Apelo ao investimento de empresas francesas

Por Eugenio Guerreiro

O embaixador de Angola em França, Miguel Costa, apelou a um maior investimento de empresas francesas em sectores fora dos hidrocarbonetos, como agricultura, transportes, energia, serviços e indústria transformadora. Em entrevista ao Jornal de Angola, Miguel Costa realçou que as empresas francesas “têm hoje a oportunidade de aproveitar a diversificação económica em curso no país para alargar os seus negócios”.

As relações Angola-França ganharam nova dinâmica quer no plano político quer no da cooperação económica bilateral. Elas representam hoje um forte capital com que Angola também conta para a concretização do grande projecto de diversificação da economia nacional, tendo em conta o know-how de que a França dispõe e de uma tecnologia adaptada às nossas necessidades. O quadro geral da cooperação entre os dois países foi o tema da entrevista feita ao embaixador extraordinário e plenipotenciário de Angola em França, Miguel Costa.

Jornal de Angola – A França foi um dos primeiros países da OCDE a reconhecer a independência de Angola. O Presidente José Eduardo dos Santos efectuou uma visita oficial à França que foi considerada como sendo política e diplomaticamente excepcional. As relações entre os dois países são consideradas hoje como sendo excelentes, tanto do ponto de vista político como económico e comercial. Nesta conformidade como o Senhor Embaixador qualifica hoje a densidade política das relações bilaterais entre a França e Angola?

Miguel Costa – A nível político, as relações bilaterais entre Angola e a França baseiam-se sobretudo numa vontade política comum, que se traduz por um diálogo constante e construtivo ao mais alto nível dos dois Estados.
A França foi não só o primeiro país da OCDE a reconhecer a República de Angola, logo a seguir à proclamação da sua Independência, aos 11 de Novembro de 1975, mais precisamente aos 17 de Fevereiro de 1976, menos de uma semana depois da Organização de Unidade Africana e antes da Organização das Nações Unidas, mas há também desde esse período uma regularidade na dinâmica das relações políticas entre os dois países. Sem esquecer um outro período menos bom entre 2000 e 2010.
Lembrem-se de algumas datas importantes na história político-diplomática dos dois países, nomeadamente:
A viagem do Presidente Jacques Chirac a Angola, aos 30 de Junho de 1998, durante a qual tinha pronunciado um discurso histórico no Parlamento angolano; A viagem de Dominique de Villepin, enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros, aos 19 de Julho de 2002;
O encontro entre os Presidentes Nicolas Sarkozy e José Eduardo dos Santos em Nova Iorque, à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas, seguido de uma visita oficial do Presidente francês a Luanda, aos 23 de Maio de 2008;
E, por fim, mais recentemente a visita do ministro dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, aos 31 de Outubro de 2013, que permitiu relançar a dinâmica das relações bilaterais.
Angola não ficou atrás, pois o ministro das Relações Exteriores, Georges Rebelo Chikoti, realizou uma visita oficial à França, de 21 a 23 de Março de 2012, seguida dois anos mais tarde da recente visita oficial do Chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, de 28 a 30 de Abril de 2014.
Esse diálogo de alto nível, que é um sinal forte e um barómetro com um grande significado político e diplomático, permitiu aprofundar as relações entre os dois países sobre muitos assuntos de interesse comum, entre outros: a segurança regional e internacional (RCA, Região dos Grandes Lagos, Golfo da Guiné, Guiné-Bissau, Madagáscar, Sudão, Sahel), a problemática da ajuda ao desenvolvimento e do desenvolvimento sustentável, as questões multilaterais relacionadas com a protecção e preservação do ambiente, sem esquecer o reforço da cooperação económica e comercial bilateral.
A França é um actor preponderante na geopolítica africana, tanto a nível histórico, político, diplomático e militar, como a nível económico, comercial e cultural. Angola deseja que a França continue a envidar esforços, junto com a comunidade internacional, nomeadamente no Mali e na República Centro Africana, pois trata-se de restaurar a integridade territorial desses Estados e permitir a sua viabilidade face a um risco de desintegração anunciado.
Em Angola, a França deve desempenhar plenamente o seu papel nos programas de reconstrução que o nosso Governo lançou e aproveitar as oportunidades de negócios, no quadro da diversificação das actividades económicas em curso.

JA – Qual é a imagem que o Senhor Embaixador retém da economia angolana vista a partir de um prisma externo e como é que as empresas estrangeiras, em particular francesas, podem contribuir para a diversificação das actividades económicas preconizada pelo Executivo?

MC – É preciso, sobretudo, começar por sublinhar que Angola é hoje um país apaziguado, política e socialmente estável. Este clima geopolítico permite consolidar as conquistas da Paz, encarar o futuro com serenidade e proporcionar um ambiente favorável aos investidores nacionais e estrangeiros.
Por outro lado, Angola distingue-se por um orçamento sério, reconhecido pelo FMI, assim como por um programa de reformas ousadas que visam modernizar a administração, reformular e melhorar as políticas fiscais e fazer evoluir o quadro jurídico, para facilitar o estabelecimento de investidores nacionais e estrangeiros num clima previsível e oferecendo, ao mesmo tempo, uma maior visibilidade.
A reconstrução e a reabilitação das infra-estruturas, o desenvolvimento das telecomunicações, os investimentos a nível dos transportes, da energia e da água vão proporcionar aos actores económicos uma base de trabalho sã e competitiva.
A diversificação da actividade económica é, de facto, o objectivo estratégico do nosso Governo para reduzir a dependência em relação à indústria de extracção, nomeadamente o sector petrolífero, muito capitalista e, por conseguinte, pouco flexível no mercado do emprego. Mas a diversificação oferece igualmente novas oportunidades e os países como a França dispõem de um know-how e de uma tecnologia adaptada às nossas necessidades a nível dos transportes, da agricultura, do agro-alimentar e do sector dos serviços.

