tiros de artilharia, avançando seguidamente o pelotão do tenente Amaral Fernandes, que já não encontrou o gentio mas que observou vestígios da sua estada muito recente….”

…” No dia 23 como tivesse sido avistado o gentio na mata do rio Coco, para ali foram feitos 3 tiros de artilharia, sendo seguidamente atravessada a mata sem incidentes; às 11,10 na mata do Senguene, foi incumbido o tenente Amaral de fazer um ataque fixante na direcção do caminho, entretendo com espaçadas descargas a atenção do inimigo, enquanto a secção de artilharia marchava apressadamente para uma colina que domina toda a mata e o pelotão Rosas torneava esta por oeste a fim de cortar a retirada ao gentio, sendo estes movimentos feitos perfeitamente a coberto das ondulações do terreno; e o pelotão Oliveira estava em situação de cortar a retirada para leste caso o inimigo por ali a tentasse e, protegido pelo pelotão Matos o comboio preparava-se para atravessar o rio a leste da mata. Subitamente a artilharia rompeu o fogo que foi certeiro e desmoralizador, enchendo de pânico os rebeldes que se puseram em fuga desordenada, não lhes sendo realmente cortada a retirada porque as granadas rebentavam muito perto da posição em que se encontrava na ocasião do primeiro tiro, o pelotão Rosas que, em face disso não pôde continuar a avançar. Continuada a marcha foram avistados às 17 alguns rebeldes no morro da Funkila que disparam sobre a guarda avançada, sendo perseguidos com muita energia pelo tenente Amaral, com uma secção.

No dia 24 foi executada uma pequena marcha, no decurso da qual foi incendiado pelo pelotão Lamelas um povo grande que se avistava a oeste do caminho. A coluna acampou nesse dia pelas 10,40 no alto do morro de Lukenge, sendo o resto do dia empregado no reconhecimento e estudo do terreno para o combate do dia imediato, em que tudo indicava que Buta reuniria todos os seus meios de luta, como de facto fez. À tarde foi distribuída a  todos os oficiais a ordem de combate (Doc. Nº. 12) O combate iniciado às 9,20 terminou às 14,00 pelo assalto a Batutútu, o povo de Buta, em que foram encontradas algumas casas seteiradas, tendo o povo nessa ocasião muito maior numero de cubatas que quando fora destruído da primeira vez. O relatório deste combate não se resume e por isso nos limitamos a indicar a sua leitura; aqui limito-me a dizer que os rebeldes foram asperamente castigados e que é para lamentar que movimento envolvente tivesse falhado em ambas as alas.

Era tal a confiança que o gentio tinha nas suas forças e nos seus ardis e emboscadas que organizara cuidadosamente que conservava no povo toda a criação que, como é sabido, oculta sempre que tem receio que lhes vai aplicar o castigo que reconhecem ter merecido. Nesse combate os bisonhos soldados de Angola, portaram-se como se portarão sempre que deles se faça soldados; estes fizeram-se em campanha e não é para estranhar que no começo das operações nenhuma confiança inspiravam; em vez de exercícios de táctica, que nunca tiveram, a sua instrução foi feita com o inimigo real, o mais real que é possível. Quando foram ao povo do Buta, pela segunda vez, tinham já a consciência do valor do seu fogo, já não desperdiçavam munições e obedeciam prontamente às vozes e aos sinais do comando; seu fogo foi certeiro, disciplinado e eficaz; a sua atitude foi esplêndida porque já conheciam os seus oficiais, os quadros de graduados, porque já eram enfim, soldados. É justo que se consagre aqui a atitude e o valor desses soldados, tão desacreditados por aqueles, especialmente, os que não tentam um único esforço para fazer deles os soldados que depois desejariam encontrar, nos momentos em que como soldados são necessários; e tenho tanto mais prazer em registar aqui as palavras, quanto é certo que na coluna se encontravam vários oficiais que serviram em Moçambique, em serviço de campanha, e que já no combate de Lunguegue me diziam que eram bons soldados aqueles que desde Fevereiro andavam recebendo em combates a sério, a instrução que deveriam ter recebido em tempo normal.

No morro de Lukenga, dominando perfeitamente a mata de Buta e garantindo a sua posse ficou instado um posto, cujo comando foi confiado ao tenente Amaral Fernandes que revelou bastantes qualidades para ficar à testa dum posto de tal importância, posto este que está integrado na rede geral de postos volantes necessários à ocupação eficaz do distrito.

