OS LANGAS

Por Eduardo Kussendala

Langa é um nome pejorativo que é atribuído aos cidadãos originários da vizinha República Democrática do Congo, e erroneamente aos angolanos regressados ​​à pátria depois de terem sido exilado nos Congos, seus descendentes e/ou angolanos nascidos no Uige ou Zaíre.

O termo LANGA surge em meados dos anos 70, mais propriamente 1977/78 e é proveniente do agrupamento musical zairense Zaiko Langa-Langa do qual despontou o músico Papá Wemba, e fez bastante sucesso africano naquela década. O sucesso de Zaiko Langa-Langa coincide com a célebre visita do saudoso Presidente Agostinho Neto ao Zaire, e o regresso em grande escala dos angolanos exilados na ex-República do Zaire, (hoje Congo Democrático).

Para melhor entendermos este fenômeno migratório e os ditos “LANGAS”, devemos recuar um pouco na história, desde os primeiros passos da luta de libertação nacional, o que foi a clandestinidade dos movimentos de libertação, antes de pegarem em armas e darem os golpes iniciais desta luta contra o colonialismo português.

1955-1960 CLANDESTINIDADE

Para além de existirem sempre angolanos, na sua maioria do norte de Angola no vizinho Congo Belga e Congo Francês por razões de vizinhança e cultural, o êxodo para os dois Congos aumentou bastante na segunda metade da década de 50, com as perseguições políticas pela tenbrosa PIDE/DGS aos nacionalistas angolanos, que fugindo das perseguições e prisões e torturas, encontraram nos dois Congos, o esconderijo mais rápido de alcançar fora de Angola, por motivos óbvios.

1960-1975

AS INDEPENDÊNCIAS DOS CONGOS EO INÍCIO DA LUTA DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA.

Tendo os dois Congos se tornado independentes em 1960, permitiram aos movimentos contestatários do regime colonial em Angola, saírem da clandestinidade e nos Congos se reorganizarem em exércitos, pegarem em armas, darem os primeiros passos e golpes que viriam a ser o início da luta de Libertação de Angola.

O massacre da Baixa de Cassange em Malanje a 4 de Janeiro, os ataques as cadeias de São Paulo e casa de reclusão em Luanda a 4 e 11 de Fevereiro e 15 de Março no norte de Angola, todos em 1961, devido aos danos humanos e desgaste de imagem ao colonialismo português, provocou um êxodo de grande parte das regiões do norte de Angola, assim como de nacionalistas, fugindo da brutal repressão policial em retaliação aos ataques dos nacionalistas e independentistas de Angola.

1975-1980

A INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA E O REGRESSO DAS POPULAÇÕES DO NORTE DE ANGOLA EXILADOS NOS CONGOS

Com o 25 de Abril em Portugal, e a independência de Angola a 11 de Novembro de 1975, o governo da RPA sob liderança do MPLA e do Presidente da República Agostinho Neto, inicia então um movimento diplomático para permitir o regresso ao país, dos angolanos que fugiram de Angola para os países vizinhos durante os longo período da luta de Libertação nacional, processo este que culminou com a celebre e corajosa visita do Presidente Neto ao Zaire presidido por Mobutu Seseseku, sendo o regresso dos angolanos exilados no país irmãos, no topo da agenda do Presidente angolano.
Foi como resultado desta visita, que chegaram em Angola, entre meados de 1977 a 1980, regressaram em Angola, um grande número de angolanos, na sua maioria do norte de Angola da etnia bakongo, e foram realojados em tendas ali onde hoje é o bairro Palanca.
Os primeiros retornados a chegarem eram batizados pelos irmãos angolanos de “RETRÓ” ou “REGRESSADOS”, e quando eram confundidos por zairenses, eram chamados como “ZAZÁS”.

É sucesso nesta fase que o agrupamento musical Zaiko Langa-Langa da República do Zaire fazia, e surge então o LANGA para os nossos irmãos retornados e aos migrantes zairenses em Angola.

Os nossos irmãos angolanos bakongos do norte de Angola, são muitas vezes chamados de LANGAS, devido a incapacidade de muitos angolanos, destinguir um bakongo congolês, de um bakongo angolano, e também a ignorância dos laços culturais entre os dois povos, assim como a importância dos dois CONGOS para a libertação e independência de Angola, acrescentado ao domínio da língua lingala pelos angolanos regressados e os povos das regiões fronteiriças com o Congo Kinshasa. Outro aspecto que contribuiu negativamente para este tipo de estigma, foi a europização das populações nos principais centros urbanos de Angola.

1980-2022

ΟA GUERRA CIVIL, A PAZ E A RECONCILIAÇÃO NACIONAL

Me lembro que nos primeiros anos da década de 80’s, quando chego a Luanda, os regressados dos CONGOS eram estigmatizados e verbalmente abusados por falarem lingala ou kikongo e chamados de “LANGAS ou ZAIKÓ”, assim como todos nós vindo do interior fugindo da guerra civil, éramos igualmente apelidados e verbalmente abusados de “TEJOS” os ovimbudus de “MBALUS” como se todo o sulano fosse Bailundo e nós os do Libolo, Kibala ou os Songos de Malanje éramos os “FAKIRES” por termos facas na cara. E estes ataques chegaram a serem violentos em certas situações, ao ponto de muito congolês fingir ser angolano, e muito angolano inibir-se de falar kikongu ou Lingala em público, com medo ou receio de ser confundido com “LANGA” e sofrer abusos morais ou violência.

O mesmo abuso persiste, apesar de ter baixado significativamente em comparação as últimas três décadas do século XX, fruto desta ignorância cultural, social e política de grande parte das populações nos centros urbanos de Angola.
A redução, creio ser resultado do aumento de educação, o facto de haver paz e o angolano das cidades como Luanda ser capaz de visitar outras províncias, o surgimento das redes sociais e o acesso fácil a informações que elevam a cultura dos leitores entre outros factores.

Resumindo: o zairense não é angolano, eo angolano não é zairense, mas os laços que nos unem são de irmandade e historicamente tão fortes que dispensa-se e deve ser desencorajado qualquer tratamento pejorativo a qualquer um destes povos. Digo isso, porque no Congo Kinshasa, os angolanos também são pejorativamente tratados de “XUNGUS”.

Comentário

1 Comment

  1. Muito obrigado pela partilha.

    Senti a necessidade de esclarecer alguns pontos, para ajudar os angolanos a entenderem a importância e relevância dos congoleses para a nossa história, e contribuir para o fim do estigma contra os bakongos dos dois lados da fronteira norte.
    Na verdade, somos um só povo que o colonialismo dividiu.

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