Adeus KANANITO!

Por Miguel Kiame

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Partiu bruscamente, sem um aceno, pelo menos!

Kananito Alexandre conheci-o na longínqua década de setenta do século passado quando acabara de regressar da RDC, país onde se exilara com os seus Pais. Na época, não precisou de muito tempo para se impor e seduzir com a leveza e simplicidade dos seus dribles aos aficionados do futebol. Filiou-se no FCU mas o fulgor da aura tecnicista que o envolvia no futebol fazia dele um artista da bola adorado e aplaudido até pela nata mais ferrenha e adversária das terras do bago vermelho. Todos rendiam-se à evidência do seu incontestável talento. Serafim, de seu nome, ele foi também o serafim de todos os amantes da bola. Foi também o mesmo serafim que aglutinou a Juventude no Uíge, numa altura em que os jovens oriundos especialmente da Damba / Maquela do Zombo eram, por defeito, conotados de adversos ao regime. Foi durante o seu consulado como Primeiro Secretário da Jota do Uíge que ele quebrou esse mito, provando justamente o contrário. E por que os seus feitos deixaram pasmados de fascinação os detentores do poder político do país, Serafim Kananito Alexandre (SKA), tornou-se o serafim da província que o viu nascer, na condição de Governador da Província.

Contudo, o quadro de habilidades da personalidade de SKA não se quedou por aí, vale dizer, no campo político. Era detentor de uma enorme veia artística que alimentou verdadeiros pânicos de alegria incontida. Exímio compositor, destacou-se na subtileza rítmica e harmónica das suas melodias nas quais selou vigorosamente a sua inconfundível marca. As suas letras, todas em língua Kikongo, são composições poéticas muito expressivas, geralmente picantes e com uma suavidade satírica de mestre.

Infelizmente, vivi, por muito pouco tempo, a prodigiosa experiência do contacto directo com SKA mas as poucas tertúlias que desenvolvemos foram muito substantivas. Como que a adivinhar o caracter meteórico das mesmas, num dos derradeiros encontros que inchou os nossos corações de júbilo, ele questionou-se: porque não te conheci há mais tempo?

Foi graças ao meu Sogro, o Regedor Katuzeko, também de feliz memória, que tive o privilégio de partilhar momentos inesquecíveis em que ele abriu parte substancial do livro da sua vida, especialmente a sua produção artística. Refira-se que SKA era amigo de peito do Regedor Katuzeko, cuja amizade fê-lo deslocar de Luanda até a aldeia Kaboko, para render a sua derradeira homenagem ao amigo.

Recordo-me, pois, do abraço prolongado carregado de profunda dor e consternação que com ele troquei e cuja saudade o tempo se encarregará de transportar para o infinito.

Recordo-me, pois, dos seus olhos reluzentes e húmidos. Ainda o revejo sentado e cabisbaixo no grande pátio do Regedor embrulhado no manto da sua dor e sofrimento. Não era necessário fazer um grande esforço para ler nos seus olhos os pontos do seu coração que transbordavam de amargura. Este foi o HOMEM que conheci e a única coisa que guardo da sua memória foi a existência de um léxico de amizade, simplicidade e dedicação aos outros como norma suprema de moralidade.
SKA, meu Kamba, descanse eternamente em PAZ!

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