São insuficientes os adjetivos para caracterizar o III Seminário Internacional de Comunidades Tradicionais Bantu, realizado nos dias 12 e 13 de outubro no Nzo Tumbansi, localizado na Rodovia Armando Salles, Recreio Campestre em Itapecerica da Serra, região metropolitana de São Paulo.
Isso devido a riqueza das discussões levantadas durante todo o seminário, devido a toda articulação político-ativista dos Povos Tradicionais de matriz africana, os questionamentos e, sobretudo, devido ao estreitamento com iniciativas de instituições africanas responsáveis pela conservação, resgate e difusão dos valores tecnológicos, estéticos e culturais das comunidades africanas dos países de matriz cultural e linguística bantu.
Nesse sentido, para além da discussão situada apenas nas demandas especificas do Povos Tradicionais de Terreiro no contexto brasileiro, o evento também se insere em um amplo espectro discursivo cuja a identidade é a luta pan-africanista contra as consequências da colonização sobre os povos africanos e afrodiaspóricas.
Como resultado prático da articulação pan-africanista em decorrência do evento, vale citar o acordo celebrado entre o Ilabantu e o CICIBA (Centro Internacional de Civilizações Bantu), organismo intergovernamental integrado por 11 países da África Central, com sede em Libreville, na República do Gabão. No acordo o diretor geral da Instituição, professor doutor Antoine Manda Tchebwa, nomeou como representante do CICIBA no Brasil, América Latina e Caribe, Walmir Damasceno (Tata Katuvanjesi), coordenador geral do Ilabantu. O acordo visa a cooperação técnica, científica e cultural.
A importância do evento também mobilizou iniciativas de pessoas jurídicas de âmbito privado, tal como a Fundação Sindika Dokolo, sediada em Luanda, República de Angola, cuja missão é o resgate, conservação e difusão do patrimônio estético africano, o qual é reposicionado como arte clássica africana, fugindo assim dos estereótipos que se lançavam sobre a produção artística africana enxergada sempre como produção exótica e pitoresca. Em mensagem de vídeo, o mais cortejado colecionador de arte africana contemporânea, Sindika Dokolo, saudou os participantes do evento justificando que por motivos de saúde não lhe permitiu comparecer no III Seminário Internacional de Comunidades Tradicionais Bantu, garantindo que em breve cumprirá a agenda que se comprometeu para uma visita ao ILABANTU.
Na ocasião, a diretora executiva da fundação, a arquiteta angolana Maria Silva de Oliveira e Silva deixou aberta a possibilidade da fundação estabelecer junto ao Ilabantu a realização do projeto que constitui no ensino das línguas tradicionais e aspectos culturais do reino do Congo para a população Afrodiapórica brasileira.
No plano das articulações nacionais, o Ilabantu estabeleceu importante parceria com a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), que consiste na abertura de curso de extensão referente, o qual será ministrado por mestres dos saberes tradicionais das culturas africanas e afro-brasileiras no âmbito das manifestação de acordo com suas práticas e vivências no Brasil.
Devido aos diálogos com o poder público do Estado de São Paulo, o Ilabantu, através de seu Representante, irá integrar o Conselho de Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africanas, a ser criado no âmbito da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo.
A comunidade de matriz africana se mobilizou expressivamente para marcarem presença em uma inegável manifestação de força e de capacidade de organização e reação contra os retrocessos que ameaçam a existência das práticas simbólicas e materiais dos povos tradicionais, devido à crescente manifestação de violência desempenhada pelos setores mais reacionários da sociedade brasileira.
Dentre as participações destaques para presenças de Tata Munguaxi, patriarca do centenário Terreiro do Bate Folha de Salvador, que honrou com sua participação contributiva no III Seminário de Comunidades Tradicionais Bantu: Apresentou Documentário em vídeo dos 100 anos do Terreiro do Bate Folha.
Tata Zingê Lumbondo (Esmeraldo Emetério Santana Filho), presidente da Associação Beneficente de Manutenção e Defesa do Terreiro Tumba Junsara, representou a raíz Tumba Junsara; Tata Mungangaiami (Michel Soares), de Curitiba/PR; Tata Unyanganga (Eduardo Bittar), Itabuna; Tata Ananguê, da Casa Raíz do Benguê Djanga Ngola Ria Matamba – Nova Iguaçú; Tata Kilondiri e Tata Kiluanji(Maricá); e Kota Kiamunsonji (Geralda Nascimento), de Xerém, Duque de Caxias, representou os povos e comunidades tradicionais de matriz africana do Rio de Janeiro; Mam`etu Luangoiasi (Anajete Coelho Pinto), Cariacica (ES); Mam`etu Ndenge e advogada Laureana Mikauzele; Makota Natália Gondim, representando o tradicional Terreiro de Candomblé de Santa Bárbara, da saudosa Manaundê, Vila Brasilândia, na capital Paulista, Nengwa Nkisi Yakunan (Janaina de Samba Kalunga), e Tata Oni e demais membros da Nzo Jindanji Lunda-Kiôko, Belo Horizonte/MG.
