Os vídeos de casamento congoleses

Por Sousa Jamba

 

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Esta semana, assisti a vários vídeos de casamentos africanos no Ocidente, por causa de uma história que me fascinou bastante. Um tio congolês, naquelas andanças incertas da vida, acabou por ter uma esposa e filhos na França e um «deuxieme bureau» ou amante aqui nos Estados Unidos.

Por vários anos, tudo foi andando muito bem: o tio passava uma parte do ano na Europa e a outra na América. Só que a amante dos Estados Unidos, também congolesa, começou a reivindicar muitas coisas. Ela acusou o tio de favorecer a família em Paris e de ter negligenciado os filhos nos Estados Unidos. Ela insistiu que o tio havia mentido, ao dizer-lhe que a sua vida dupla seria só uma questão de tempo até que a velhota na França, que não podia com sexo oral (sim, isto mesmo), passasse à história. Grande maka.

Depois, de repente, aparece um vídeo de casamento da filha do tio em questão. A senhora nos
Estados Unidos não gostou. Neste vídeo, o tio louva a Deus por lhe ter dado uma esposa (a de Paris) perfeitíssima e filhos que estavam sempre a lhe fazer sentir bastante orgulhoso. E o tio quase chora com paixão quando fado grande amor da sua vida. No vídeo, a família vive numa casa matulona, fora de Paris, com viaturas, jardins, etc., Temos aqui autenticomembros da alta burguesia.

A senhora dos Estados Unidos ficou tão desanimada pelo vídeo, que começou a perder o sono,
tendo que ir ao medico que sugeriu que ela precisava de alguma forma de terapia urgentemente. A polícia teve que ser chamada porque ela mordeu o órgão privado do tio durante o que deveria ser um grande momento de intimidade. O tio congolês atribuiu a agressão da sua amante à influência das suas colegas no trabalho.

Finalmente, a senhora dos Estados Unidos levou o tio a tribunal, pedindo um apoio financeiro continuo para as crianças. O tio disse que tudo que estava no vídeo do casamento era falso. A casa, as viaturas e até certas visitas a cerimónia tinham sido contratadas.

Um vídeo que tratasse da sua realidade em Paris, segundo o tio, seria muito diferente da «fan-tasia» do vídeo do casamento da filha. Ele insistiu que tudo que tinha dito no vídeo era falso, que o verdadeiro amor da vida dele era a senhora nos Estados Unidos. O tio esta agora a precisar de terapia também. Ele tem tido sonhos com mulheres de dentes tipo de Drácula, que vão correndo à sua trás.

Pará muitos congoleses na diáspora – França, Reino Unido e Canadá – o vídeo do casamento seu ou de um parente próximo é uma espécie de carta para os que ficaram no país de origem. Diz-se que nos anos 60, os congoleses que chegassem da Europa, levavam consigo malas de roupa de marca como prova de que tinham mesmo estado no «Puto». O vídeo de casamento, para muitos deles, serve, então, para mostrar a boa vida. Claro que este vídeo não vai mostrar que a maioria dos imigrantes vive em apartamentos pequenos, que as senhoras têm que ter vários empregos para conseguirem sustentar as famílias. Há, na YouTube, um documentário sobre aquela grande figura da diáspora congolesa, o Papá Wemba.
Um dos seus contactos admite que muitas das roupas de marca que ele tinha eram roubadas. Havia também um mercado de roupa de marca falsa; muita roupa era feita na China. O lado negativo da existência dos congoleses na diáspora é ocultado.

No início dos vídeos de casamentos congoleses há uma espécie de publicidade das roupas e jóias que o casal vai usar: Yves St. Laurent, Versace e Weston, entre outras. Em certos vídeos, até a etiqueta com o preço (6,000 Euros) é exibida. Está a surgir, no continente africano, o que alguém chamou de jornalismo de aspiração.

Nos anos 80, quando vivia em Londres, havia revistas nigerianas, cheias de festas de casamentos da elite, que eram compradas por gente que queria espreitar aquele mundo de tanto glamour; o mesmo é o caso com os vídeos dos casamentos congoleses da diáspora.

Os congoleses nos Estados Unidos gostam de vídeos de casamentos seus feitos em clubes de golfe. Em certos casos, viaturas caríssimas são alugadas para fazerem parte da coluna que acompanha o casal. Na recepção, as garrafas de champanhe Cristal são exibidas. Dizem-me que, às vezes, que, entre os convidados, há falta de algumas caras brancas.

Alguém que esta no Ocidente precisa de mostrar que tem alguns amigos «mundeles» – mas não brancos quaisquer. Neste caso, há uma agência em Londres para onde alguém pode ir à procura de homens e mulheres brancos lindos. O caso é o mesmo com os cavalheiros de damas; alguns não são apresentáveis. É que alguns vídeos de casamentos congoleses parecem ser pequenas produções de cinema; já vi um vídeo no qual a equipa que estava a filmar parecia ser maior do que o número de convidados.

Devo dizer que nem tudo é extravagante nos vídeos. Os congoleses cristãos produzem vídeos
mais modestos e com uma maior carga espiritual. Em muitas capitais ocidentais, os congoleses frequentam igrejas próprias, muitas das vezes modestas. Muitos filmam mesmo nestas localidades onde as pessoas cantam em vários dialectos do Congo Democrático. Depois há também narrativas nestes vídeos – algumas bastante comoventes. Por exemplo, num desses vídeos, a mãe da noiva diz que o casamento é saber aturar; ela tinha tido a má sorte de teruma sogra que era verdadeiramente uma bruxa de cinco estrelas, mas a quem foi aguentando durante décadas.

Falando de vídeos de casamentos, devo dizer que os mais interessantes são de certos negros sul-africanos que fazem uma combinação entre as culturas africana e ocidental. O vídeo de casamento africano mais popular – visto por milhões em toda parte do mundo – é de um casal bastante divertido em Nairobi, Quénia. Neste vídeo, a noiva diz que adora o seu noivo porque ele é alguém com quem ela pode fazer parvoíces.

No vídeo, há uma dança cheia de energia e paixão, em que parentes e amigos participam. O
mundo valoriza muito o que é autêntico. Muitos dos vídeos de casamentos de muitos congoleses aqui na diáspora não são, certamente, autênticos.

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