Por Roberto Ofã Sindejí
(Com base em informações/traduções feitas a partir do site oficial Bundu Dia Kongo)
É MFUMU AKONGO um “deus sem corpo”, o pai celestial.
Possui três faces, um deus trino.
Foi chamado de NE MBUMBA LOWA, pois ele criou o Sol.
Também foi chamado de NE KONGO KALUNGA, pois criou o oceano.
Por fim lhe deram o nome de NE MUANDA NSEMI, pois seu espírito habita toda a natureza.
Criou o Universo “MAHANZA”. Colocou nesse Universo muitas Galáxias “KISANGANZA”, entre elas a Via Láctea, ou seja, O Caminho Único “NZILA ZOMBO”. Em cada Galáxia muitos Sistemas Solares “NZALOWA”. Estes Sistemas Solares possuem Sol “LOWA” e muitos Planetas “MPINANZA”. Tudo isso em perfeita harmonia no Espaço Sideral “LUYALUNGUNU”.
Os Planetas do nosso Sistema Solar são:
HANGIA (Mercúrio)
KAZAKI (Vênus)
NTOTO (Terra)
KAZITA (Marte)
KIZAKA (Jupiter)
KIMBEZA (Saturno)
LUKAZI (Urano)
NEPITU (Netuno)
KINGULU (Plutão)
E ainda outros três planetas que ainda não foram descobertos pela ciência, mas que profecias de antigos sábios do Reino do Kongo dizem existir: NUKADA, NTADUA e YE NGOSA.
O Reino do Kongo é considerado o Reino de Deus manifestado na Terra. Lendas dizem que AKONGO (TATA NZAMBI MPUNGU) não criou tudo sozinho, teve a ajuda de seres encantados especializados em cumprir as ordenanças divinas “SIMBI BIA KINSEMI”, são ao todo quarenta e nove auxiliares do ente divino. No Planeta Terra, também chamado de Mundo da Cruz “NZA DIKULUNZI”, pois é onde o mundo dos vivos se encontra com o mundo dos mortos. Há para isso um Cosmograma “DIEKENGA” (texto elaborado com base nos estudos da vida e obra do etnólogo congolês Fu Kiau Benkesi) que faz uma analogia entre a vida humana e os momentos do Sol: KALA (o nascimento), TUKULA (a maturidade), LUVEMBA (a morte) e MUSONI (a concepção espiritual). Esses dois mundos são divididos pela KALUNGA (Oceano Atlântico), acima dela o mundo dos vivos “KU-NSEKE” e o mundo dos mortos “KU-MPEMBA”. Para os Bakongo a pele da existência física é preta, mas a pele espiritual é branca. Não há conceito de reencarnação, mas o da comunicação vertical entre o mundo dos vivos (NZA YAYI) e o mundo dos mortos (NSI A BAFWA). KALUNGA une as águas sagradas do grande rio “NZADI” e do oceano “M’BU”.
AKONGO criou NE ZALA MPANDU e MAMA NKENGE LUFUMA que se uniram em matrimônio e tiveram doze filhos, deles se derivaram as cento e quarenta e quatro comunas “MIMVUKA” no Reino do KONGO DIA NTOTELA. Descendendo de NA LUKENGO (um dos filhos de NE NZALA MPANDU e MAMA NKENGE LUFUMA) havia KONGO NIMI que se casou com YAYA NGUNU e tiveram três filhos e neles se manifestoram as características de AKONGO e a partir deles se fez o Reino do Kongo (as três províncias principais: NGOYO, KAKONGO e LOANGO, cuja capital era MBANZA KONGO):
NKULU NSAKU NE VUNDA: que manifestou o amor divino “ZOLA” e o caminho inicial da religião Bakongo “NZILA KONGO”. É representado pela cor Azul “MBUDI”.
NKULU NGAMBONA MPANZU: que manifestou a inteligência divina, a cratividade original “NGANGU”. Um guerreiro e mestre das ciências e metalurgia. É representado pela cor Amarela “TUNDU”.
NKULU KINZAMBI NZINGA: que manifestou o poder político “LENDO”, o bom jeito de governar “MAYALA”. Sua cor é o Vermelho “MBUAKI”.