Além das autoridades institucionais a exemplo da Secretaria de Igualdade Racial do Governo do Estado da Bahia, cientista social Fabya Reis, que foi homenageada, assim como o Governador Rui Costa. Em sua fala, a gestora afirmou que a homenagem reforça os compromissos do governo baiano pela promoção da igualdade racial, combate ao racismo e à intolerância religiosa. “Nossa missão é articular e executar políticas de valorização dos povos e comunidades tradicionais, construindo caminhos e ações para a reparação ao povo negro e às religiões de matriz africana.
Continuaremos trabalhando pelas conquistas e visibilidade dos povos Bantu, segmento que segue firme na resistência e preservação das tradições”, ressaltou Fabya Reis. No mesmo evento ela participou de mesa temática sobre a conjuntura das políticas de promoção da igualdade racial no Brasil.
O dirigente do Ilabantu, Tata Katuvanjesi (Walmir Damasceno), disse que o encontro pode ser compreendido como uma oportunidade de trocas de experiências entre os povos da África e da diáspora. “O povo Bantu contribuiu significativamente com a formação do Brasil e construção da sociedade, o que percebemos na língua, nas manifestações culturais, dentre outras expressões”, enfatizou Damasceno, ao lado de outros representes de países africanos, como o cônsul-geral de Angola em São Paulo, Joaquim Augusto Belo Mangueira; a representante do Ilabantu para Angola e África central, Judith Luacute, que apresentou um rico trabalho de pesquisa sobre o Quilombo do Cafundó, localizado na cidade de Salto de Pirapora, região de Sorocaba, no estado de São Paulo.
A participação do Secretário de Cultura do Estado de São Paulo, José Luiz Penna; vereador Toninho Véspoli, líder do Psol e Representante da Câmara Municipal de São Paulo; Secretário de Governo da Prefeitura da Itapecerica da Serra, advogado Cláudio Silvestre Júnior; Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de Itapecerica, Melissa Hee Terra do Amaral deu um sentido de força do ILABANTU, movimento de fortalecimento político institucional que surge a partir das inúmeras discussões dentro do projeto Conversa de Terreiro que nasceu no Nzo Tumbansi há quase uma década.
Presente ao Seminário, o deputado federal Vicentinho (PT-SP), sugeriu que irá apresentar na Câmara dos Deputados proposta de instituição do Dia Nacional da Tradição e Cultura Bantu. O parlamentar sugeriu que a proposta pudesse ser levada a apreciação das lideranças de povos e comunidades tradicionais de matriz africana bantu presentes ao evento, Tata Katuvanjesi fez o encaminhamento da propositura, os presentes, por unanimidade acolheram a sugestão do Tata Munguaxi, patriarca do Terreiro do Bate Folha no sentido de que a Data de 13 de outubro como Dia Nacional de Celebração da Tradição e Cultura Bantu.
A comunidade acadêmica intelectual foi representada no evento pela reitora da Universidade Federal de São Paulo, Soraya Soubhi Smaili, que acompanhada da professora doutora Raiane Patricia Severino Assumpção, Pró-Reitora de Extensão e Cultura, além de professores Deivison Nkosi, Renata Gonçalves, Patricia Cerqueira dos Santos entre outros. O Seminário, considerado um ineditismo pelos presentes, contou com a participação de inúmeras lideranças de povos e comunidades tradicionais de matriz africana, além da presença do ator Angolano Celso Roberto eternizado no Brasil por Kiluanji, por ter vivido o personagem na novela Windeck, exibida pela TV Brasil e do dançarino e coreografo Carlinhos de Jesus.
No último dia, sexta-feira (13 de outubro), foi a vez da presença do alto representante do Governo de Angola no Brasil, o embaixador Nelson Manuel Cosme, que falou aos presentes fazendo alusão a cidade de Mbanza Kongo que recentemente foi reconhecida como patrimônio da humanidade pela Unesco-ONU. Em seguida, o antropólogo Pedro Neto, membro do ILABANTU, moderou a exibição e lançamento do documentário Kaitumba: A Lavagem das Escadas da Catedral de Campinas, que retrata a trajetória de duas lideranças, Mãe Dango e Mãe Corajacy.
Ao final do seminário foram homenageadas as autoridades presentes, as quais com muita ênfase reafirmaram seus compromissos para com o destino das Comunidades Tradicionais de Terreiro. Tata Katuvanjesi deu posse as Coordenadoras do ILABANTU na Bahia e Espirito Santo, respectivamente Makota Patricia Pinheiro, de Nkosi e Mam`etu Nkisi Luangoiasi, professora Anajete Coelho Pinto.
Fonte: inzotumbansi.org
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