Damba quer a reabilitação de estradas para o escoamento dos produtos do campo

Administradora quer deixar a sua marca no município © Fotografia por: Mavitidi Mulaza |Edições Novembro

Por Silvino Fortunato

A resolução de problemas nos sectores da Energia, Educação e Construção são, na óptica da administradora municipal da Damba, as prioridades para o desenvolvimento daquele município da província do Uíge. Em entrevista ao Jornal de Angola, Ângela Cruz queixou-se do facto de, em termos de energia eléctrica, o município ser abastecido por fontes térmicas, que requerem o uso de grandes quantidades de combustível, que nem sempre a PRODEL consegue disponibilizar. Caso a situação financeira permita, a administradora pretende trabalhar, também, na reabilitação das vias de acesso e escoamento dos produtos do campo.

A Damba é terra de grandes quadros e intelectuais. Como foi recebida quando foi indicada para o cargo?

Fui recebida com muito carinho, muito afecto e muita disponibilidade destes intelectuais. Muitos deles orientam, dão algumas indicações daquilo que é a Damba, aquilo que eles pensam e que pode ser feito. Nós também sempre fomos mostrando a nossa dis-ponibilidade de ouvir, não só as críticas, mas também as opiniões. Por isso não tive problemas na recepção, pelo contrário tivemos todo o apoio.

A nível pessoal, como se sentiu nos primeiros tempos de trabalho, a dirigir um município com a dimensão histórica da Damba?

Na verdade encarei como um desafio, porque eu estava acostumada a fazer jornalismo e, de repente, recebo o desafio de gerir a administração, o qual aceitei.

Que município encontrou?

Bom! Dizem os mais velhos desta nossa região e em Kikongo que nós seguramos a catana onde os outros a deixaram (alusão ao prosseguimento do trabalho, onde os antecessores deixaram, continuidade). Nesta altura, estamos a caminhar, tem sido de facto um verdadeiro desafio porque a Damba, com quatro comunas – quer dizer cinco, com a sede -, tem algumas localidades com dificuldades de acesso e isso tem sido um calcanhar de Aquiles. Mas, como sabeis, temos as populações onde estão e temos feito tudo para atingir estas localidades. Felizmente, conhecemos e identificamos os problemas e temos trabalhado, sobretudo nas zonas de difícil acesso.

Que indicadores encontrou e quais os primeiros passos assumidos?   

A primeira preocupação que tivemos foi de trabalhar com o governo provincial para ver se fôssemos re-solvendo a reabilitação e, senão mesmo, a construção das vias secundárias e terciárias, o que não tem sido fácil, tendo em conta os recursos escassos que são postos à nossa disposição, mas, em algumas zonas, já conseguimos. Construímos, por exemplo, na via de Kamatangu, duas pontes, que fazem falta e criam sérias dificuldades de acesso à sede. No Lembwa, o maior problema são as obras de reabilitação da via que já começaram e já fizemos 10 quilómetros. Depois disto, tivemos de parar porque o mês passado identificamos uma área que nunca teve estrada desde a era colonial e com a ajuda do governador provincial, que disponibilizou uma máquina e os técnicos. Com isso, conseguimos abrir numa via de 22 quilómetros, em uma semana. Fizemos um trabalho de forma acelerada porque na altura nos apercebemos que a mesa da assembleia daquela localidade foi posta nesta zona que não tinha acesso, logo, não tinham como os eleitores chegarem lá. Isso deu-nos mais força ainda e conseguimos fazer a via, até atingirem a área em que nós queríamos atingir. Vamos depois resolver outras questões técnicas mas, pelo menos agora, a via está pronta e a população daquelas áreas está muito satisfeita.

Além daquele incentivo moral que disse, esses filhos da terra têm estado também a participar na luta pelo desenvolvimento da Damba, através do investimento privado?

Lamentavelmente, tenho de falar (apenas) de uma pessoa que identificamos como grande investidor. Ele tem estado muito e muito interessado mesmo em desenvolver o município onde nasceu. O General Ângelo! Este sim, tomamos conhecimento e fomos visitar o que faz. Ele construiu uma escola e dizia que ia fazer uma escola de música para a juventude. Estava a construir uma escola bem próxima da vila. Era uma pessoa que se envolvia de uma maneira directa, fazendo sentir a sua presença naquilo que era o desejo de ver esta Damba a desenvolver-se. Estamos em crer que existem também outros filhos que, de uma forma tímida, vão mostrando o seu desejo de investir na Damba. Vamos esperar que sim. Temos estado a contar com o apoio do actual embaixador de Angola no Congo Democrático. Este, sim, faz alguma coisa. Até já construiu a sua residência. Ele diz que, quando deixar de trabalhar, vem gozar a sua reforma aqui. Vai contribuindo, não com material, mas se calhar com aquilo que é mais importante: o incentivo moral. Orientar aqui e ali. Nós estamos imensamente gratas a ele.