Angola é portanto um país viável, lindo, com um povo caloroso e acolhedor, com enormes potencialidades inexploradas, em particular nas áreas do turismo, da hotelaria e dos serviços.

JA – Quais são os valores e indicadores relativos à parceria económica e ao comércio entre a França e Angola em termos de fluxos de importação, exportação e de cooperação técnica? Quais são em particular os dados sobre a energia e especialmente o petróleo?

MC – Penso globalmente que as trocas económicas e comerciais entre Angola e a França hoje estão muito aquém do seu potencial. É positivo, porque significa que existe uma margem de progressão significativa.

De maneira geral, existem em Angola mais de 70 implantações francesas, se tivermos em conta as suas filiais que representam mais da metade desse número. Essas empresas empregam entre 20 e 25.000 pessoas e representam uma facturação de cerca de mil milhões de dólares.

O sector petrolífero é que chama mais a atenção. A empresa TOTAL é hoje a primeira operadora estrangeira em Angola, com uma produção de cerca de 600.000 barris por dia em 2013. As actividades da TOTAL aceleraram no início dos anos 2000, começando com o projecto Girassol, no bloco17, em 2001.

Nesse mesmo Golden Block (bloco de ouro), sucederam-se quase de três (03) em três anos os projectos Rosa, Dália, Pazflor e, por fim, o projecto Clov (cravo, lírio, orquídea e violeta). Um desempenho que fez de Angola uma vitrina de excelência operacional e tecnológica do Grupo Total em offshore profundo.

Obviamente, todos esses projectos tiveram consequências políticas, económicas, financeiras, de pesquisa, do conhecimento, do emprego, do desafio tecnológico, assim como uma política de formação de engenheiros e de quadros superiores. O fluxo de importação e de exploração registou um abrandamento significativo. Tenho sempre uma reserva em relação aos números, mas globalmente passámos de 3,2 mil milhões de dólares em 2008 para 1,5 mil milhões de dólares em 2012.

Essas flutuações explicam-se pela dinâmica das compras de hidrocarbonetos.
Em relação aos investimentos directos estrangeiros, tanto em termos de stock como em termos de fluxo, a França tem um peso considerável, com quase 7 mil milhões de dólares de stock dos IDE em 2012 e mil milhões de fluxo de IDE, no mesmo período de tempo.
Cabe realçar que as empresas francesas não estão muito envolvidas no mercado da reconstrução e da reabilitação das infra-estruturas pós-conflito. Elas têm hoje a oportunidade de aproveitar a diversificação económica, nomeadamente a agricultura, o transporte, a energia, os serviços e as indústrias transformadoras.

JA – Quais são os resultados concretos da visita oficial do Chefe de Estado angolano à França e em que termos e modalidades práticas estes resultados serão utilizados para o reforço da cooperação bilateral entre os dois países?

MC – Queria, em primeiro lugar, agradecer novamente a qualidade do acolhimento que foi reservado ao Presidente José Eduardo dos Santos pelo seu homólogo francês, o Presidente François Hollande, e agradecer o ministro dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, e todos os diplomatas franceses, entre os quais o meu homólogo em Luanda, que trabalharam incansavelmente para garantir o êxito dessa visita oficial.

O objectivo dessa visita era de validar os esforços diplomáticos desenvolvidos pelos dois lados, para relançar a dinâmica bilateral e, nessa óptica, o encontro dos dois Presidentes é, de facto, um sinal forte para iniciar a caminhada conjunta. Mas, a esse nível, é necessário relembrar também que o encontro entre os dois Chefes de Estado é um símbolo e tem como finalidade transmitir uma mensagem política positiva, destinada ao reforço da amizade entre os dois povos.

Agora que o movimento de conjunto está lançado, é necessário que a comissão conjunta e as equipas técnicas identifiquem os sectores prioritários entre os nossos dois países, para determinar os meios e as ferramentas para a implementação de uma cooperação intensa e inovadora.

A criação de uma Câmara de Comércio Angola-França seria talvez oportuna. Esse trabalho já foi iniciado e o acordo de isenção de vistos para os passaportes diplomáticos e de serviço vai no bom caminho.

Os dois países trabalham actualmente sobre um mecanismo de facilitação de vistos para certas categorias de pessoas com passaportes ordinários.

A prazo, será talvez necessário abrir as nossas duas economias a uma maior facilidade de circulação de bens e serviços, respeitando as regras da OMC e os critérios das organizações regionais, neste caso, a União Europeia e a SADC, às quais pertencem os nossos dois países.

Via JA

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