Esses fatos acima narrados foram retirados de uma tradição oral que passada de geração após geração remonta um período de 6.200 anos (anterior, inclusive, à civilização egípcia, pois acredita-se que essa se derivou dos descendentes de AKONGO em seus fluxos migratórios da nascente à foz do Rio Nilo)
Os Bakongo já tinham, dentro de suas concepções matemáticas e astronômicas uma ideia bem próxima do que hoje conhecemos como a velocidade da luz (300.000 km/s), conheciam as doze constelações zodiacais e, de certa forma, sabiam sua distância do Planeta Terra (100 anos/luz). Tinham uma base de cálculo que previa uma média que variava entre 80 até 130 anos para que a vibração/radiação zodiacal alcançasse a Terra. Traziam nessa premissa o conceito do “ovo cósmico do Kongo” e as seguintes analogias (etimológicas/semânticas):
KITIENGA (Áries)
NGOMBE (Touro)
ZI NSIMBA (Gêmeos)
NKALA (Câncer)
NKOSI (Leão)
MUENZE (Virgem)
NKAMVU (Libra)
NKUTU (Escorpião)
MADIONGA (Sagitário)
NANTABA (Capricórnio)
KINATIMAZA (Aquário)
BAMBISIMA (Peixes)
O mundo espiritual criado por AKONGO TATA NZAMBI MPUNGU tem para seu acesso três portões principais e cada um desses portões possui quatro portões secundários, simbolizando as doze casas zodiacais sob a perspectiva do Sol, da Lua e do Horizonte Espacial. Os aprendizes dessa ciência suprema “MALESA” são chamados de “MAKESA MU NZILA KONGO” e seus fundamentos vem da Academia de Magia “MAKABANA”. Esse conhecimento foi trazido pelos Filhos do Céu “BANA BA ZULU” (vindos de KAKONGO: Estrela Sirius e que voltarão para anunciar a chegada da Era de Aquário “TANDU KIA KINATIMAZA”) e revelado para os Filhos do Kongo “BANA BI KONGO” e estes ensinaram para os egípcios “EKIPATA” que representaram isso no Zodíaco de Denderah.
Para os Bakongo a revelação se dá no subconsciente e pode acontecer nos sonhos (caso você esteja em sua terra, perto de seus ancestrais) ou por rituais que incentivam a alucinação “MUTHEMBA” (caso esteja longe de seus ancestrais e precise invocá-los de um modo mais garantido). De qualquer forma, quando acordado também se pode falar com os ancestrais, basta que se risque no chão um DIEKENGA e sobre ele faça os juramentos sagrados, essa é a forma de alinhar TUKULA com MUSONI (união vertical, que ultrapassa KALUNGA). A força invocada é a força espiritual “NGUNZA”. A invocação “MBILA” se faz com canções “NKUNGA” na língua dos antepassados, no caso dos Bakongo, o Kikongo. Nessa crença pan-africanista se invoca os antepassados, a etnia dos antepassados e a alta hierarquia espiritual e o ente espiritual que faz essa ponte entre os seres humanos e AKONGO é: “NGUDI’A MBILA” que traz em si o poder “LENDO”, a inteligência “NGANGU” e o amor “ZOLA”, ela é considerada a “Mãe da Invocação”, em termos de comparação está para Yemonjá dos iorubás ou a Iemanjá dos angoleiros (candomblé). Ela só se manifesta nas rezas feitas na língua Kikongo.
Acredita-se, inclusive, que o hebraico é uma versão mais pura (mas cheia de sotaque) do dialeto Kikongo, sendo que a Estrela de Davi (de seis pontas) foi levada por Makenda Sabá para Jerusalém quando esta esteve com o rei Salomão (960 a.C.), assim como foi ela quem trouxe a Arca da Aliança para a Etiópia (onde ficava seu reino). Da união de Makenda Sabá e Salomão nasce um povo: FALASHA. Houve muita miscigenação de mitos entre os Bantu (Kongo), Egípcios, Hebreus, Hindus e ainda Muçulmanos.