Pode-se falar já da retoma da actividade agrícola em grande escala?

Temos grandes fazendas, algumas mais ali, ao lado do colonato na comuna do Tsoso. Os grandes produtores estão a tentar. Não é fácil, mas já há um indicativo muito bom, principalmente na produção de mandioca. Também, ainda lá para os lados do Tsoso, há um produtor que, no ano passado, colheu, aproximadamente, 300 toneladas de milho, que é um bom indicativo. Continuamos a trabalhar com o Governo Provincial na reabilitação ou construção dos acessos para facilitar o escoamento dos produtos. É o que os produtores mais se queixam. Temos estado disponíveis para com os nossos agricultores. Temos estado a dizer que todo aquele que tiver uma produção acima da média e dificuldade de escoamento, o Governo Provincial e a administração municipal estão aqui para ajudar com meios de transporte, até ao local da venda. O que mais atrapalha são as vias de acesso. A Damba é uma região que chove muito e a degradação das vias de acesso é frequente. As ravinas também assolam a nossa região. Em termos de projectos que possam impactar mais a nossa sociedade temos a reabilitação das vias de acesso.

Em que estado produtivo as grandes fazendas da época colonial se encontram? Continuam abandonadas?

Algumas já têm novos proprietários. O que mais complica e estamos a tentar ajudar é a problemática da documentação. Muitos cidadãos que ocuparam algumas fazendas esqueceram-se de fazer a sua legalização das terras, que é o mais importante. Temos estado a sensibilizar estes nossos produtores de que a primeira coisa que têm que fazer é ter o título de concessão de terras para conseguirem empréstimos bancários. Nós, localmente, temos estado a ajudar, independentemente da extensão de terras que vai solicitar, de acordo com as nossas competências, começando com a facilitação na obtenção dos processos iniciais.

Que tipo de assistência é prestada aos pequenos produtores?

Temos estado a ajudar com inputs agrícolas. Principalmente em todas as comunidades onde vamos, levamos os instrumentos de trabalho, mais necessários. Ainda não é possível ajudar todos na mecanização mas em termos de inputs temos estado a levar catanas, enxadas, ansinhos e outros. Também inserimos famílias nos projectos que temos estado a chamar de PLAAF, que é o projecto da agricultura familiar. Se-gundo o programa, para Damba foi eleita a produção da ginguba e feijão. Preparamos, na época passada, 200 hectares que distribuímos a 40 famílias. Nesta época estamos a fazer a mes-ma coisa. O trabalho de lavoura já começou com 52 hectares. O maior problema são as máquinas. As empresas que contratamos, na maior parte dos casos, não têm as máquinas em condições. Muitas vezes, acabam por atrasar o nosso trabalho. Nós tratamos, dragamos e damos as sementes e também damos assistência técnica. Foram enviados para cá jovens formados em engenharia agronómica, saídos da universidade Kimpa Vita. Foram distribuídos dois jovens para cada um dos 16 municípios da província, que têm estado a acompanhar o programa da agricultura familiar, uma espécie de escola de campo. Eles ajudam os chefes de famílias, dando os indicadores de como deve ser feito o plantio e ajudam também no cumprimento do tempo, porque o plantio tem o seu tempo, tal como a lavoura e a dragagem. É nosso desejo aumentar a capacidade para podermos ir em quase todas as comunidades do município porque a nossa população produz bastante. Se, manualmente, eles conseguem produzir o que vêem nos mercados, acredito que, com o trabalho mecanizado, vão produzir muito mais.

O que se pode falar do sector da Educação, nomeadamente das escolas, professores e outras condições de ensino?

O sector da Educação continua a ser um desafio. Todos os anos entram novos alunos. Neste momento, estamos a falar de 2.550 novos alunos em todas as escolas do município. Temos também novos professores. Recebemos 63 professores apurados no último concurso público realizado na província. Temos um total de 501 professores, que ainda é exíguo, a julgar pela extensão do município. Precisamos de muito mais.

Têm outros projectos no sector da Educação?