No dia 2 pôs-se a coluna em marcha para S. Salvador, atravessando sem incidente os riachos de  Maza Mapombe e Senguene e chegado ao rio Coco às 15,15 onde a guarda avançada foi recebida por uma descarga do gentio ali emboscado; transcrevo do relatório desta operação o que ali se passou: “ Imediatamente o pelotão do tenente Matos que marchava na guarda avançada estendeu em atiradores sobre a direita e começou batendo a mata de montante para jusante do rio; o pelotão do alferes Lamelas com o grupo de ordenanças desenvolveu em atiradores sobre a esquerda e bateu o inimigo em sentido contrário; as duas peças colocaram-se com uma rapidez extraordinária em dois montículos que ficavam à direita e à esquerda do caminho e lançaram sobre a mata umas 4 ou 5 lanternetas; o pelotão do tenente Oliveira, comigo, avançou rapidamente sobre o rio que atravessou em poucos minutos, ocupando a margem oposta. Era tal o entusiasmo das praças indígenas que rapidamente se lançaram sobre a mata sendo difícil segurá-los. Enfim tão rapidamente tudo se passou que às 13,50 acampamos no alto fronteiro, donde se domina a mata, a fim de alcançarmos.” …

…” No dia 27 às 11,35, depois de 4 horas de marcha, a coluna entrava em S. Salvador, com a convicção de ter dado, quando menos, um profundo golpe no prestigio do Buta e ter lançado as bases do aniquilamento desse poderio e, portanto, da pacificação da região que as circunstâncias alheias às operações em si, apesar da constante falta de recursos, não permitiram levar ao fim mais rápida e completamente. Na área de S. Salvador, os rebeldes estão virtualmente dominados; não se apresentaram ainda, é certo, mas temos comunicações garantidas, estamos em condições de não permitir um momento de sossego aos rebeldes, ocupamos realmente a região; o resto não deverá demorar, ou eu me engano muito.

No relatório das operações de 22 a 27 de Agosto destaca o Governador os tenentes Peixoto, R. de Almeida, Filipe, Matos e Amaral o alferes Lamelas e os sargentos Isidoro e Candeias de artilharia e Alberto Exposto, José Maria, Guerreiro, Soares e Oliveira, e finalmente o cabo indígena 125/402 da 2.ª Companhia, Pena e ainda o soldado…. (ilegível), entre muitos outros que foram de uma dedicação e valentia digna de louvor.

As operações activas iam terminar; era preciso ainda garantir a ocupação da zona Maquela – S. Salvador e preparar a ocupação da Canda, região densamente povoada, cheia, a regurgitar, de armamento; para isso foram dadas instruções ao capitão-mor de S. Salvador a quem foi incumbida a instalação dos postos do Tanda e Cuimba, missão que levou já a cabo, tendo encontrado pouca resistência na sua marcha, efeito da acção desmoralizadora que sobre os rebeldes exerceu a derrota de Buta.

O Governador veio para Noqui e ali nos reunimos em 4 de Setembro preparando as instruções para a montagem de um posto em Quincanda, na região de Noqui, e a posse da linha de comunicações Noqui-S. Salvador de que carecemos inteiramente para o transporte de tropas e material de guerra para o interior do distrito, sem o constante e abusivo recurso ao Congo Belga. De resto, o estabelecimento do posto do Luso, um dos dois que há aumentar para conseguir este resultado, deverá dar-nos, se for bem comandado, a submissão da Malanda, região que desconhecemos ainda.

Não vale a pena alargar-me em considerações que justifiquem um plano de operações a efectuar para a ocupação das regiões do Pombo e Sosso. E isto pelas razões seguintes: Em primeiro lugar é de boa doutrina, especialmente em campanhas coloniais, que o plano de operações seja elaborado por quem deva levar a cabo as mesmas operações, sem a definição de responsabilidades resultaria muito difícil;

Em segundo lugar é profunda a minha convicção de que o distrito do Congo não disporá, no próximo ano, de recursos necessários para tentar aquela ocupação;

Em terceiro lugar considero tais operações como extemporâneas, enquanto a das regiões a oeste daquelas não seja um facto palpável; tanto mais que, apesar de tudo, as nossas armas não sofreram ali um desastre que seja necessário vingar;

Finalmente, em quarto lugar, porque a tentar-se essa ocupação com os recursos actuais, teríamos que desguarnecer quanto fica a oeste dessas regiões e teríamos, dentro de muito pouco tempo, de sufocar uma revolta talvez bem mais grave que a de 1913-14 e, se é possível, com maior generalidade ainda que aquela.

