Os CAMINHOS DA VIDA de FREI FACATINO. Uma vida a ajudar rapazes de rua.

Por Rui Ramos

João Fortunato Escarivo Facatino nasceu na Damba, província do Uíge, há 53 anos. Conhecido por Frei Facatino, é o director do Centro de Acolhimento de Crianças Arnaldo Janssen-CACJ, que funciona no Palanca, em Luanda, há 27 anos.

Filho de João Escarivo Facatino, enfermeiro, e de Maria Rosa Swaminu, foi educado no Uíge, onde estudou até à quarta classe. Depois João Facatino rumou para a casa dos avós na Samba, em Luanda, e frequentou a Escola Primeiro de Maio, até viajar de novo, com os pais, para o Sumbe, mas o regresso à capital não demorou, para se inscrever no Curso Propedêutico na Paróquia Nossa Senhora de Fátima, ou São Domingos, onde frequentou o Seminário e passou a integrar a Congregação Verbo Divino.

Em 1989 parte para o Ghana para estudar Teologia e depois para Portugal, onde se licencia na Universidade Católica, altura em que faz a solicitação para ser frei, ou irmão, antes de ir para o Congo-Kinshasa cumprir seis anos como missionário e trabalhar na Congregação Justiça e Paz, de que é o responsável em Angola.

Em 2005 está na Paróquia de Cristo Rei, no Rangel, e dois anos mais tarde é convidado pela congregação a assumir a direcção do Centro de Acolhimento de Crianças Arnaldo Janssen-CACAJ, em substituição do padre Horácio, que partira para o Brasil.

Foi um enorme desafio, diz, porque o centro estava muito degradado, os problemas eram muitos, e a BP cortara o subsídio. Frei Facatino aceitou e meteu mãos à obra para ajudar aqueles 150 rapazes que encontrou em situação muito difícil. Mas os problemas ultrapassavam os muros do centro, estavam na rua, onde grupos de crianças e de jovens vivem o seu dia a dia.

Uma parceria com a Samu Social Internacional, financiada pela União Europeia, permitiu criar a Equipa Móvel de Ajuda para apoiar os jovens de rua de Luanda. A equipa integra um enfermeiro e trabalha de segunda a sexta-feira a partir das 18h00.

As crianças, diz Frei Facatino, vivem em focos no1.º de Maio, Xamavu, Aeroporto, Ilha, São Paulo, Chicala e Talatona. Nos focos há um líder, o jovem mais forte. Em comum têm problemas graves com as famílias, que na maior parte das vezes os expulsou de casa sob acusação de feitiçaria.

Muitos cheiram gasolina mas vão lavando carros e ajudam senhoras a transportar sacos. Os jovens de rua não estudam e a sua recolha é problemática, porque não aceitam adaptar-se às regras do centro e regressam à rua. O desafio é enorme, explica Frei Facatino, que gere aquele mundo complexo de ajuda, coadjuvado pela madre Regina, da Indonésia.

Neste momento setenta rapazes frequentam o ciclo primário. Já para os mais velhos, que frequentam a partir da sétima classe, o centro procura espaço nas escolas próximas. O centro médico do CACAJ presta serviço à comunidade, com um médico de clínica geral, enfermeiro, sala de internamento de dia e um pequeno laboratório.

Uma das maiores preocupações de Frei Facatino é a reinserção dos jovens, seja a nível familiar seja profissional, há que encontrar formação profissional, com a ajuda dos «padrinhos».

Frei Facatino elogia quem, na sociedade, tira do seu para ajudar o próximo. A figura do «padrinho» foi criada há algum tempo. O padrinho acompanha o crescimento de uma criança, recebe-a em casa aos fins de semana para elevar a auto-estima de quem vive no meio de tanta infelicidade.

Os maiores benfeitores são o Kero, a Refriango e a FESA, com subsídios de formação, e a TDA-Teixeira Duarte, com formação profissional e enquadramento. A União Europeia financia os medicamentos que a Equipa de Ajuda Móvel receita aos rapazes de rua.

A maior parte dos rapazes acolhidos no CACJ foram expulsos de casa sob acusação de «feitiçaria» e correm perigo de vida à mão dos seus próprios pais ou avós. Deambulam pelas ruas de Luanda e quando a equipa do CACJ os leva a casa da família para uma entrevista conjunta, não é raro ouvirem os parentes dizer «ainda voam de noite?».
Cada um desses caso é chamado «caso F.», alguns rapazes tentam esquecer outros não conseguem mais reconciliar-se com a família.

Não é fácil lidar com essas centenas de crianças e rapazes excluídos da sociedade, sem estudos, sem carinho e sem laços familiares. O ideal, diz Frei Facatino, é reintegrá-los na família natural, mas os jovens a maior parte das vezes não aceitam.

Frei Facatino pede às famílias que não desistam do seu papel de educadores dos filhos e à sociedade que seja generosa para as crianças e os mais velhos em risco. Fwacatino, palavra kikongo, significa «da morte não se foge». Frei Facatino diz que no registo os italianos se esqueceram do «w». Mas ele, se da morte não pode fugir, não fugiu dos desafios que pareciam insolúveis.

Hoje, o CACAJ tem uma biblioteca e um estúdio de gravação, em parceria com a Fundação Arte e Cultura, uma sala de electrónica, um centro médico, e é um oásis de esperança na vida deserta de centenas de rapazes, vítimas da desestruturação da sociedade e do obscurantismo de muitas famílias.

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