Nesta altura estamos a pensar – e tudo faremos para o efeito – inaugurar, nos próximos dias, uma escola de sete salas de aula, construídas no âmbito do PIIM. Praticamente, temos três escolas prontas. A escola que pretendemos inaugurar está na regedoria do Nzunga, para além da escola que está na comuna de Kamatangu, com sete salas de aula, construídas igualmente no âmbito do PIIM, e a escola de 12 salas que está na comuna do Tsoso. As duas escolas de sete salas de aula já estão concluídas. A escola do Nzunga já recebeu o aval para o financiamento do seu apetrechamento, que tem sido o problema. Os projectos são implementados apenas tendo em conta a construção, sem o apetrechamento. Mesmo para as duas escolas cujos projectos contemplavam o apetrechamento, dado o tempo e a subida de preços no mercado, foi preciso fazer um ajuste para cobrir as despesas. Só agora está a ser possível a resolução deste problema. Portanto, no âmbito do PIIM são três escolas. Encontramos muitas obras de escolas inacabadas e estamos a concluir algumas. Aqui mesmo na vila, estamos a terminar uma de sete salas. Inscrevemos todas no plano de acção para este novo ano económico. Esperamos ter de facto disponibilidade financeira, porque em cada aldeia devemos construir uma escola. Mesmo assim, apesar de todas as dificuldades, sobretudo no acesso, temos um número de 475 alunos fora do sistema de ensino. Com a entrada em funcionamento destas escolas, tenho a certeza de que o número vai reduzir. Os recursos humanos continuam a ser um grande desafio para nós. O nosso projecto está apontado para a construção de escolas, lá onde for necessário. Mas queremos que o financiamento venha acompanhado com a casa do professor, porque nas zonas mais recônditas é lá onde os professores não param. Alguns deles, principalmente os que vêm pela primeira vez, ficam um, dois meses fora, prejudicando os alunos. O que nós pensamos é a falta de condições de habitabilidade. Eles chegam nas aldeias e nós pedimos casas aos sobas, que nem sempre também têm para pôr o professor, como o ser humano precisa de estar bem acomodado. Queremos que nas próximas construções cada escola tenha uma casa para acomodar o professor.

Que outros sectores participam no processo de ensino e aprendizagem aqui na Damba?

Não temos escolas privadas, mas temos algumas ONG, como a UNICEF, que vêm, de quando em quando, juntar-se ao sector da educação para darem o seu contributo, principalmente no ensino da infância. Têm sempre os seus projectos de mais-valia.

O que fazem concretamente essas ONG?

Trabalham com as crianças do ensino primário em projecto como a educação moral e cívica, aulas de música e outras que fazem parte da educação das crianças.

Que avanços e recuos podem ser apontados no sector da Saúde?

O sector tem de facto os seus avanços, se tivermos em conta que todos os anos há concursos para o ingresso de novos efectivos. A cada ano que passa, estamos a ver que aumenta o número de efectivos. Temos informações de que o Governo Provincial está empenhado. Já resolveu o problema dos colaboradores contratados, que é um avanço assinalável. Conseguimos ter assim mais técnicos efectivos e isso vai ser bom para nós. Temos no município 27 unidades sanitárias, traduzidas em dois hospitais, três centros e 22 postos. Temos um posto encerrado por causa da falta de recursos humanos que faz com que as coisas não aconteçam como prevíamos e tendo em conta também a extensão do próprio município. Ainda falta muito para termos um sector da saúde estabilizado. Precisamos construir ainda outras unidades para ver se conseguimos cobrir pelo menos aquelas áreas em que a saúde faz falta. Há também alguma contrariedade às nossas intenções provocadas do facto de as nossas populações irem criando sempre as suas “aldeitas”, habitando nelas três, quatro pessoas apenas, outras não tem mais de mil habitantes, as vezes não chegam a 500 habitantes. Tem 200 habitantes, o que fica difícil para se fazer um posto médico para cada aldeia que vai aparecendo. Aquelas localidades que já identificamos, que precisam de facto de um posto médico ou centro médico, faremos um esforço para tal, porque a saúde está em primeiro lugar.

Desde que assumiu o cargo quantos hospitais construíram e quantos projectaram?

Não construímos hospital nenhum, mas concluímos. Na sede da comuna de Kamatandu, concluímos um centro médico e por esta altura estamos a fazer todo o esforço para o seu apetrechamento e também montamos um posto médico na regedoria do Kinginbu.

Em muitas comunidades há queixas de irregularidades no fornecimento de medicamentos às unidades médicas. Qual é o quadro da Damba?