Assim, pois, limitar-me-ei a dizer, como expus verbalmente ao Chefe da 5.ª repartição do Ministério das Colónias, a tentar, nas condições actuais a ocupação do Pombo e Sosso, se deve efectuar a invasão daquelas regiões partindo do distrito da Lunda, tomando como base de operações, no inicio destas, os postos de Matanga e Canhangué estabelecendo previamente a policia dos rios Cuali e Cughe, para impedir que os jingas da Lunda vão reunir-se, o que aliás é provável, aos pombos e sossos, constituindo depósitos nos postos de Lutengo, Cuilo e Cuango, onde as forças em operações se reabastecem e à custa dos quais se abasteçam os postos a montar, na ocasião da sua instalação.

Há que ter em atenção que a Jinga se encontra desguarnecida mas que é improvável que os indígenas dali pretendam passar para o norte do Cughe e Cuali, porque têm largos interesses ligados à terra que habitam e cultivam em grande escala. O jinga tem-se mostrado sempre dócil às ordens da autoridade quando vê que esta dispõe da força precisa para coagir ao cumprimento dessas ordens; logo, porem, que a guarnição é desfalcada, como sucedeu e sucede em consequência da ocupação do Cassange, o jinga, quando não vai mais longe, deixa de fazer caso da autoridade”….

…” Invadindo o Pombo pela Damba-Lutongo, é de contar com a migração, em massa, dos pombos para a Jinga e nestas circunstâncias a situação militar desta parte do distrito da Lunda, tornar-se-ia extramente grave.

A invasão pela Jinga oferece ainda as vantagens de: – Surpreender o território a invadir, que só espera o ataque vindo do litoral precisamente pela linha Damba – Lutongo; Utilizar uma linha de comunicação mais curta, todo o território nacional e que se torna absolutamente segura pela simples passagem de forças importantes através de Jinga; – Permitir a subjugação simultânea das zonas fronteiriças do distrito do Congo e Lunda, onde nunca se efectuou uma demonstração de força; – Aproveitar os abundantes recursos locais da Jinga para a prévia constituição dos depósitos de Matanga e Canhangué e ainda as de Cuango e Cuilo, desde que no rio Cuango seja empregada uma lancha que é ali indispensável para a polícia da fronteira;–Facultar a oportunidade para coordenar a ocupação do limite sul do Congo com a do limite norte da Lunda; — Utilizar os recursos de viação da Lunda até a orla da região a invadir, reduzindo assim ao mínimo o recurso a carregadores, que constituem o meio de transporte que mais graves inconvenientes apresenta e que não é utilizável quando linhas de comunicação apresentam um grande desenvolvimento, pois que é preciso atender a que o carregador consome da própria carga que transporta, de forma que o abastecimento se torna prática e teoricamente impossível a partir de extensões bastante reduzidas das linhas de comunicação.

Todos os transportes a efectuar para a constituição do depósito nos postos já indicados, deverão ser efectuados antecipadamente, de maneira a poder utilizar todos os escassos recursos que seja possível reunir, na zona de operações e não na zona da rectaguarda. A ocupação prévia dos cursos navegáveis do Cuali e Cughe é da maior importância para impedir que os povos da zona invadida passem para o sul; a do rio Cuango tem ainda maior importância, porque sem ela é de recear que os mesmos povos emigrem para o território do Congo Belga e a desocupação do território a invadir, representa a sua desvalorização absoluta; a conservação dos efectivos actualmente atribuídos à linha Maquela-Quibocolo-Damba e daqui para sul (ainda por ocupar) senão o seu reforço, é indispensável para impedir que esses povos de recente e deficiente ocupação se sublevem, aliando-se aos da região invadida.