AKONGO TATA NZAMBI MPUNGU a partir das vinte e sete mansões assentadas na Lua preparou os quatro elementos (terra, água, ar e fogo), foi ali que criou as setes vibrações do Cosmos e delas extraiu os ancestrais primordiais, criou um protótipo do ser humano em forma de “Peixe-Gato” chamado ANAGONO. Criou também seres semelhantes, quadrigêmeos: NOMMO DIE (Sumo Sacerdote do Céu), NOMMO TITIYAYNE (Aquele que executa a obra divina), NOMMO NSEMI (Aquele que foi sacrificado) e YURUGU (a desordem, o caos da criação). NOMMO NSEMI teve seu nome mudado para OGO, se revoltou e quis ser como AKONGO, mas não podia criar como ele criava, foi então que AKONGO amarrou OGO em um tronco de Acácia e o sacrificou, derramou seu sangue e partiu seu corpo em várias partes e dessas partes criou as estrelas e os planetas. Por fim AKONGO juntou os pedaços de OGO e amassou junto com os pedaços de uma mulher e juntou os outros gêmeos e amassou todos juntos e os colocou dentro de uma arca. Essa arca foi trazida para o Planeta Terra e esses pedaços tinham se transformado em plantas, animais e nos primeiros seres humanos que habitaram a Terra). Dessa forma a humanidade se desenvolveu e a vida se organizou na Terra.
Quem trouxe essa arca para Terra foi NE MUANDA KONGO, o grande arcanjo da África Bantu (Centro-Sul) e assim surgiu o Reino do KONGO DIA NTOTELA.
Dos entes sagrados mais cultuados destacam-se os dez Antepassados Divinos (detentores do NKISI, a energia divina que pode curar, dispersa em toda criação desde os reinos, elementos até os fenômenos da natureza):
NZALA MPANDU: Aquele que sabe tudo que é sagrado
MBEMBA ZULU: A águia do céu
LUNDA MAKANDA: O guardião das nações
MAYINDU MA ZULU: O pensamento do céu
NKEMBO WAMONESUA: A glória revelada
TUTI DIA TIYIA: A nuvem de fogo
NE MUANDA NSEMI: O espírito que cria
MALEMBA NKULU: O antepassado que traz paz
MVIDI MUKULU: O antepassado mais santo
MUKULU NKULU: O antepassado mais antigo (original)
Uma cronologia simples retrata desde a aparição de NE MUANDA KONGO até o início da escravidão no Kongo por Diego Cão (que dividiu o Kongo em três partes: francês, belga e português):
ano 220: aparição do arcanjo NE MUANDA KONGO à NE MBEMBA ZULU (que havia saído da Etiópia e ido para o Egito e de lá migrou para o centro-sul do continente africano com a missão de dominar o território que unia Kalunga (oceano Atlântico) à nascente do Rio Nilo para receber o MANIKONGO (o rei que viria do céu). NE MBEMBA ZULU migrou e chegou ao lugar que hoje é o Zimbábue e ali ajudou na construção de uma grande civilização que, com sua saída, entrou em decadência e todo o povo de descendia de NE MBEMBA ZULU, conhecido como BENA KONGO foi punido com raios que caíam do céu como chuva. Os sobreviventes deram início à uma nova geração de BENA KONGO a partir do deserto do KALAHARI, unindo-se aos povos ZULU (África do Sul).
ano 320: KONGO DIA MPANGALA, cuja capital foi KIMPEMBA, liderada na época por NE NSANSUKULU.
ano 420: KONGO DIA MULAZA, onde a capital se assentou na cidade de KAHEMBA e, depois, em FESHI, tudo sob a liderança de NE KODI PUANGA.
ano 529: KONGO DIA LUANGO ou KONGO DIA MPANZU, em homenagem a MPANZU e seu conhecimento sobre metalurgia, a capital foi em ZIMBA e a liderança estava nas mãos de NE NEXGELE MBELE.