Às vezes, a irregularidade no fornecimento de medicamentos resulta das dificuldades dos acessos. Por exemplo, em tempo record, nem sempre se pode ir a Lembwa, principalmente no período de chuvas. Os medicamentos sempre existem porque todos os meses são comprados. Isso não pode falhar. Na verdade, o que acontece é o, cada vez maior, o número de habitantes em certas localidades e, que se calhar, a quantidade que vai mensalmente devia começar a ir de 15 em 15 dias. As localidades que não conseguimos atingir e porque também até os carros privados só lá vão uma ou duas vezes por mês. Mesmo assim, encontramos sempre o jeito de mandarmos os medicamentos essenciais para a assistência das populações. Quando nós podermos, levamos já uma boa quantidade. Mas também temos tido o cuidado de ver que há remédios que expiram. Não tem faltado vacinas para todas as localidades, mesmo para as localidades de difícil acesso. Os nossos técnicos muitas vezes an-dam a pé, atravessam rios para atingirem as aldeias mais longínquas. Por exemplo, na regedoria de Kimbula Pedro, que para aceder temos que ir pelo Luando Mucaba, atravessar o rio Nzadi, para atingirmos o Nkele ou o Kumbunga Pedro. Nas localidades onde não temos um posto médico arranjamos sempre uma maneira de metermos lá um enfermeiro para a assistência às comunidades.

Como avalia a situação da assistência materna e infantil?

Temos um hospital materno infantil, que também já consta nas nossas previsões a sua reabilitação e ampliação. O materno-infantil é um hospital comparticipado com a Igreja Católica, onde a assistência é razoável. Temos quase todos os serviços, como o programa alargado de vacinação, os serviços de puericultura, onde as crianças mensalmente são pesadas, acompanhamento da sua evolução, assistências à malnutrição. Ultimamente estão a receber muitos casos de malnutrição, mas o espaço para o tratamento destes casos está a funcionar bem.

Os partos continuam a contar com a participação das parteiras tradicionais?

Temos algumas parteiras tradicionais, mas já não têm tanto serviço como antigamente, isso porque a maioria das regedorias têm um hospital e um posto médico, embora haja ainda, como no Nkusu Mete, uma parteira tradicional que assiste alguns partos e que informa sempre que tem um parto. Portanto, algumas deixaram de exercer porque a nossa população, principalmente as mulheres e por causa da frequente sensibilização de educação sanitária, já ganhou a cultura de ir ao hospital para lá ter os seus bebés. São situações que, anteriormente, não aconteciam. A mulher preferia ter o parto em casa que resultava, às vezes, em muitos casos de fístula obstétrica. Agora vamos no nosso hospital materno e encontramos cheio que é para nós uma grande satisfação, um sinal de que a população, principalmente as mulheres, têm estado a receber a nossa comunicação, a nossa sensibilização, os nossos conselhos.

Que perspectivas tem para o futuro do município? Ou seja, que Damba quer deixar para o futuro dos seus filhos?

Como dizia, a Damba tem os seus desafios. Caso a situação financeira permita – e cremos que vai sim -, queremos deixar asfaltadas as ruas da vila da Damba, para melhorar a imagem da própria vila. Temos muitas ruas mas a olho nu pensamos que a Damba só tem uma única rua. Asfaltadas todas as ruas, as pessoas vão ter uma outra percepção do que é realmente a Damba, que até é uma vila bonita. No sector da Energia, felizmente, os trabalhos começaram com a construção da subestação que vai trazer a electricidade para o município da Damba. A falta de energia eléctrica representa um dos maiores problemas que temos, porque somos abastecidos por um gerador de 800 KVA mas o combustível tem sido um “calcanhar de Aquiles”. Dependemos da PRODEL, que nem sempre tem capacidade em termos de transportes e muitas vezes falha o combustível. Quando isso acontece, ficamos sem o abastecimento. Este é um dos assuntos que queremos deixar resolvido. O sistema de água também já é um facto, já estão encontradas as empresas que vão trabalhar no sentido do abastecimento do município. Queremos aqui uma instituição universitária, ainda que seja núcleo do ensino superior. Isso evitaria a dispersão da nossa juventude que é obrigada a deixar, constantemente, as suas famílias em busca de formação. Queremos que os muitos projectos que temos em mente sejam implementados ainda no nosso tempo. Queremos que todos os acessos sejam um dia reabilitados para o escoamento de tanta produção que a Damba tem.

Via JA

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