Ao exposto se limita o que entendo dever dizer acerca da ocupação do Pombo e do Sosso. Apenas acrescentarei que tudo leva a crer que uma política inteligente e bem orientada possa conseguir uma ocupação pacífica do Sosso, com a condição, porém, de não fazer exigências de pagamento de imposto de cubata que não possam tornar-se prontamente efectivas pela intervenção da força…”

Plano de ocupação

Distribuem-se as forças para que garantam uma ocupação efectiva do território, que constantemente percorrerão, e ainda para que seja sempre possível concentrar rapidamente um efectivo avultado para subjugar prontamente qualquer começo de revolta, e impedindo que estas alastrem e tomem incremento;  — Ligam-se entre si as diferentes guarnições por forma a que a sua acção seja coordenada e essa ligação far-se-á, de começo, por contactos e prazos marcados entre as forças moveis e, mais tarde, também recorrendo ao emprego da telegrafia, telefonia e columbofilia.

A distribuição em que de momento assentou o Governador do distrito, obedecendo as estas bases não realiza completamente a ocupação efectiva de todo o território porque para isso são insuficientes as forças do distrito, dentro, porém, dos recursos actuais, obtém o máximo rendimento que é possível tirar de forças bastante reduzidas. A distribuição é a seguinte:

1.ª Companhia – Postos do Lutengo – Sosso – Camatambo – M’pete –  Damba – Cuilo

N.º Praças                                 50             30              30                  20             80         10

Posto do Sul — 26

Os postos de Camatambo, M’pete e Sul estão ainda por instalar; os dois últimos destinam-se a garantir a ocupação do limite Sul do distrito e a segurança dessa comunicação; a instalação do primeiro corresponde a uma necessidade militar e económica.

2.ª Comp.-:Postos: Cuango 40 / Camatambo 10 / Tanda 30 / Cuimba 70 / Maquela 66 / Cuilo 30 O posto do Cuilo A. Deve ser montado sobre o rio CUILO, bastante a montante do actual…”

Nos postos que se atribui uma guarnição que à primeira vista parece muito elevada, considera-se essa guarnição como dividida em duas partes: uma constitui a guarnição de defesa; a outra tem ali o seu quartel permanente, mas a sua missão é de percorrer constantemente em todos os sentidos o território da área do posto e a estabelecer periodicamente o contacto com as forças da áreas vizinhas, por forma a que nestas a acção da força seja coordenada e não desconexa; sempre que o gentio não venha ao contacto com a autoridade é esta que vai ao contacto com ele, mas vai em condições de não ser desacatado e de impor, o cumprimento das ordens que der; sempre que um soba incorra em desobediência ou em desacato ao agentes da autoridade do posto, o comandante deste dispõe imediatamente dos meios necessários para punir o desacato, para reprimir a desobediência…”

…” É evidente que se aceitamos esta dispersão de forças é porque ela nos é imposta: que saibamos, primeiro que ninguém imperámos a extrema dispersão de forças em Angola e indicamos como único meio eficaz de ocupação rela do território da província, a acção de colunas móveis com a função que deixámos indicada…” 
Nota do pesquisador: Estes episódios são transcritos do acervo do Arquivo Hospital Militarde Lisboa – muito deles manuscritos, pelo que pedimos antecipadas desculpas por alguns erros de nomes e localidades neles descritos.

“ O Congo registaria em 1913 uma revolta prolongada e quase geral na maior parte das zonas do distrito que estavam realmente ocupadas. Mas ela é talvez de todas as revoltas que marcaram o princípio do século XX angolano, a que está menos estudada. Embora sabendo aproximadamente como ela começou, o seu decurso escapa-nos em parte: e o seu desfecho é ainda misterioso: Nunca lamentaremos tanto a actual impossibilidade de consultar todos os arquivos indispensáveis – consulta que nos permitiria conhecer mais satisfatoriamente esse grande movimento de oposição que não teve equivalente em Angola até 1961…

… Em data não especificada, Buta e os demais prisioneiros foram conduzidos sob prisão para Luanda. Buta morreu no hospital em 1915, vitimado pela epidemia de gripe que devastou a cidade, e os presos sobreviventes, entre os quais Simon Keke, foram enviados para o Sul de Angola… “ No verão de 1915, abateu-se a repressão sobre as sanzalas. Os jovens eram alistados à força como carregadores ou, com menor frequência como soldados…” Assim iriam extinguir-se nas terras arenosas dos Ovambos os últimos tições da revolta de 1915…”

 

Pesquisado por Artur Méndes

 

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