ano 690: KONGO DIA NTOTELA, onde a capital se dividiu em três montanhas: LEMBA, NKAYILA e NKUMB’AWUNGUDI, tudo na liderança do profeta KULUNSI (os nomes das montanhas significam “paz”). O sumo sacerdote na época era NKEMBO WAMONESUA e ele tinha um conselho formado por doze velhos sábios, todos eles subiram à montanha e lá encontraram o arcanjo NE MUANDA KONGO que para eles apareceu em forma de Sol, tocando o cume da montanha, ao seu redor nove águias e barulho de trovões, em torno do cume da montanha estava um arco íris “NKONGOLO” (que era o espírito de um rei do Kongo que de tão bondoso foi encantado em forma de cobra e em seguida transformado em arco íris), muitas nuvens se formaram no sopé da montanha e choveu sobre o povo trazendo alegria e fertilidade à terra. NE MUANDA KONGO deu para NKEMBO WAMONESUA uma pedra que chamou de KONGO TADI (ou LUSUNZI ou MAKONGO), nesta pedra estava toda lei que regeria a moral do povo Bakongo.
ano 1482: Diogo Cão chega ao Kongo.
ano 1491: é iniciado o processo de captura, comercialização e tráfico de escravos, justamente quando o rei NZINGA NKUWU é batizado no catolicismo.
Dessa forma se deu a formação do Reino do Kongo numa perspectiva “mitológica”, tendo por ponto de partida sua cosmogonia e a significância de cada palavra (pois está é a melhor forma de resgatar tradições orais).
Sabemos que o Reino do Kongo se formou por nove províncias, a saber: mPemba, mBata, mBamba, Sonyo, nSundi, mPangu, nGoyo, Kakongo e Luango. Teve ainda por seus limites, reinos vassalos, que compunham sua vasta extensão terrirotial, soberania e domínio: nDongo, Matamba, Kassanje e Kissama. A sua capital é mBanza Kongo (que atualmente foi tombada como patrimônio da humanidade), onde se assentam os túmulos dos antigos reis do Kongo, onde a ancestralidade se preserva. O idioma oficial do Reino do Kongo é o Kikongo (dele se derivam outros dialetos do tronco étnico e linguístico Bantu como Kimbundu, Umbundu etc).
Espero com a compilação dessas informações que compõem as DIAPASU (fábulas) da Cosmogonia e Mitologia Bakongo, unindo ainda mais esse rito, com base no que se ouve os povos do norte de Angola (Uige):
“Nesse resgate de tradições, que acompanho de perto em um grupo do Facebook, da região do Uíge (Damba), um relato me chamou a atenção: o dono do comentário falava do quanto seu avô se devotava às águas de um rio e toda a região acerca desse rio. Contava que seu avô realizava um ritual (nKoko Na Sodila o Se Waku) onde carpinava às margens dos rio e no entorno das árvores mais próximas e que, além disso, ele levava tecidos novos e amarrava os troncos das árvores com laços para enfeitar e agradar os espíritos das águas (Simbi), derramava nas água vinhos brancos e champagnes dos mais caros que podia comprar na época (nSamba – Reza e Makazu – Oferendas). Fazia tudo isso para louvar a água (Maza) do rio (nKoko). Quando ia ao rio dizia: nGieleKuna nKoko (Vamos ao Rio), para entrar na água pedia licença dizendo: Kumaza! As pessoas que entravam na água só podiam sair depois que o sacerdote lhes dava permissão dizendo: Kalakoko (homens) ou Wiza (mulheres) que significa “ficar”, de outro modo respondia nZa ou Luta, dando permissão para sair das águas do rio.
Esse relato traz uma séria consistência mítica, mística e mitológica no tratamento do sagrado elemental que é a água. Os movimentos de africanização e reafricanização precisam dar atenção à estes momentos em África para que possam fazê-los viver/reviver também aqui no Brasil.”
Há que se concluir complementando:
“Entendendo que Angola se formou com a união de diversos reinos como nDongo, Soyo, Matamba e que esses reinos foram vassalos do antigo Reino do Kongo, podemos dizer que a matriz religiosa candomblecista da vertente Bantu é Kongo.
Angola é uma questão de politica, soberania e alheia ao contexto religioso. Os Bakongo, de fala Kikongo (dialeto do qual outros dialetos se derivaram: Kimbundu, Umbundu etc), são descendentes diretos daqueles que no passado compunham o Reino do Kongo e passam por um movimento recente, e ainda com poucas foras, de resgate do dialeto Kikongo (deixando de usar o português que é a língua do colonizador).”
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